“Atypical” é uma série da Netflix com quatro temporadas (2017-2021) que acompanha a vida de Sam, interpretado por Keir Gilchrist, um adolescente dentro do Transtorno do Espectro Autista (TEA). Segundo a pedagoga Josiane Cristina Amorim Silva, observá-lo traz uma visão educativa sobre o autismo.

“O jovem está no ensino médio e passa por questões comuns da adolescência, como problemas familiares, relacionamentos afetivos e ingresso na faculdade. Ou seja, para além da deficiência, há um sujeito com desejos, vitórias, medos, limitações, concepções ideológicas e gostos que não devem ser generalizados”, explica.

A pedagoga Mônica Gabrielly Teixeira de Barros Boanafina indica essa produção para educadores, alunos e graduandos de pedagogia por discutir temas como inclusão social, acessibilidade, padrão de normalidade e diversidade.

Leia também: Um autista, um autismo: transtorno acomete de forma particular

“A série mostra que as ‘diferenças’ observáveis no outro não devem ser concebidas como inferioridade ou incapacidade, mas algo que os tornam singulares”, pondera.

Entender essa singularidade é um ganho para os professores, incluindo aqueles que atuam no Atendimento Educacional Especializado. “É possível refletir sobre a importância de elaborar ações pedagógicas que não sejam homogeneizantes, excludentes e discriminatórias”, destaca Silva.

As duas pesquisadoras são autoras do artigo “Representações do autismo na série ‘Atypical’”, presente no e-book gratuito “A educação em séries: temas e tramas” (2020), da Universidade Federal do Piauí (UFPI).

Olhar empático

Para sensibilizar sobre o espectro, as autoras indicam assistir ao sexto episódio da primeira temporada e criar uma roda de discussão com os estudantes. O capítulo mostra que o barulho e a iluminação impedem Sam de ir ao baile de formatura. Sua mãe, Elsa (Jennifer Jason Leigh), e Paige (Jenna Boyd), sua namorada, conseguem, por meio do diálogo, usar recursos tecnológicos para adaptar o evento e torná-lo uma “festa silenciosa”. As mudanças são aceitas pela maioria dos pais e estudantes.

“Assim, se esclarece que não basta apenas incluir, é preciso possibilitar o acesso”, comenta Boanafina.

Já para Silva, o exemplo tende a funcionar como um aprendizado para os colegas: “A situação pode instigar a redirecionar o olhar dos alunos, tornando-os mais empáticos aos diferentes sujeitos da nossa sociedade. Mostra que o mundo à nossa volta pode ser concebido de diferentes maneiras, sendo a perspectiva do autista uma delas.”

O que é ser ‘normal’?

Outro tópico que pode ser abordado em roda de conversa são os padrões de normalidade. Para professores e estudantes que convivem com um aluno como Sam, um desafio comum são os comportamentos do colega serem lidos como “inadequados”.

“Pessoas dentro do espectro podem apresentar diferentes habilidades de comunicação e socialização. Sam, por exemplo, possui excesso de sinceridade”, diz Boanafina. “Porém, qualquer pessoa, autista ou neurotípica, pode se comportar de forma ‘inadequada’ quando sob pressão, injustiçada ou frente a uma situação inesperada.”

Os personagens de “Atypical”, em algum momento, sentem-se como o protagonista. “A série sinaliza que pessoas ditas ‘normais’, em determinadas situações, podem agir de maneira inusitada, questionando o que seria um ‘padrão de normalidade’”, descreve Silva.

Um dos episódios que ajuda a fomentar essa discussão com a classe é o segundo da primeira temporada, quando a mãe de Sam esfrega suas nádegas no carro da terapeuta Julia (Amy Okuda) após se irritar com o comportamento agressivo dela com seu filho.

Outro é o oitavo da mesma temporada, no qual Julia, que está grávida, não aparenta a felicidade esperada durante o exame de ultrassonografia. “Apresenta tristeza e ansiedade”, relata Boanafina.

Mais um exemplo pode ser visto no pai de Sam, Doug (Michael Rapaport), que demonstra dificuldades para se comunicar e se abrir com a família e os amigos. “Isso o leva a uma crise de pânico na quarta temporada”, comenta Silva.

Ainda sobre normalidade, outro diferencial de “Atypical” é que as potencialidades de Sam são valorizadas. “A série compreendeu que apenas exaltar o comportamento considerado ‘inadequado’ do sujeito com autismo desmereceria suas conquistas, habilidades e sua própria humanidade. Assim, o autismo é mostrado como uma parte do ser humano complexo que Sam é”, analisa Boanafina.

Série inspira atividades

Além da roda de conversa sobre os temas abordados no programa, as pesquisadoras sugerem que professor e classe elaborem ferramentas que ajudem os alunos autistas, como os cartões de emoções citados no piloto da série.

“Eles permitem que as pessoas no espectro expressem emoções por meio do nome e imagem que representam cada uma delas. Atividade desafiadora também para pessoas neurotípicas, pois todos temos dificuldades de expressar emoções em algum momento”, afirma Silva.

Outra possibilidade é a confecção de uma prancha de comunicação para autistas não-verbais. Esse material, que pode ser impresso ou digital, reúne ilustrações, imagens, cores, números, objetos, ações, entre outros. “É uma tecnologia assistiva que permite que alunos no espectro se comuniquem com colegas e professores, ajudando na socialização e no ensino-aprendizagem”, contextualiza Boanafina.

Há também a opção de os próprios alunos produzirem palestras sobre o tema, “como fez o pai de Sam para conscientizar policiais sobre como abordar essa população”, finaliza Silva.

Veja mais:

Mães de alunos com autismo relatam desafios para acessar a escola pública

8 dicas para a inclusão de alunos autistas

Atualizado em 22/02/2022, às 09h58

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