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“Aprender a estudar textos” é uma iniciativa da ONG Laboratório de Educação que destaca a importância do livro didático na ampliação da capacidade de interpretação de textos pelas crianças após a alfabetização.

O objetivo é auxiliar os docentes de 4º e 5º anos do ensino fundamental na utilização da linguagem dos textos das disciplinas como ferramenta para ensinar os alunos a conhecerem o mundo por meio da leitura.

“Aprender história ou aprender ciências exige aprender também qual a linguagem que se usa para representar os conceitos abstratos que passam a fazer parte do repertório de conhecimentos que a criança deve ter acesso através da leitura”, explica a mestre pela Faculdade de Educação de Harvard (EUA) Nicole Paulet.

Os textos didáticos são informativos e exigem que a criança exerça a capacidade de interpretação a respeito dos assuntos tratados em cada disciplina.

“Tem o conteúdo específico que está em pauta, mas tem o como esse conteúdo está sendo apresentado no texto. E na medida em que ela [criança] entende essa interrelação entre essas duas coisas, ela tem muito mais capacidade de compreensão, porque os textos, eles têm muitas coisas subentendidas”, avalia a doutora em educação pela Universidade de São Paulo (USP) Beatriz Cardoso.

Inspiração

Até o início de 2023, a equipe do “Aprender a estudar textos” contou com a colaboração e supervisão da educadora Ana Teberosky, falecida em março. Ela se dedicou à aprendizagem da linguagem a partir de uma perspectiva multidisciplinar.

“Essa macroestrutura que a professora Ana Teberosky cunhou tem como objetivo criar um contexto para que as crianças possam estabelecer diferentes relações com o texto: que as crianças pensem, comentem, antecipem, ouçam, registrem, anotem, manipulem, escrevam categorias. Tem toda uma série de ações ativas das crianças, que estão estruturadas em torno da situação de leitura”, conclui Paulet.

Transcrição do Áudio

Música: Introdução de “O Futuro que me Alcance”, de Reynaldo Bessa, fica de fundo

Beatriz Cardoso:

O exercício é ajudar o professor e o aluno a lidar com esses textos porque ali há um conjunto de informações, e a partir dali poder avançar. Tem que entender o conteúdo primeiro para depois vir essa conversa de o espírito crítico, de você poder questionar e problematizar. Então o livro didático é sim uma ferramenta muito valiosa, no sentido que é ele que traz até a escola e os alunos o acesso ao conhecimento informativo organizado.

Olá, eu sou Beatriz Cardoso, sou presidente do Laboratório de Educação e sou doutora em educação pela Universidade de São Paulo e estou agora em Harvard, como impact leader in residence. 

Vinheta: Instituto Claro – Educação

Música de Reynaldo Bessa, instrumental, fica de fundo

Marcelo Abud:

O projeto “Aprender a estudar textos” demonstra a importância do livro didático para ampliar a capacidade de interpretação de textos após o período inicial de alfabetização.

Beatriz Cardoso:

Esse projeto, particularmente, ele nasce da pergunta que é “vamos considerar que a criança foi bem alfabetizada, que ela teve uma boa inserção nesse início de contato com o mundo da leitura e da escrita. Qual é o próximo desafio que tá em pauta?”.

O próximo desafio é ler para aprender, é ler para estudar. O trabalho que a gente tem que fazer com a criança nesse momento é diferente dela entender como é que funciona a linguagem escrita, como é que eu que eu entendo o funcionamento dela e eu passo a ser alfabetizada e poder ler e escrever, e agora é a leitura para aprender. Como é que nos campos de conhecimento, a partir do que eu leio, eu entendo o que eu leio e eu consigo construir conhecimento nos diferentes campos.

Marcelo Abud

A diretora do Laboratório de Educação e mestre pela Faculdade de Educação de Harvard, nos Estados Unidos, Nicole Paulet, explica por que o projeto “Aprender a estudar textos” é uma metodologia de formação voltada para professoras e professores dos 4º e 5º anos do ensino fundamental.

Nicole Paulet

A etapa na escolaridade, o momento da escolaridade em que existe essa nova expectativa de que as crianças aprendam a partir da leitura dos textos das diferentes disciplinas, mas que coincide também com o momento em que os textos com os quais as crianças têm contato na escola, eles se tornam cada vez mais complexos.

Então existe uma… um pressuposto de que porque os textos são curtos, eles provavelmente deveriam ser textos fáceis de serem compreendidos, mas, na linha de entender quais são os desafios presentes nessa faixa etária, olhar para linguagem dos textos: que elementos dessa linguagem precisam ser desvendados para que as crianças possam realmente entrar no texto e no conhecimento que está sendo representado nesse texto é fundamental. Então aprender história ou aprender ciências exige aprender também qual a linguagem que se usa para representar os conceitos abstratos que passam a fazer parte do repertório de conhecimentos que a criança deve ter acesso através da leitura.

