Leonardo Valle
Seja no trabalho, família ou nas relações afetivas, muitas atitudes machistas se desenvolvem no cotidiano sem que os envolvidos percebam. Em linhas gerais, são situações que tentam desmerecer a opinião da mulher ou suas percepções sobre uma situação.
“Não acontecem somente em ambientes de trabalho, estando ligadas a cenários em que a mulher está ‘no público’, ou seja, emitindo opiniões e explicando conceitos que entende. Isso pode acontecer até mesmo online”, conta a fundadora da ONG Think Olga, Juliana de Faria.
“Historicamente, a mulher é entendida como cidadã de segunda classe. Como um ser doméstico cujas atribuições se limitam aos cuidados da casa, marido e filhos. Então, ela não é vista como esse ser público, que anda pelas ruas ou que trabalha. Quando ela assume esse espaço, acaba sendo desvalorizada”, contextualiza.
Recentemente, foram cunhados quatro termos que ajudam a explicar as diferentes situações de machismo no cotidiano. Conheça!
Mansplaining
O termo junta as palavras de língua inglesa man (homem) e explaining (explicar). “É quando um homem tenta explicar algo óbvio para uma mulher, dizendo de forma didática, como se ela fosse incapaz de entender”, resume Faria.
O mansplaining também inclui situações em que um homem tenta convencer que a mulher está errada sobre algo que tem menos conhecimento que ela. Aconteceu com a estrategista de marketing Tatiana Pereira, quando um cliente a contratou para elaborar um plano comercial para a empresa dele.
“Além de mim, uma agência de publicidade foi contratada para elaborar o plano de marketing. Em uma reunião, quando eu fui explicar a minha parte no projeto, o presidente da agência falou em alto e bom som: ‘Menina, eu achei que tinha ficado claro para você que isso não será feito’. Ele desconhecia do que estava falando e julgou que não cabia para o nosso cliente comum. Essa não era a área dele”, relembra.
“Respirei e respondi: ‘Eu pensei que havia ficado claro que eu fui contratada para fazer o planejamento estratégico comercial. Então, eu sou a melhor pessoa para julgar o que é melhor ou não para o cliente nesse setor’”, conta.
“Ser mulher e mais jovem fazendo um trabalho complementar ao de um CEO de uma agência famosa parecia que o ofendia”, reflete.
Manterrupting
O termo junta as palavras man (homem) e interrupting (interrupção). Basicamente, diz respeito a homens que interrompem as mulheres em reuniões, impedindo-as de terminar a frase ou concluir um pensamento.
A economista Fernanda Caruso Rodrigues é especialista em mercado e vivenciou isso com um gestor. “Era constantemente interrompida por ele nas reuniões, que não fazia o mesmo com homens que estavam em cargos inferiores ao meu”, revela. “Cansava de dizer ‘espera aí que vou terminar e você fala’”.
Bropriating
O mesmo gestor de Rodrigues tinha o costume de pedir para ela fazer relatórios, mas nunca a deixava apresentá-los em reunião. Fazia isso por ela. “Ou, nas reuniões, repetia as coisas que eu tinha acabado de falar com outras palavras”, assinala.
Para essas situações, existe o termo bropriating, que mistura as palavras bro, em referência a brother (irmão), e appropriating (apropriação). “É quando um homem se apropria da ideia de uma mulher ou leva o crédito por algo que ela produziu”, ensina Faria.
Gaslighting
O termo gaslighting surgiu por conta de um filme homônimo, de 1944, em que um homem tenta se apropriar da fortuna da esposa criando situações para ela pensar que está louca. A palavra é usada para circunstâncias em que percepções, memórias, raciocínio e sanidade da mulher são colocadas em dúvida pelo homem. O famoso “você está louca”.
A professora Samantha Lodi vivenciou situações de gaslighting quando foi traída durante um namoro no período da faculdade. “Eu desconfiei de algo e era tratada como ridícula. Amigos e familiares dele foram convencidos que eu era realmente louca. Um dia, minha ex-cunhada e ex-sogra vieram conversar comigo para eu mudar”, lembra. “Procurei ajuda profissional porque acreditei nisso. A princípio, não aceitei as indicações da psicóloga de que meu relacionamento não era bom para mim.”
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