Frequentemente falamos sobre como as tecnologias da informação e comunicação (TIC) podem auxiliar os professores durante as aulas. No entanto, a crescente ubiquidade de computadores, smartphones, tablets e um acesso cada vez mais amplo à internet criam também novas oportunidades para professores, governos e instituições desenvolverem avaliações de estudantes.

Esse é o tema do estudo “Preparing for a Renaissanse in Assessment” (“Preparando-se para um Renascimento na Avaliação), da Pearson Education, que fala sobre como as escolas e professores podem se aproveitar das TIC não apenas para obter mais informações sobre o processo de aprendizado de seus alunos, mas para tornar todo o ciclo de montagem de currículo, ensino e avaliação mais adequado às demandas do mundo atual.

Os problemas das provas atuais

Os autores consideram que vivemos atualmente em uma “Sociedade do Conhecimento”, na qual é difícil prever qual tipo de educação é mais adequado para preparar um indivíduo para a vida e para o mercado de trabalho. Isso, porque o ritmo no qual surgem e desaparecem novos saberes, conhecimentos e tecnologias – bem como oportunidades de trabalho relacionadas a eles – é cada vez mais rápido.

Neste cenário, os modelos tradicionais de escola e educação se mostram menos eficazes do que o esperado: a análise da pontuação de alunos de diversos países no PISA(Programme for International Student Assessment) desde o ano 2000 mostra que mesmo países como Finlândia e Japão avançaram pouco nos quesitos “leitura” e “Matemática”. Isso, quando não retrocederam.

Por conta disso, os paradigmas de ensino precisam ser alterados, segundo o estudo, para ensinar os alunos a “aprender a aprender”. Os currículos escolares precisariam ser alterados para ser menos abrangentes e mais profundos, estabelecendo algumas capacidades centrais que os alunos teriam que desenvolver – como pensamento crítico e criativo, competências digitais, compreensão textual e entendimento intercultural – em torno dos quais abordagens multidisciplinares poderiam ser desenvolvidas. Os autores citam, também, a preocupação em incutir nos alunos não apenas essas competências, mas também uma série de disposições e traços de caráter, como adaptabilidade e sensibilidade a diferenças culturais, que os capacite a enfrentar os desafios atuais do mundo.

Parte importante dessas mudanças, contudo, seria o desenvolvimento de formas mais abrangentes e profundas de avaliação dos estudantes. Segundo o estudo, os modelos atuais de provas, tanto aqueles usados para avaliação escolar quanto as provas de vestibulares e exames padronizados como o ENEM, são insuficientes por uma série de motivos: eles não conseguem contemplar toda a variedade de habilidades dos alunos, não fornecem informação significativa sobre os resultados do processo educacional e não estimulam processos de pensamento mais complexos (pois frequentemente exigem memorização ou resolução de problemas relativamente padronizados).

Essas inadequações dos exames não prejudicam apenas os estudantes e docentes no processo de aprendizagem. Por conta do fato de que provas padronizadas são utilizadas também para o acesso ao Ensino Superior, para a elaboração de políticas públicas de educação e para a avaliação de professores e instituições de ensino (segundo o desempenho de seus alunos nessas provas), elas acabam prejudicando o sistema educacional em diversos níveis.

Segundo o estudo, mudar o paradigma exigiria que os professores tivessem meios de avaliar o desempenho de seus alunos com mais regularidade (diariamente, de preferência), de forma mais próxima das atividades didáticas, e de uma maneira que permitisse a coleta e estruturação de grande quatidade de informações sobre o progresso de seus alunos – que poderiam ser usadas para nortear o planejamento das aulas futuras e do currículo escolar como um todo.

As provas do futuro

Para os autores, boa parte desses desafios pode ser superado por meio do uso das TIC. O uso de uma plataforma adaptativa de testes computadorizada (CAT – Computer Adaptative Testing), já adotado por diversas regiões dos Estados Unidos, é um exemplo de como isso pode ocorrer. A plataforma direciona perguntas aos alunos com base em seu desempenho nas questões anteriores, o que a torna adequada para avaliar com melhor qualidade mesmo alunos de níveis bastante diferentes. Além disso, ela permite que cada aluno encare desafios adequados ao seu nível de aprendizagem.

A utilização de diversas versões de uma mesma prova também é uma forma de se extrair mais informações relevantes de uma mesma avaliação. Tanto o PISA quanto as provas do sistema educacional de Hong Kong têm diversas versões, apenas uma das quais é resolvida por cada aluno. Embora esse procedimento ofereça o risco de prejudicar alguns alunos, ele engloba uma abrangência maior de informações sobre o currículo escolar aos avaliadores.

Esse procedimento também pode ser facilitado pela aplicação de provas pela internet. Além da maior facilidade em misturar questões, o sistema online também permitiria que os avaliadores coletassem mais dados sobre os alunos (por exemplo, quanto tempo eles demoraram em cada questão) e lhes oferecessem respostas quase imediatas sobre seu desempenho. Todas essas informações poderiam ser facilmente registradas para uso posterior, compondo para cada estudante um histórico escolar bastante rico.

Outra novidade interessante é o desenvolvimento de sistemas automatizados de correção de provas que demonstram níveis de confiabilidade iguais aos de corretores humanos. As dificuldades de correção de provas dissertativas poderiam ser amenizadas por esses sistemas, o que permitiria a criação de provas mais complexas. Por exemplo, provas computadorizadas poderiam ter questões interativas, de diversas partes, que avaliassem o conhecimento dos estudantes de forma transversal, abordando diferentes disciplinas.

Essas vantagens são alguns dos motivos pelos quais a prova do PISA de 2015 deverá ser realizada inteiramente por meio de computadores.

Enquanto o futuro não chega

Nelson Gimenes, professor da PUC-SP e pesquisador da Fundação Carlos Chagas, considera que, apesar de suas insuficiências, as avaliações de modelo tradicional ainda podem fornecer informações interessantes. “Todas as avaliações têm seus limites, mas elas são instrumentos, e é mais importante o uso que se faz do instrumento do que o instrumento em si”.

Segundo o professor, o ENEM, por exemplo, embora não consiga representar a totalidade dos problemas do Ensino Médio, oferece informações importantes que, articuladas a outras informações, como o número de alunos por turma e o número de turmas pelas quais cada professor é responsável, pode oferecer percepções interessantes para o desenvolvimento de políticas públicas de ensino.

Uma das principais vantagens do ENEM, segundo Gimenes, é oferecer uma prova idêntica para todos os alunos, garantindo a isonomia. Essa característica é de grande importância, segundo ele, uma vez que a pontuação do ENEM é utilizada como critério de seleção para diversas universidades federais, além de também oferecer pontos a mais para algumas provas de vestibulares, como a Fuvest.

No entanto, Gimenes chama a atenção para o fato problemático de que o ENEM é usado tanto como ferramenta de seleção para universidades quanto para avaliar a qualidade do Ensino Médio brasileiro. “São duas funções diferentes”, ele explica. “Quando você faz uma prova de seleção, é como um concurso: a prova do concurso não se interessa por aqueles que não passam”. Por outro lado, uma prova que busque avaliar o Ensino Médio precisaria fornecer mais informações sobre os alunos que não vão bem. O professor avalia que, por tentar cumprir esses dois papéis simultaneamente, o ENEM acaba prejudicado.

O uso das notas dos alunos como critério para avaliação de escolas e professores, segundo o professor, também é problemático. “O professor pode resolver focar nos alunos que vão melhor para levantar a média da classe”, diz ele. Por conta disso, ele considera que essa informação precisa ser articulada a outras – como o fluxo escolar – para ser mais reveladora.

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