O cinema de animação é muito antigo, começou praticamente junto com o cinema. E foi se desenvolvendo paralelamente ao aperfeiçoamento da sétima arte: cinema mudo, cinema sonoro, cinema colorido e, depois, cinema digital. Tudo isso interferiu na popularização e na qualidade do cinema de animação.

No início do século XX, muitos curtas foram realizados. Poucos sabem que o primeiro longa metragem de animação chamou-se El Apóstol e foi feito na Argentina, em 1917, por Quirino Cristiani, um italiano radicado em Buenos Aires.  O mesmo cineasta realizou, em 1930, o primeiro longa metragem sonoro de animação chamado Peludópolis.

Nos anos 1920 o primeiro personagem de animação a conquistar o público foi o Gato Félix, criação dos irmãos Fleisher (animadores britânicos que mais tarde criariam Betty Boop). A popularidade do Gato Félix gerou uma série de brinquedos com sua marca, mostrando o potencial mercadológico dos desenhos de animação.

Walt Disney, nos EUA, compreendeu a importância de criar narrativas com personagens bem construídas e com personalidade facilmente identificada com o público. Após ter sido passado para trás, por não ter registrado seus primeiros personagens (o Coelho Osvaldo e Alice), criou Mickey Mouse, em 1928, para competir com o Gato Félix. O sucesso foi imenso que em seguida criou Minnie Mouse, a namorada de Mickey. Depois vieram Pato Donald, Pateta e Pluto. Disney aproveitou que estava surgindo o cinema sonoro e o cinema em cores, desenvolvendo sua carreira já com essas tecnologias. Realizou vários curtas metragens premiados como Os Três Porquinhos (1933) e O Touro Ferdinando(1938). Foi dele o primeiro longa metragem de animação sonoro e colorido: Branca de Neve e os Sete Anões, até hoje um clássico! Outros longas metragens de Disney se tornaram clássicos na década de 1940: Pinóchio (1940), Fantasia (1940), Dumbo (1941) e Bambi (1942).

                                              

É também na década de 1940 que os personagens de Disney ganham as histórias em quadrinhos. Pato Donald, um personagem coadjuvante dos filmes de Mickey, ganha vida própria e se torna um astro nos quadrinhos produzidos por Carl Barks, Pato Donald ganha vida própria. Outros personagens se tornaram mais famosos nos HQs como Tio Patinhas, Peninha, Vovó Donalda. No Brasil, os quadrinhos de Disney surgem como parte da revista Seleções, em 1942. Depois entram em suplementos dos jornais, em tirinhas. Em 1950 chega às bancas brasileiras a revista O Pato Donald. A marca Disney só perderá a hegemonia das revistas em quadrinhos com o sucesso dos personagens de Maurício de Souza, nos anos 1970.

Na década de 1950, com o advento da televisão, Disney também leva seus desenhos para o novo veículo, mas a hegemonia da animação para TV fica com os desenhos de Hanna& Barbera.

É clara a ligação de Disney com a política governamental dos EUA, incluindo a Política de Boa Vizinhança, que o Presidente Roosevelt implementou para conquistar o mercado da América Latina, com destaque para o mercado cultural. Dois filmes que Disney realizados no período revelam esse compromisso de aproximação: Alô, Amigos (1942) e Os Três Cavalheiros (1944), esse último integra o  episódio Você já foi à Bahia? O personagem Zé Carioca, estereótipo do brasileiro que gosta de samba, cachaça e pouco trabalho é criado para este filme. As músicas são de Ary Barroso (Aquarela do Brasil) e Zequinha de Abreu (Tico-tico no fubá). Em Alô, Amigos aparecem, pela primeira vez, personagens reais contracenando com desenhos. Aurora Miranda, que interpreta a irmã Carmen Miranda, interage com os desenhos, com absoluto sucesso.  

Durante a Segunda Guerra, Disney colabora com as forças armadas criando desenhos para instruir soldados, período em que ele quase vai à falência, com os estúdios à beira de fechar as portas. Ele, então, opta por investir em mais um longa metragem – Cinderela (1950) – que fez muito sucesso, levando-o a reerguer a empresa e ainda criar o parque Disneylândia (1955). Produziu também Alice no País das Maravilhas (1951), Peter Pan (1953), A Dama e o Vagabundo (1955), A Bela Adormecida (1959), Os 101 Dálmatas (1961), A Espada era a Lei (1963). Mogli, o Menino Lobo (1967) foi o último que teve participação de  Walt Disney que faleceu em 1966, antes da estreia.

