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Antropólogo e sociólogo, Darcy Ribeiro é considerado um importante pensador da educação no Brasil. Conhecido também pela trajetória voltada a causas indígenas, como educador, defendeu a escola pública e a educação integral. Em 2022, comemoramos o centenário do educador, que nasceu em 26 de outubro de 1922.

“A educação integral visa a formação de vários aspectos da pessoa: é uma educação moral, é uma educação cívica, cognitiva, artística, é uma educação política também – e eu não estou falando de educação político-partidária – mas da criança saber se comportar coletivamente, saber respeitar as diferenças, saber estabelecer representatividades, formas de participação mais conscientes na própria vida da escola”, explica a professora titular da faculdade e pós-graduação em educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Libânia Xavier.

Educação integral

A ideia de Darcy Ribeiro para uma escola pública de educação integral foi colocada em prática nos anos 1980, no Rio de Janeiro, com os Cieps, que ele chamava de “escola de ricos para pobres”. “Porque elas tinham uma biblioteca, uma quadra de esportes; num turno era o ensino formal, no contraturno eram atividades na biblioteca com animadores culturais. As refeições faziam parte da pedagogia dos Cieps. Tinha refeitório e as crianças faziam as quatro refeições, além de estudar”, resume Xavier.

Darcy Ribeiro centenário
Darcy Ribeiro (crédito: divulgação/ Editora Elefante)

No áudio, a pesquisadora destaca ainda a atuação de Darcy Ribeiro em prol da atividade docente e outras ações que ele ajudou a implementar a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Aprovada em 1996, a LDB é popularmente chamada de Lei Darcy Ribeiro, pela importância do educador para a formulação dos artigos.

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Transcrição do Áudio

Música: Introdução de “O Futuro que me Alcance”, de Reynaldo Bessa, fica de fundo

Libânia Xavier:
Assim como o Anysio Teixeira, o Darcy Ribeiro, o que ele traz de importante pra gente pensar a educação hoje é o valor da educação pública para a construção de um país democrático. Claro que não exclusivamente pela escola, mas ela teria um papel fundamental.
É na escola que você cria solidariedade, respeito ao diferente, interesse em saber mais para contribuir pra vida social, pra o desenvolvimento do país, pra uma maior igualdade social, pra que a república e a democracia se efetivem e se tornem uma realidade.
Eu sou Libânia Xavier, professora titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro, atuando na faculdade de educação e do programa de pós-graduação em educação. Coordeno o projeto de pesquisa e extensão “Sua escola tem história” e faço parte do grupo de pesquisa “Processos educacionais e história da profissão docente”

Vinheta: Instituto Claro – Educação

Música de Reynaldo Bessa, instrumental, fica de fundo

Marcelo Abud:
Antropólogo e sociólogo, Darcy Ribeiro é um dos importantes pensadores da educação no Brasil. Aproxima-se de Anísio Teixeira e atua por uma escola que combate desigualdades sociais.
Aliás, Anísio Teixeira foi diretor do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP), entre 1952 e 1964, e contou com Darcy Ribeiro para implantar o Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais.

Libânia Xavier:
É nessa articulação – o CBPE – e na rede do Anísio Teixeira que ele vai também atuar no processo de tramitação da Lei de Diretrizes e Bases, que sucedeu a queda do Estado Novo – período ditatorial – e que favorecesse a universalização do ensino, a abertura de vagas para todas as crianças brasileiras nas escolas – sobretudo, nas escolas primárias -, o fim do analfabetismo; medidas para que a escola pública se tornasse mais popular e mais aberta a todos, que fosse considerada como responsabilidade do Estado, que fosse gratuita.
Isso vai colocá-lo numa luta importante e vai levá-lo a assinar o manifesto de 1959, intitulado “Mais uma vez convocados”, por uma legislação educacional que garantisse sobretudo que os recursos do Estado, os recursos públicos, fossem sobretudo e principalmente e integralmente na educação pública.

Música: “O Trono do Estudar” (Dani Black), vários artistas
(Tiê) Pra ter escolha, tem que ter escola
Ninguém quer esmola, e isso ninguém pode negar

Libânia Xavier:
Isso não quer dizer que eles lutassem contra as escolas particulares, não. Eles respeitavam a liberdade de ensino e a liberdade de cada pessoa escolher a escola que quisesse matricular os filhos, mas isso expressa sim uma preocupação em que mesmo aqueles que não tinham recursos para pagar uma escola pros filhos tivessem acesso a uma escola pública.

Marcelo Abud:
Nos anos 80, no governo Brizola, no Rio, Darcy Ribeiro foi secretário da educação e implementou os Centros Integrados de Ensino Público (Cieps), que ele dizia serem escolas de ricos para pobres.