Beatriz Cardoso:

Tem o conteúdo específico que está em pauta, mas tem o como esse conteúdo tá sendo apresentado no texto. E na medida em que ela entende essa interrelação entre essas duas coisas, ela tem muito mais capacidade de compreensão, porque os textos, eles têm muitas coisas subentendidas.

Marcelo Abud:

As pesquisadoras ressaltam que a maioria dos textos didáticos são informativos. Isso exige que as crianças busquem seus conhecimentos prévios a respeito dos assuntos tratados em cada disciplina.

Nicole Paulet:

As crianças precisam mobilizar o que elas já sabem para encarar um novo texto, para entender “porque que eu vou ler aquilo?”, “Que que eu vou procurar aqui?”, e, ao ler o texto, poder estabelecer relações, conectar com aquilo que ela já sabe para tentar inferir o significado ou de uma nova palavra ou inferir sobre quem está falando. “Independência de quem?”. Se ela já estudou o contexto, de que país ou de que estado ou de que comunidade se está falando, né? A criança vai então poder fazer as inferências porque ela tem conhecimento de conteúdo e conhecimento e apropriação também de procedimentos que têm sido vivenciados junto com elas durante as situações cotidianas de leitura em sala de aula.

Marcelo Abud:

O projeto investiga a necessidade de se aprender o mundo por meio da leitura e leva em conta os pontos de vista da criança, de professoras e professores e da escola pública. Em parceria com docentes da Escola Estadual Prudente de Moraes, no centro de São Paulo, durante um ano foram desenvolvidas atividades que resultam em dez propostas com base na leitura de textos de história.

Beatriz Cardoso:

E a plataforma sistematizou as propostas didáticas, os conteúdos e a linguagem dos textos junto com essas professoras. Ela possui uma biblioteca de conteúdos, mas a lógica da plataforma são propostas de planejamentos de atividades modelares. Então para realizar cada uma das propostas de atividades modelares, a gente estruturou um caminho, um percurso de estudos que olha para as características dos textos, para os objetivos da BNCC que estão vinculados, que podem ser relacionados à leitura daquele texto que está sendo proposto.

Há uma sugestão de atividades e diversos exemplos de práticas em sala de aula, análise de situações de sala de aula, análise de produções das crianças. E podem ser lidos e estudados – a gente sugere que seja feito dessa forma – antes das professoras levarem à prática as propostas dos planejamentos.

Marcelo Abud:

Além de Beatriz Cardoso e de Nicole Paulet, o projeto “Aprender a estudar textos” tem a participação da doutora em educação pela PUC São Paulo Andrea Guida. Até o início deste ano, a equipe contou ainda com a colaboração e supervisão de Ana Teberosky. Até o falecimento em março deste ano, a educadora se dedicou à aprendizagem da linguagem a partir de uma perspectiva multidisciplinar.

Nicole Paulet:

Essa macroestrutura que a professora Ana Teberosky cunhou tem como objetivo criar um contexto para que as crianças possam estabelecer diferentes relações com o texto: que as crianças pensem, comentem, antecipem, ouçam, registrem, anotem, manipulem, escrevam categorias. Tem toda uma série de ações ativas das crianças, que estão estruturadas em torno da situação de leitura.

Marcelo Abud:

Paulet traz um exemplo de situação vivida em sala de aula que demonstra como a relação da linguagem com o conteúdo do texto pode ser reveladora.

Nicole Paulet:

Na escola Prudente de Moraes, as professoras estavam lendo um texto sobre o trabalho das pessoas escravizadas na região das minas. O texto dizia: “O inverno era a época mais propícia para a extração do ouro”. E a gente tinha discutido com as professoras estratégias para que as crianças pensassem sobre o vocabulário, ao invés da professora já dar a resposta. Então ela perguntou: “Alguém sabe o que quer dizer ‘propícia’?”. E as crianças começaram a estabelecer relações: “Acho que é ‘próprio’, ‘apropriado’. ‘Ah, é bom’”. “Então, quer dizer que é bom?”. E um menino disse: ‘Ah, era bom para os portugueses, mas ruim para os escravizados’, e nesse pequeno exemplo, você tem uma maneira de olhar para os textos e de examinar a fundo de que perspectiva esse ‘propício’ está sendo dito no texto.

No uso tradicional do livro didático, as crianças leem e depois a professora faz perguntas ou o próprio livro pergunta. A nossa virada é: a criança pergunta e o texto que tem que responder.

Marcelo Abud:

O site “Aprender a estudar textos” traz propostas que estimulam as crianças a formularem perguntas com um ponto de vista crítico a partir da relação com o texto do livro didático. Essas atividades agora estão disponíveis como planejamentos no site aprenderaestudartextos.org.br.

Marcelo Abud para o podcast de educação do Instituto Claro.

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