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“EaD, Atividades remotas e ensino doméstico: cadê a escola?” é o nome do volume 3 da série “Diálogos Críticos”. Lançado em formato digital e gratuito, o livro traz – em 246 páginas – uma visão engajada e plural sobre o ensino remoto em prol de uma escola pública, gratuita e de qualidade. “Passamos a fazer um estudo mais aprofundado das reformas educacionais e como elas têm sido conduzidas no Brasil com uma forte presença de setores que estão ligados ao mundo da economia”, resume uma das organizadoras da obra, a doutora em educação pela Universidade Federal da Bahia Ivânia Paula Freitas.

Com a participação de dezenas de pesquisadores de diferentes instituições, a pergunta “Cadê a escola?” é respondida em capítulos que têm a perspectiva da transformação social, o que é visto como algo cada vez mais inalcançável. O cenário, que já começava a valorizar a educação à distância e o ensino doméstico, foi acelerado no último ano, diante da pandemia.

“Esse lugar da escola que transforma a comunidade e que é transformada por ela também não cabe nesse formato remoto”, defende Freitas. No áudio, é possível acompanhar, ainda, as reflexões da mestre em geografia e doutora em educação pela Universidade Federal da Bahia Janeide Bispo dos Santos. Ela é coautora de um dos capítulos do livro, “A Pandemia e as atividades não presenciais: estratégia de inserção da EaD enquanto privilégio de classe e raça”.
Para a professora, a expressão “atividades não presenciais” carrega questões estruturais debatidas na educação pública há anos.

“Ela vai segregar, vai permitir processos educativos diversos, mas se torna o caminho da exclusão. O sujeito, sobretudo os que estão nas comunidades tradicionais, nas periferias, os quilombolas, os indígenas, os que não têm acesso à tecnologia, são vítimas de um processo segregador, exclusivista, e racista, porque ela acaba privilegiando uma classe social e, no Brasil, como diz o Silvio Almeida, as relações de classe e raça, às vezes, são simultâneas”, sintetiza.

Veja mais:

Volume 1 da série “Diálogos Críticos” 
Volume 2 da série “Diálogos Críticos” 
Entenda a diferença entre educação à distância e ensino remoto

Transcrição do Áudio

Música de Reynaldo Bessa, instrumental, de fundo

Ivânia Freitas:
Esse lugar da escola que transforma a comunidade e que é transformada por ela também não cabe nesse formato remoto.
Eu sou a professora Ivânia Freitas, do curso de pedagogia da Universidade do Estado da Bahia…

Janeide Bispo dos Santos:
Quando se propõe o retorno às aulas ou o fingir estar tendo aula, sem a garantia do trabalho pedagógico de fato, nós temos um conjunto de ações que vão no sentido de desqualificar e de destruir a própria estrutura da educação pública.
Meu nome é Janeide Bispo dos Santos, mestre em geografia e doutora em educação pela Universidade Federal da Bahia.

Vinheta: “Livro Aberto – obras e autores que fazem história”

Música de Reynaldo Bessa, instrumental, de fundo

Marcelo Abud:
O livro “EaD, Atividades remotas e ensino doméstico: cadê a escola?” está disponível em formato digital. Quem explica a proposta da obra é a professora Ivânia Paula Freitas, organizadora do material, juntamente com Antônio Marcos da Conceição Uchoa, e Maria Elizabeth Souza Gonçalves.

Ivânia Freitas:
Me juntei com mais dois outros pesquisadores e nós passamos a fazer um estudo mais aprofundado das reformas educacionais e como essas reformas têm sido conduzidas no Brasil com uma forte presença de setores que estão ligados ao mundo da economia. A gente começa falando desse contexto de onde a gente se insere, porque foi exatamente esse contexto que nos mobilizou a pensar em estratégias onde a gente pudesse fazer o diálogo com a educação básica, sobretudo, em relação a essas reformas e os efeitos que essas reformas trazem para o cotidiano da escola, para a formação de professores, para os sistemas de ensino e, também, para as universidades – sobretudo os cursos de formação de professores e professoras.

Música: “Retrato” (Fabio Brazza e RPK)

Vai por a culpa na professora?
Mas qual o incentivo do moleque que troca o livro pela metralhadora?
Educação, inverno de valores,
Deputados recebem vinte e seis vezes mais que professores

Som de página de livro sendo virada

Marcelo Abud:

“A Pandemia e as Atividades não presenciais: estratégia de inserção da EaD
enquanto privilégio de classe e raça”. Esse é o capítulo escrito por Marize Damiana Moura, Jean da Silva Santos e Janeide Bispo dos Santos, ouvida pelo Instituto Claro. Ela destaca o que está por trás da denominação “Atividades não presenciais”.