Os estúdios Disney continuaram produzindo longas de animação, mas a qualidade estética, o cuidado com o roteiro e a profundidade das histórias dificilmente alcançaram os clássicos já citados. Alguns deles merecem destaque, pois marcaram época: Aristogatas (1970), A Pequena Sereia (1989), A Bela e a Fera (1991) e O Rei Leão (1994).

A obra de Disney no cinema de animação agrada profundamente às crianças de todas as idades, inclusive as bem pequenas resultado da união de qualidade estética, produção musical e  personagens muito sofisticadas. Infelizmente é comum ver o uso desses filmes para preencher o tempo ou “tranquilizar” as crianças pequenas sem aproveitá-los como fonte para a ação pedagógica.

Os filmes da primeira fase revelam valores e comportamentos da época (anos 1940 a 1960), portanto, trazem abordagens às vezes ingênuas para os tempos de hoje. Embora a narrativa não seja simplificadora, o enfoque é maniqueísta, com vilões e heróis muito marcados. Os educadores podem perfeitamente trabalhar essas tramas com crianças de várias idades, trazendo a questão para os tempos atuais. Por exemplo, será que as meninas de hoje ainda sonham com um príncipe encantado como Cinderela? Será que o exemplo de uma boa dona de casa como Branca de Neve cabe nos tempos atuais? Diante da reconfiguração das famílias contemporâneas, será que a ideia de madrasta má também não precisa ser reavaliada? Nada disso tira a legitimidade do uso dos filmes, desde que contextualizados, o que contribui profundamente para a leitura crítica dos desenhos.

Alguns filmes tocam em emoções profundas, quase sempre ligadas a perdas e/ou afastamentos da mãe ou do pai, como Pinocchio, Dumbo, O Rei Leão, Bambi. O educador deve se preparar para acompanhar e respeitar essas emoções entre as crianças, entendendo que é um ótimo momento para fazê-las emergir.

 

Muitos dos filmes da Disney são adaptações de contos de fadas escritos ou compilados principalmente por Charles Perrault e pelos Irmãos Grimm. Muitos desses contos vêm da tradição oral  e narravam histórias muito dramáticas, de maus tratos, sem final feliz e que foram amenizados nos desenhos de Disney. As crianças de hoje estão mais acostumadas com narrativas de final feliz, o que não impede de se trabalhar com as versões originais, identificar e trabalhar as diferenças. Um exemplo da diversidade das narrativas é a
Cinderela ou A Gata Borralheira, adaptado de um conto chinês por Charles Perrault em 1697, reescrito pelos Irmãos Grimm, no século XIX.
·         Branca de Neve, conto alemão compilado pelos Irmãos Grimm, entre 1812 e 1822;
·         A Bela Adormecida, rescrito pelos Irmãos Grimm, no século XIX;
·         Os Três Porquinhos, escrito por Joseph Jacbobs, em 1890;
·         A Bela e a Fera, escrito por Andrew Lang, 1889;
·         Peter Pan, escrito por J. M.Barrie, 1911;
·         A Pequena Sereia, história de Hans Chrstian Andersen, século XIX;
·         Pinocchio – romance italiano, escrito por Carlo Collodi, em 1881;

A Disney reorienta sua produção a partir da aliança com a Pixar, o que é objeto de outro artigo aqui no Portal NET Educação.

O Instituto Claro abre espaço para seus colunistas expressarem livremente suas opiniões. O conteúdo de seus artigos não necessariamente reflete o posicionamento do Instituto Claro sobre os assuntos tratados.

Autor Cláudia Mogadouro

Cláudia é doutora em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicações e Artes da USP. Graduada em História, especialista em Gestão de Processos Comunicacionais, mestre em Ciências da Comunicação pela ECA-USP e pesquisadora do Núcleo de Comunicação e Educação da USP.

Receba NossasNovidades

Captcha obrigatório
Seu e-mail foi cadastrado com sucesso!

Receba NossasNovidades

Assine gratuitamente a nossa newsletter e receba todas as novidades sobre os projetos e ações do Instituto Claro.