Segundo a Organização Mundial da Saúde, cerca de 81% das crianças e adolescentes no Brasil em idade escolar não praticam uma hora de atividade física por dia. Assim, quatro em cada cinco adolescentes são considerados sedentários. O estudo foi publicado em novembro de 2019, antes da pandemia de Covid-19, e acompanhou a rotina de 1,6 milhão de estudantes de 146 países.
“Mesmo que a escola, a família e os programas de governo incentivem o movimento, temos uma concorrência pesada convidando as crianças para o sedentarismo: as telas. Correr, saltar, lutar, jogar futebol, viraram todas atividades que hoje praticamos mexendo só o nosso polegar”, avalia o professor de educação física, pós-graduado em nutrição, Marcio Atalla, entrevistado neste podcast.
Riscos no futuro
A consequência da inatividade física será vista a longo prazo. Quando adultas, essas crianças estarão mais sujeitas a diabetes, problemas ortopédicos, distúrbios psicológicos, doenças cardiovasculares e hipertensão. Pela gravidade do quadro, o estímulo ao movimento corporal na escola, na opinião de Atalla, deve extrapolar as aulas de educação física. “A ideia é que o movimento faça parte de todas as aulas, independente de ser educação física ou não. Tem estratégias, por exemplo, na Coreia, onde as crianças têm 45 minutos de aula e 15 minutos para brincar e aí começa uma outra aula”.
O especialista diz que o alerta é ainda mais importante diante da pandemia de coronavírus. Mesmo no ensino remoto, o movimento deve ser parte das aulas. “Com a mesma preocupação que as escolas têm de prover matemática, ciências, português, deveria ter ali o professor de educação física, de alguma maneira, uma dinâmica de movimento: 15, 20 minutos por dia. Isso faria toda a diferença na melhora da concentração, aprendizagem, memória”, conclui, citando outros benefícios da atividade física.
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Música: “Come and Get Me”, de The Whole Other, de fundo
Marcio Atalla:
Claro que a educação física na escola ela pode e deve contribuir com a parte de educação e saúde. Mas o que a gente vê ao redor do mundo é: movimentos sendo incorporados em todas as aulas, sendo um conceito de escola ativa.
Olá, eu sou Marcio Atalla, professor de educação física, pós-graduado em nutrição e especialista em estilo de vida.
Vinheta “Instituto Claro – Educação”
Música de Reynaldo Bessa, instrumental, de fundo
Marcelo Abud:
A Organização Mundial da Saúde estima que, em 2025, 75 milhões de crianças no planeta vão estar acima do peso. O estímulo à atividade física na escola pode ser uma forma de diminuir o problema.
No Brasil, a obesidade infantil está em níveis críticos, de acordo com o Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (Sisvan), do Ministéiro da Saúde, de 2019.
Marcio Atalla:
Uma a cada três crianças, no Brasil, tem excesso de peso. Além desses números serem crescentes, a maior preocupação é que o último levantamento da OMS, que foi feito este ano, mostra que as crianças e adolescentes brasileiros são sedentários, com 83% não atingindo o mínimo de movimento recomendado pela Organização Mundial da Saúde; o que nos leva a crer que esses números de obesidade só vai aumentar, como tem acontecido com a população acima de 18 anos.
Marcelo Abud:
Para Marcio Atalla, é preciso somar forças e mobilizar toda a escola em torno do combate à obesidade infantil.
Marcio Atalla:
A ideia é que o movimento faça parte de todas as aulas, independente de ser educação física ou não, como é na Finlândia, como é na Coreia, como tem escolas nos Estados Unidos com mudanças de meio ambiente, enfim, você tem ‘n’ estratégias; tem estratégias, por exemplo, na Coreia, onde as crianças têm 45 minutos de aula e 15 minutos para brincar e aí começa uma outra aula.
Música: “Menina moleca” (Paulo Tatit e Zé Tatit), com Palavra Cantada
Pula, passa
Corre, chuta
Pega, leva
Nossa! Olha lá!
Marcio Atalla:
Uma coisa que eu queria deixar registrado é que, por exemplo, toda essa movimentação em relação ao movimento, a atividades físicas nas escolas, ela não começou por conta de diminuição de obesidade infantil, né? Em 2003, nos Estados Unidos, eles implementaram um programa chamado “Hora Zero”, desenvolvido por um neurocientista e por um professor de educação física, onde a criança antes de começar a aula, corria uma milha (1.600 metros); e lá eles não iam medir obesidade infantil, nada disso, eles iam medir desempenho em matemática e ciências. E o que eles viram foi que as escolas que fizeram o “Hora Zero” tiveram um resultado muito expressivo em relação a todas as outras escolas que não fizeram. E, a partir daí, houve um movimento aí no mundo em relação a incorporar o movimento.
