Publicado em
16 de dezembro de 2014
No dia 10 de novembro foram lançadas, em São Paulo, as publicações, do Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), a TIC Educação 2013 e TIC Kids Online Brasil 2013, num evento realizado no auditório do Centro Brasileiro Britânico. Na ocasião, houve um debate com especialistas contando com, entre outros, Guiherme Canela, do Escritório Regional de Ciência da Unesco para América Latina e Caribe, Maria Luiza Belloni, professora da Universidade Federal de Santa Catarina (Ufsc), e Venâncio Massingue, do Instituto de Investigação em Ciência, Inovação e TIC, em Moçambique. O tema foi “O papel dos educadores na formação de crianças e adolescentes para o uso crítico das TIC”. É possível ver o vídeo da discussão e as publicações do CETIC.br estão disponível na página da internet da instituição.
O caráter continuado deste tipo de levantamento pode mostrar certas tendências de uso da rede, além de evidenciar novas questões relacionadas às interfaces entre a internet, as mídias digitais e a educação. Alguns dos dados revelados pela pesquisa, que podem ajudar a traçar políticas micro e macro para o uso educativo da web, indicam que:
• A escola continua um local importante para o acesso à internet para parte das crianças e jovens (37% dos entrevistados), embora continue crescendo o uso da internet no próprio lar dos estudantes (68% afirmaram acessar a rede em casa);
• 70% e 47% dos professores acreditam, respectivamente, que seus alunos sabem mais sobre o computador/internet e que os estudantes estão sobrecarregados de informação por conta da internet;
• Há um forte autodidatismo no aprendizado do uso da internet pelas crianças e jovens: 54% dos estudantes dizem que aprenderam sozinhos a usar a rede.
Nas considerações finais de cada participante do debate, o especialista moçambicano notou, como uma espécie de provocação, que pouco se havia falado sobre o que era o “uso crítico” da internet. De fato, ninguém deu uma definição unívoca para essa expressão. Porém, acredito que certas ideias envolvem o que podemos entender como um “uso crítico” da internet pelas crianças e jovens.
Uma analogia com a expressão “pedagogia crítica” pode ser esclarecedora. O pesquisador Colin Lankshear, numa entrevista, traz a definição como aquela que “tem a tarefa de ajudar os/as estudantes a compreender seu mundo em termos de suas multiplicidades; a compreender diversidade e diferença em termos de alternativas e opções discursivas”. Além disso, tentaria habilitar os estudantes a participar de novos discursos, posicionando-se em relação a eles. Assim, creio que podemos entender um “uso crítico da internet”, num sentido similar, como aquele intrinsecamente relacionado à promoção da cidadania digital dos que utilizam a web, em particular, as crianças e jovens.
Desse modo, provavelmente este conceito supera, embora também compreenda, uma expressão muito comum na década passada: “uso seguro da internet”. O uso crítico corresponde, por isso, a um entendimento mais afinado com os propósitos da educação: favorecer uma consciência crítica e não manipulada. A noção de crítica é também um conceito não unívoco, mas podemos pensá-la novamente a partir de uma contribuição de Lankshear (na entrevista já citada). Este pesquisador nota que algo para receber esse qualificativo deve possuir, no mínimo, duas características. A primeira é que tenha um elemento de avaliação e julgamento e, em segundo lugar, um elemento analítico para conhecer mais de perto o objeto da crítica e fazer as avaliações referidas.
Dessas ações reflexivas, alguém pode partir às ações práticas consequentes, adequadas. Por isso, o “uso crítico” da internet deve ser “seguro”, na medida em que favoreça práticas que não coloquem em risco as pessoas. Ao contrário, deve fazer com que, ao se engajar em qualquer tipo de ação discursiva, o indivíduo compreenda as implicações disso para o seu bem viver e de outras pessoas. Enfim, torne a utilização da web uma oportunidade de crescimento, promoção de uma expressão responsável e “crítica”.
Pesquisas como as feitas pelo Cetic.br podem ajudar na reflexão sobre estratégias que permitam aos educadores promover, em relação às crianças e aos jovens, os objetivos mencionados.
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Autor
Richard Romancini
Richard é doutor em Comunicação, pesquisador e professor do curso de pós-graduação lato-sensu em Educomunicação da ECA-USP.