Janeide Bispo dos Santos:

Esta expressão ela é reveladora de questões estruturais sérias presentes na educação pública há anos. Ela vai segregar, ela vai permitir processos educativos diversos, mas se torna o caminho da exclusão. O sujeito, sobretudo os que estão nas comunidades tradicionais, nas periferias, os quilombolas, os indígenas, os que não têm acesso à tecnologia, que estão vivendo em espaços remotos, definidos pelo Milton Santos como “os espaços opacos”, – essas pessoas são aquelas que vão estar sendo vítimas de um processo segregador, exclusivista, e racista, porque ela acaba privilegiando uma classe social e, no Brasil, como diz o Silvio Almeida, as relações de classe e raça, às vezes, são simultâneas.

Música: “Cota não é esmola” (Bia Ferreira)

– Vai pagar faculdade, porque preta e pobre não vai pra USP
Foi o que disse a professora que ensinava lá na escola
Que todos são iguais e que cota é esmola
Experimenta nascer preto, pobre, na comunidade
Cê vai ver como são diferentes as oportunidades
E nem venha me dizer que isso é vitimismo
Não bota a culpa em mim pra encobrir o seu racismo

Som de página de livro sendo virada

Marcelo Abud:

Ivânia de Freitas, além de ser uma das organizadoras, é a autora do último capítulo do livro. Em “A escola, os professores e as tecnologias digitais”, ela discute os desafios colocados pela suposta neutralidade do conhecimento e da docência em um contexto em que a padronização passa a se intensificar como política pública educacional.

Ivânia Freitas:

A gente vai fazendo uma reflexão aprofundada sobre como essas teorias elas vão se consolidando dentro da educação pública. Elas acabam reforçando uma perspectiva de isolamento da escola das outras mediações sociais, afirmando uma ideia de conhecimento, de currículo, neutros. É nesse processo de afirmar o conhecimento e o currículo neutro que a gente vai tirando da escola e da educação o caráter máximo que ela tem de formação humana ampla, visando uma outra perspectiva de sociedade.

Marcelo Abud:

No texto, Ivânia trata também do que tem sido chamado de processo de empresariamento da educação pública.

Ivânia Freitas:

Eles estão amplamente fortalecidos com o alinhamento desse movimento com o Conselho Nacional de Educação, com uma total ausência de direção também pelo Ministério da Educação no andamento das políticas. Então, à medida que esse movimento representativo desse laço da educação com o mercado cresce e ganha legitimidade na mídia, há também um afastamento das universidades públicas, das associações e organizações de pesquisas da educação pública, na discussão desse processo.
A gente tem assegurado na Constituição e na LDB o lugar das instâncias privadas também nessa discussão, mas o que está havendo, de um tempo pra cá, um isolamento das instituições públicas e uma inviabilização e invisibilidade, também, das pesquisas que a gente tem produzido nas instituições públicas, nas universidades, inclusive na área de currículo, e apenas esse foco voltado para aquilo que é do setor empresarial.

Som de página de livro sendo virada

Marcelo Abud:

O livro traz dezenas de pesquisadores ligados à educação, de diferentes instituições. Para você ter uma ideia do tom dos artigos, Janeide Bispo dos Santos adianta alguns questionamentos presentes na obra.

Janeide Bispo dos Santos:

Por que a opção pela expressão “educação não presencial em tempos de pandemia”? É viável realizar educação não presencial quando o estudante não tem acesso aos instrumentos técnicos que permitam a mediação entre o professor e aluno? É possível ter ensino sem o movimento didático-pedagógico denominado de aula? É possível fazer educação no presencial mesmo em um contexto emergencial com indivíduos cujas rendas não asseguram as condições mínimas de sobrevivência (quiçá ter acesso às tecnologias para mediação do ensino)?
Essas perguntas elas exigem reflexão e análise da realidade da população brasileira dentro das suas contradições.

Música de Reynaldo Bessa, instrumental, de fundo

Marcelo Abud:

“EaD, Atividades remotas e ensino doméstico: cadê a escola?” é uma obra engajada e plural em defesa da escola pública, gratuita e de qualidade. O link para ter acesso a esse e aos dois volumes anteriores da série Diálogos Críticos está no final do texto que acompanha esse áudio.

Com apoio de produção de Daniel Grecco, Marcelo Abud para o Instituto Claro.

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