Projetos-piloto inovadores que visam melhorar a educação brasileira e deixá-la mais alinhada aos valores do século 21 são muitos. Mas quantas vezes, de fato, as boas e novas ideias -até mesmo aquelas que são testadas e tidas como bem-sucedidas- são aplicadas em larga escala? Quantas vezes se tornam políticas públicas? As cidades de Rio do Sul (SC) e Sorocaba (SP) são exemplos de redutos onde essa barreira bastante presente no contexto brasileiro foi superada em escala municipal. Bons projetos, com foco na educação empreendedora, foram aplicados há alguns anos, avaliados como positivos pelos gestores educacionais e hoje, contemplados pela legislação, fazem parte da rede escolar dessas cidades.

Professora articuladora do empreendedorismo na rede de Sorocaba, responsável por fazer a ponte entre a Secretaria Municipal de Educação e as escolas, Emília Alquezar conta que o programa Pedagogia Empreendedora, realidade em 81 instituições da cidade voltadas à educação infantil, mostrou-se um acelerador do desenvolvimento das crianças desde o seu início, em 2006. Por isso, em 2010, quando a Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas foi aprovada no município, um capítulo inteiro foi dedicado à educação. O artigo 97 diz que “a orientação curricular do Sistema Municipal de Ensino deverá estimular estratégias didático-pedagógicas que envolvam os princípios do empreendedorismo”.

Emília explica que embora a lei se volte muito ao empreendedorismo que reflete na geração de negócios lucrativos, a parte dedicada à educação tem outro teor. “Nossa proposta não é fazer com que as crianças pensem em negócios, mas sim desenvolver ou aprimorar nelas competências que estão no universo do empreendedorismo, como liderança, energia, formação de rede de relações.”

Na prática

Quem aplica o programa na rede, como a professora de educação física Ana Cristina Brunetti, precisa, além buscar o desenvolvimento de determinadas competências nos alunos, pensar em articulações. Não à toa, um outro artigo da lei municipal destaca que o “município deve oferecer educação empreendedora ficando autorizado a promover parcerias com instituições públicas, privadas, governamentais e não governamentais, com ou sem fins lucrativos, para o desenvolvimento de projetos que tenham por finalidade valorizar o papel do empreendedor, disseminar a cultura empreendedora (…)”.

Cristina, especializada em didática, diz que os alunos ‘ganham voz’, aprendem a planejar, a pensar em caminhos que podem levá-los a atingir objetivos, mas que tão valioso quanto isso é envolver os pais e a comunidade na busca desse objetivo. 

A educadora, que está na rede há mais de 20 anos, segue a metodologia desenvolvida pelo consultor e professor Fernando Dolabela. O trabalho que ela realiza com os seus pequenos estudantes que estão no fundamental 1 e têm entre 4 e 5 anos começa com uma longa conversa sobre sonhos. “A gente discute o que é mais importante para eles, o que eles gostariam de poder fazer de forma coletiva e, numa segunda etapa, mapeamos como podemos atingir aqueles sonhos ‘coletivos’”, explica. Neste ano, a aquisição de novos balanços é um dos sonhos dos alunos que sequer já sabem ler. Pesquisas na internet, uso de blogs e de outros ambientes é estimulado nesse processo. “Em outro ano, tivemos um mapeamento de sonho parecido e conseguimos um parque inteiro para a escola após envolvermos família e até a comunidade de uma penitenciária que desenvolvia trabalho educativo com os detentos.

Pioneirismo

Inovar com empreendedorismo na grade curricular, pensar em novos processos de avaliação. Temas assim são sempre polêmicos na educação brasileira. A cidade de Rio do Sul, com seus 60 mil habitantes, tem uma história inspiradora, porém. Foi pioneira na introdução da disciplina do empreendedorismo nas escolas, em 2005, e hoje comemora o que a secretária municipal de educação, Janara Mafra, chama de “transformação”. “Não fizemos uma mudança brusca de currículo. No turno da manhã, os alunos têm todas as disciplinas da escola de base comum, mas nosso trabalho é em tempo integral, e isso significa que eles têm disciplinas à tarde com seus próprios modelos de avaliação, e são avaliados pelo trabalho da manhã e da tarde.”

A educação da cidade tem o empreendedorismo como bandeira. O blog da Secretaria Municipal de Educação de Rio do Sul traz em letras grandes a mensagem “Modelo de Educação Empreendedora”. E Janara Mafra afirma que raramente passa uma semana sem receber gestores da educação que querem entender como tudo começou e se consolidou. “Estamos sempre à disposição para incentivar ações como a nossa. Basta nos procurar”, diz em tom sereno, como alguém que já superou a fase dos desafios de um processo inovador.

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