Leonardo Valle
Há dois anos, pequenos canteiros, sacadas, terraços e lajes começam a se destacar no cenário de Paraisópolis, uma das maiores comunidades de São Paulo (SP). O motivo, segundo o presidente da União dos Moradores de Paraisópolis, Gilson Rodrigues, é o projeto Horta na Laje, que, desde 2017, capacita os habitantes da região a plantarem verduras, hortaliças e legumes em suas próprias casas.
Desde que começaram as atividades, mais de 3,5 mil pessoas passaram pelo programa, que acontece sempre na segunda sexta-feira do mês, e também na última.
“A maior parte dos moradores é migrante de estados do Nordeste e já possuía uma cultura de plantio, mas como em São Paulo não tem terra e chão para plantar, não desenvolviam suas habilidades”, explica o líder comunitário. “A laje também é um espaço usado para diversão, principalmente churrascos. Então, a ideia é deixar um cantinho desse local para os moradores da casa poderem plantar e consumir o que cultivam”, sugere.
O projeto é uma parceria do Instituto Stop Hunger, da empresa Sodexo, com a União dos Moradores e do Comércio de Paraisópolis e a Associação de Mulheres de Paraisópolis. O curso acontece na sede da União e recebe inscrições no local ou pela internet.
A lista de itens que podem ser cultivados é grande e inclui coentro, salsa, salsão, salsinha, berinjela, alface, jabuticaba, amora, couve, quiabo, hortelã, cenoura, batata e alecrim. Para o plantio, são utilizados bombonas plásticas – espécie de tonéis – que são cortadas ao meio, além de garrafas pets e caixas de feira, que são preparadas para receberem as terras e as plantas.
“Também são plantadas flores, que, apesar de não serem consumidas, ajudam a decorar o ambiente e deixar as bombonas mais coloridas e alegres”, pontua Rodrigues.
Comunidade sustentável
Uma vez por mês, a instituição faz a colheita dos vegetais que já estão aptos para consumo e os distribui para os participantes do curso. “Também disponibilizamos terras, mudas, sementes e bombonas para estimular os alunos a plantarem em casa, já que muitos não têm recursos para adquirir os materiais”, conta Rodrigues.
De acordo com ele, o objetivo do Horta na Laje é estimular uma cultura de alimentação saudável, mas o plantio também pode servir como uma complementação de renda. É o caso do projeto Café & Bistrô Mãos de Maria, no qual trabalham mulheres capacitadas pelo curso. O estabelecimento funciona durante a semana e um sábado por mês.
“O plantio também é fonte de economia. Pelas nossas contas, é possível economizar mil reais em um ano ao consumir os itens que se planta”, diz.
O líder comunitário ainda acredita que a iniciativa ajuda a melhorar a autoestima do bairro, retratado na mídia por seus problemas sociais e violência. “Se fossemos uma região de elite, chamaríamos nossos espaços de plantio de ‘rooftop’ ou terraço. Mas somos da periferia, e mostramos que é possível ter uma laje tão bonita e enfeitada quanto outros espaços”, opina. “O que vemos nesses dois anos é que muitas pessoas acharam boa a iniciativa e vão reproduzindo. Aos poucos, vamos mudando a cara da favela e mostrando que ela também pode ser verde e sustentável”, comemora.
Para o futuro, Rodrigues espera que “toda laje de Paraisópolis tenha uma horta”. “Que ela perca um pouco do vermelho das casas sem reboco pelo verde das plantas”, planeja.
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