Error 403. Acesso negado. Acess Denied/Forbidden. Com frequência, essas mensagens saltam na tela do computador e frustram as expectativas de alunos de escolas públicas e privadas. Acessar redes sociais, blogs e programas de bate-papo instantâneo não é possível em instituições que encaram esses ambientes como vilões capazes de roubar a atenção dos alunos e de oferecer perigo por permitir o contato com desconhecidos e conteúdos maliciosos.

Maíra Soares

Conscientização é chave para uso seguro, defendem educadores

A censura, feita na forma do bloqueio dos endereços virtuais, costuma ser a atitude recorrente das instituições. De imediato, representa alívio para os professores, que até então precisavam pedir inúmeras vezes para que os estudantes “fechassem aquelas janelinhas”. Mas, dali a uns dias, quando outros programas de bate-papo e outras redes sociais são descobertas pelas crianças e jovens – e elas surgem numa velocidade alucinante -, tudo recomeça.

Durante o Fórum de Segurança na Internet, evento realizado em outubro, em São Paulo, pela Microsoft, um debate entre educadores sinalizou que os professores não estão fadados a viver esse desgaste por quanto tempo lecionarem, nem os alunos a serem vistos como “transgressores” apenas por terem o ímpeto de acessar tais endereços ao navegarem na escola. A zona de equilíbrio, segundo os educadores que já estão atravessando o caminho das pedras, não exige soluções mirabolantes, mas sim conscientização e a preocupação de realizar ações que se encaixem no universo jovem.

Professor, há sete anos, de informática educacional da escola Vida Ativa, em São Paulo, Maurício Teixeira dá aula a todas as séries do Ensino Fundamental. Por muito tempo, “brincou de gato e rato” com os seus alunos, pois, a cada semana, tinha de descobrir quais os novos endereços inapropriados acessados no laboratório para, então, bloqueá-los. “Não dava para deixar livre, sem filtro. Os alunos realmente não respeitavam o horário da aula, ficavam o tempo inteiro fazendo outras coisas que nada tinham a ver com o conteúdo e isso prejudicava bastante o andamento das atividades. Por isso, dava trabalho, mas eu tinha de bloquear”, afirma Teixeira.

A estratégia do professor se mostrou falha quando um aluno reclamou que não conseguia acessar o site do Criança Esperança. “Pensei, puxa, esse daí eu não bloqueei e seria um bom site para ele acessar. Em seguida descobri que o servidor era o mesmo de um site de fotos sensuais que eu havia impedido o acesso no laboratório”, conta Teixeira, que afirma ter percebido, neste momento, a necessidade de mudar a forma de agir. Em 2008, começou uma pesquisa informal com os alunos. Era o início do entendimento e, consequentemente, do fim dos incessantes bloqueios.

A partir da conversa que teve com alunos da escola Vida Ativa, desenvolveu um questionário para mapear os hábitos de todos eles. Com os resultados, organizou, no mesmo ano, três palestras voltadas para os pais, alunos e para os professores. “Os garotos não discordaram de nada do que falei. Quando conversamos sobre os riscos de conversar com pessoas estranhas, de compartilhar fotos, eles mesmos davam exemplos que se encaixavam no que eu dizia, mas, apesar disso, não tinham total noção do perigo”, relata. Além de abordar a navegação segura, o professor de informática mostrou quanto tempo eles perdiam nos programas de bate-papo com conversas que nada acrescentavam. “Eu simulei uma conversa no Messenger. Mostrei que todos os dias eles entravam lá para falar sobre as mesmas coisas, passavam horas ali e nada aproveitavam, pois não usavam o programa para nada verdadeiramente útil”, conta.

Atualmente, o laboratório da escola não tem qualquer filtro. Maurício Teixeira diz que consegue dar aulas sem precisar fazer as observações que, num passado recente, eram tão necessárias. “Vez ou outra, chamo a atenção de um. Mas posso dizer que não chega a ser 10% do que era antes.”

Depois da conscientização, o mergulho no mundo “deles”
No colégio Bandeirantes, na capital paulista, acessar o Orkut não é permitido. O argumento da diretora Cristiana Mattos não deixa espaço para contestações: “Trata-se de uma rede para maiores de 18 anos. O próprio Orkut deixa isso claro”.

Planeta Band, comunidade usada por alunos e professores do colégio Bandeirantes

Embora o Bandeirantes também trabalhe a conscientização com os alunos, através do curso de ética e cidadania digital, a medida adotada para frear, no espaço escolar, o uso da rede social mais popular no Brasil foi bloquear o endereço. “Não tomamos essa atitude em relação a outras redes, nem a blogs, mas com o Orkut sim, pois como é claramente proibido para menores, não queremos deixar a brecha para que seja acessado”, diz Cristiana.

A diretora, que deu palestra no Fórum de Segurança da Internet sobre o tema “Educação na Sociedade Digital”, afirma que o colégio não se limita a proibir: “As conversas que temos com os alunos são mesmo para apontar os riscos e as consequências que há quando se insiste em participar de um ambiente inapropriado.” Como ressaltou Cristiana, se a atitude se resume à proibição, os alunos continuarão expostos quando acessarem a internet em outro ambiente que não seja a escola, que não tenha qualquer supervisão, a exemplo das lan houses.

Um bom relato sobre como os alunos reagem diante de um tolhimento sem conscientização foi dado pelo membro do Conselho Consultivo Internacional de Parceiros na Aprendizagem da Microsoft, Eduardo Chaves, durante palestra no Fórum de Segurança.

“Na Austrália, aonde eu fui dar palestras numa escola só para meninas, o acesso a vários sites era proibido, inclusive a todos que terminavam em ‘.br’. Nem por isso elas não os conheciam. Acessavam tudo pelo celular”, conta Chaves, que destacou ainda a importância de não generalizar. “Bloquear todos os ‘.br’ é uma medida radical. Eu, como brasileiro, até me senti ofendido. Sem qualquer dúvida, há muito mais coisa interessante na internet brasileira do que imprópria para jovens, e aquela instituição estava privando os seus alunos disso.”

De acordo com Cristiana Mattos, pesquisas feitas com alunos do Bandeirantes em anos consecutivos mostram que eles vêm compreendendo a preocupação da escola e pais e repensando hábitos. “Vimos que o número dos que têm perfil no Orkut e acessam mesmo fora da escola diminuiu bastante de um ano para o outro.”

Ao mesmo tempo em que alerta para os perigos da rede, o colégio se preocupa em não deixar de ressaltar as potencialidades da web. Tanto que criou uma rede social exclusiva para alunos, ex-alunos e professores. O Planeta Band, lançado neste ano, conta com mais de 2.600 usuários. Os alunos interagem em um ambiente diferente do dos professores, que, por sua vez, não têm acesso ao ambiente dos alunos. “Optamos por essa dinâmica para que nenhum grupo perdessem a naturalidade nas postagens”, justifica Cristiana, a moderadora da rede social.

Em algum lugar, haverá um educador para contestar a dinâmica da rede do Bandeirantes, já que há aqueles que defendem interação total entre alunos e professores, a chamada horizontalidade das relações. Não há como afirmar, entretanto, que o Bandeirantes tem o modelo mais ou menos certo, mais ou menos desejável. O caminho das descobertas, repleto de indagações, ainda está sendo percorrido. O que se tem de concreto é que, assim como o professor da escola Vida Ativa, Cristiana e a sua equipe já optaram por não encarar links como problemas. Bloquear, insistem, não é a solução.

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