Marcelo Abud:
Dentro desse conceito de escola que estimula o movimento de crianças e jovens, a educação física é fundamental. No entanto, no Brasil, a disciplina não tem tido tanta atenção no currículo.
Marcio Atalla:
O fato é que do jeito que a educação física é atualmente desenvolvida no país ela pouco ajuda tanto para a educação dessa criança pra ser um adulto mais consciente em relação ao tema e, pra tornar as pessoas – as crianças – mais ativas, ela tem contribuído cada vez menos. Então essa fase de pandemia ela é muito preocupante porque as crianças acabam se movimentando menos ainda. Com a mesma preocupação que as escolas têm de prover ali matemática, ciências, português, deveria ter ali o professor de educação física, e de alguma maneira, uma dinâmica de movimento que pudesse 15, 20 minutos por dia. Isso faria toda a diferença na melhora da concentração, aprendizagem, memória, todos os estudos apontam pra isso. O que eu acredito é que nesse universo online você propor uma dinâmica curta de 15 a 20 minutos – porque também fica muito difícil você prender as crianças – bem divertida e com uma intensidade um pouco mais alta e sendo uma das primeiras, se não a primeira tarefa do dia, isso já deixaria a criança no estado de alerta melhor, com o cérebro muito mais preparado para absorver as informações.
Marcelo Abud:
Preparador físico, Marcio Atalla é o idealizador do documentário “Vida em Movimento”. O filme acompanha a atividade física em seis países. No Brasil, um dos destaques é Juan e a rotina dele dentro e fora da escola.
Trecho do documentário “Vida em Movimento”:
Juan:
Celular a gente usa pra mandar mensagem, jogar, ver vídeo, pesquisar; a gente também usa pra fazer conta…
Marcio Atalla:
Mesmo que a escola, a família, os programas de governo incentivem o movimento, a partir de agora teremos uma concorrência pesada convidando as crianças para o sedentarismo: as telas. Correr, saltar, lutar, jogar futebol, viraram todas atividades que hoje praticamos mexendo só o nosso polegar.
Juan:
Uma vez eu e o meu amigo a gente ficou jogando “das” uma da tarde até três da manhã, porque meio que dá um vício na tela. A gente acha tão divertido, criança, que não consegue mais parar.
Marcio Atalla:
Pra criança não estar na tela ela precisa ter alguma legal pra fazer. Então, como que é na Coreia? Durante a aula você não pode estar com o celular, você tem espaço ali pra brincar e existe a recomendação e a informação o tempo inteiro que uma criança não pode ficar mais do que três horas, excluindo o tempo de escola, na frente de uma tela.
Aqui no Brasil a média é cinco horas e meia. Então aqui com cinco horas e meia ninguém tem programa nenhum e nem se toca nesse assunto nas escolas. Na Coreia, eles nem chegaram à média de três e eles já estão preocupados. Não é atoa que lá é a menor população obesa no mundo, menos de 5% – o Brasil está com 26%. Tem que ser uma coisa de escola mesmo porque a criança passa muito tempo ali. Agora você tem que oferecer algum atrativo pra essa criança no recreio não ficar no celular, ao invés de brincar. Então parte também do ambiente da escola de criar e não só falar.
Marcelo Abud:
Marcio Atalla já destacou a importância de se valorizar a participação da atividade física diariamente, mesmo no contexto do ensino remoto. Mas e no momento do retorno gradual às escolas, após o longo período em que a criança esteve em casa, as aulas de educação física precisam de adaptação?
Marcio Atalla:
Normalmente essas aulas de educação física elas são muito democráticas e numa intensidade que as crianças suportam bem. O mais importante agora é a retomada dessas atividades extracurriculares de aulas de educação física pra que as crianças voltem a colher os benefícios desse movimento. Eu acho que a intensidade e o despreparo, isso daí o professor tira de letra, né, numa escola onde já normalmente você tem dentro da mesma sala diferentes níveis de condicionamento.
Música de Reynaldo Bessa, instrumental, de fundo
Marcelo Abud:
Com aulas remotas ou presenciais, a motivação deve ser para a regularidade do movimento no cotidiano de crianças e jovens.
Mais ideias de como isso pode ser feito você encontra no documentário “Vida em Movimento”. O link para assistir está no texto que acompanha esse podcast.
Com apoio de produção de Daniel Grecco, Marcelo Abud para o Instituto Claro.