Libânia Xavier:
Por que eram escolas de ricos? Porque elas tinham uma biblioteca, uma quadra de esportes; num turno era o ensino formal, no contraturno eram atividades na biblioteca com animadores culturais. É, as refeições faziam parte da pedagogia dos Cieps. Tinha refeitório e as crianças faziam as quatro refeições, além de estudar. Ele dizia que as crianças aprendiam a ter uma refeição balanceada, a comer com garfo e faca e aprender a ter uma educação mesmo social, que era importante, que muitas poderiam mesmo não ter, dependendo das condições de vida dessas crianças. Muitas delas tinham alimentação garantida pela participação delas na escola.

Música: “Comida” (Sergio Britto, Marcelo Fromer e Arnaldo Antunes), com Titãs e Elza Soares
A gente não quer só comida
A gente quer comida
Diversão e arte
A gente não quer só comida
A gente quer saída
Para qualquer parte

Libânia Xavier:
Ele também foi muito criticado por ser assistencialista – o projeto Cieps. No entanto, ele respondia ‘olha, como é que a gente vai ensinar crianças que passam fome. Isso é impossível, a gente tem que dar merenda pra elas. A gente tem que contornar esses problemas pra que elas aprendam.
A biblioteca, por exemplo, não era um lugar de abrigar livro velho e sim tinha todo um projeto pedagógico em cada espaço dessa escola.

Marcelo Abud:
Libânia Xavier destaca ainda a atuação de Darcy Ribeiro em prol da atividade docente.

Libânia Xavier:
A maioria trabalhava em horário integral. E isso significa que eles tinham na grade de horário deles um tempo remunerado para planejamento, para revisão do seu trabalho, pra se reunir com os colegas pra fazer um trabalho interdisciplinar. Então, esses professores tinham condições melhores de trabalho, daí eles poderiam também oferecer um ensino de melhor qualidade, porque isso estava articulado à rotina de trabalho deles.
Nos Cieps, muitos professores que faziam estágio podiam fazer o concurso e se integrar àquele tipo de escola já conhecendo bem o projeto, dentro da proposta de educação integral do Ciep, que era alguma coisa inovadora.

Marcelo Abud:
A professora explica que educação integral vai além da chamada educação em tempo integral.

Libânia Xavier:
A educação integral ela visa a formação de vários aspectos da pessoa: é uma educação moral, é uma educação cívica, cognitiva, artística, é uma educação política também – e eu não estou falando de educação político-partidária – mas da criança saber se comportar coletivamente, saber respeitar as diferenças, saber estabelecer representatividades, formas de participação mais conscientes na própria vida da escola.
Então, essa perspectiva de educação integral ela implica na implantação de um trabalho interdisciplinar, ela articula todos esses processos, ela exige uma atenção dos professores e um trabalho integrado.

Música: “O Trono do Estudar” (Dani Black), vários artistas
(Arnaldo Antunes) Que neste trono todo ser humano é rei
Seja preto, branco, gay, rico, pobre, santo, ateu

Libânia Xavier:
Enquanto que a educação em tempo integral é aquela que poderia sim ser criticada como ‘bom, a criança pode ficar um tempo grande na escola, um tempo ampliado sem fazer nada’. Ou fazendo jogos, ou só brincando. Ela não vai ser melhor do que uma educação parcial…
O fato de a criança poder ocupar a escola e ficar ali, usar a escola pra mais do que o acesso aos conhecimentos escolares formais já é importante, mas se a criança fica na escola e tem uma formação também artística, política, moral, física, essa criança ganha, aprende a trabalhar também coletivamente, a conhecer melhor a própria instituição onde ela frequenta, a ver os limites.
Essa experiência é um legado extremamente importante – essa diferenciação, né? – as crianças poderem viver plenamente uma educação integral, uma formação mais ampla, né?

Marcelo Abud:
Aprovada em dezembro de 1996, a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação) é conhecida popularmente como Lei Darcy Ribeiro, por ter sido ele um dos principais formuladores dos artigos. Libânia resume algumas das proposições do educador em prol da educação pública presentes na lei.

Libânia Xavier:
Aspectos como direito de toda criança à educação, da educação intercultural indígena e, também, da inclusão de crianças com necessidades especiais nas redes regulares de ensino; também a perspectiva de que a formação dos professores deveria se dar em nível superior… expressa a preocupação dele e dos grupos que aturaram na confecção da lei em preservar e elevar a qualidade da formação dos professores, entendendo que são os professores as pessoas que vão, na prática, democratizar o ensino, elevar a sua qualidade. Daí o investimento nessa formação, criando condições favoráveis de trabalho pra esse professor.

Música de Reynaldo Bessa, instrumental, fica de fundo
O pensamento de Darcy Ribeiro em defesa da escola pública move quem vê a educação como possibilidade de diminuição das desigualdades sociais.
Marcelo Abud para o Instituto Claro.

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