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Escrito por Cláudio Thebas, a obra narra a rotina de uma idosa que mora sozinha e passa a maior parte do tempo limpando a casa.

O desafio de conseguir preencher as horas vagas se transformou numa aventura na qual Dorinha passa a entender que contemplar o mundo ao redor e viver o ócio são, também, uma grande aventura.

Segundo o educador, escritor e autor do livro, Cláudio Thebas, a protagonista é capaz de aproximar gerações.

“A criança, ao entrar em contato com o universo desta pessoa solitária que é a Dorinha, pode começar a perceber os estados dos idosos que estão à sua volta. Como será que está a minha avó? Como será que está esse meu avô? Então talvez ela se aproxime desse idoso ao perceber a condição em que a Dorinha vive”, explica.

Nessa viagem para o interior de si mesma, Dorinha começa a escrever uma longa carta em que registra cada som, cada momento, cada tom azul do céu. É assim que passa a preencher as horas.

“Ela se transforma nessa aventureira do mundo, da delicadeza, do encontro, aventureira da paisagem. Acho que o silêncio e o ócio são que nos convidam a entrar em contato com a vida”, filosofa o autor.

Cartas para Dorinha

Thebas recebeu cartas escritas por crianças e por mulheres adultas a partir de atividades propostas por escolas.

“Os adultos escreveram cartas, muitas mulheres retratando o quanto que a Dorinha retrata a vida delas de alguma forma. E as crianças escrevem cartas não para o Cláudio autor, escrevem cartas para Dorinha. É uma lindeza ver. Todas elas convidam a Dorinha para: ‘Vem comer com a gente’, ‘Vem aqui na biblioteca’”, explica.

O escritor vê essa iniciativa como inspiração para atividades com o livro em sala de aula.

“Eu tenho a convicção de que é um grande material de trabalho para as escolas. Será que as crianças escrevem cartas? Já escreveram cartas? E se as crianças conversassem com seus avós, com seus pais, sobre cartas? E se essas crianças escrevessem cartas umas para as outras? Uma caixinha de correio, é infinita a possibilidade”, sugere.

Transcrição do Áudio

Música: Introdução de “O Futuro que me Alcance”, de Reynaldo Bessa, fica de fundo

Cláudio Thebas:

A criança, ao entrar em contato com o universo desta pessoa solitária que é a Dorinha, pode começar a perceber os estados dos idosos que estão à sua volta. Como será que está essa minha avó? Como será que está esse meu avô? Como será que está essa pessoa idosa que conheci e que talvez seja algum parente. Então talvez ela se aproxime desse idoso ao perceber a condição em que a Dorinha vive.

Eu sou Cláudio Thebas. Tenho 59 anos. Sou educador há mais de trinta, palhaço há quase trinta e pai dos meus filhos desde que eles nasceram.

Vinheta: Livro Aberto – Obras e autores que fazem história

Música de Reynaldo Bessa, instrumental, fica de fundo

Marcelo Abud:

“As aventuras de Dorinha” é o livro mais recente de autoria de Cláudio Thebas e da ilustradora Bruna Lubambo. A história gira em torno do cotidiano de uma personagem que vive tão entretida em tarefas domésticas que mal percebe a melancolia tomar conta de sua vida. Mas, afinal, quais as aventuras de Dorinha?

Cláudio Thebas:

Ela não enfrenta dragões, leões marinhos, piratas… a grande aventura dela e talvez seja uma grande aventura, talvez, de boa parte da gente é suportar a solidão, o vazio, o desamparo. Então a grande aventura dela é cotidiana. Ela limpando e limpando, limpando a sua casa pra suportar esse grande oceano de solidão. Mas algo acontece no livro em que ela transforma essa aventura de dentro de casa em uma aventura pelo mundo.

Acho que a importância do livro, além de falar da condição feminina, é também de falar da importância de a gente colocar luz sobre o cuidado, cuidado sobre o idoso que às vezes está só, sobre a criança… cuidarmos uns dos outros.

Marcelo Abud:

Em determinado momento do livro, Dorinha faz uma viagem para o interior de si mesma. Debruçada sobre a mesa e sobre o tempo que dormia, escrevia sem parar. É assim que passa a preencher as horas, já que não recebe cartas nem visitas.

A narrativa inspirou atividades com estudantes no lançamento do livro.

Cláudio Thebas:

OIha, foi uma surpresa que eu recebi de adultos que estão aprendendo a ler e escrever, de um colégio aqui de São Paulo – projeto do colégio – e das crianças do projeto Pró Saber também, de uma biblioteca em Paraisópolis, que é uma comunidade grande aqui de São Paulo.

Eles estavam juntos no lançamento do livro e sem que eu soubesse foi proposto a eles, anterior ao encontro comigo, que escrevessem cartas porque, no livro, a Dorinha escreve cartas, passa a escrever cartas.

E aí, aos adultos o livro contou uma coisa, às crianças contou outra, cada um aprende da arte aquilo que lhe diz respeito. Eu nunca escrevo nenhum livro pensando no que eu poderia ensinar. Um livro infantil não deve ter esse desejo. Eu acho que o que cada um aprende do livro é aquilo que lhe inspira. É água da fonte, né, para uns vai servir para hidratar, para outros vai ser para outra coisa.

Marcelo Abud:

Segundo Thebas, é provável que todo mundo conheça algumas Dorinhas, mesmo que com outros nomes e outras histórias. O sentimento que as une é parecido: o de ser só em um mundo de tanta gente.

Cláudio Thebas:

Eu vou te falar quem é a Dorinha, a partir de algumas cartas que recebi por causa do livro. Algumas mulheres, não crianças, mulheres mesmo falam algo assim: ‘Todas nós somos Dorinha’. A Dorinha é um pouco essa mulher que a gente conhece, alguém tem na família, que trabalha sem parar e muitas vezes trabalha para preencher os vazios da sua existência.

Então os adultos escreveram cartas, muitas mulheres retratando o quanto que a Dorinha retrata a vida delas de alguma forma; e as crianças escrevem cartas não para o Cláudio autor, escrevem cartas para Dorinha. É uma lindeza ver.

Todas elas convidam a Dorinha, personagem do livro, para: ‘Vem comer com a gente’, ‘Vem aqui na biblioteca’. Então acho que o livro ele acaba tendo a importância, esse livro especificamente ao falar de solidão, para falar que a solidão é uma condição talvez de todos nós, e o que que a gente pode fazer quando percebe que o outro está sofrendo com solidão e não está em solitude, como diria o Christian Dunker, que é um ‘estar bem consigo mesmo’.

Som de página de livro sendo virada

Marcelo Abud:

Thebas tem sugerido outras atividades que envolvam a escrita de cartas no ambiente escolar.

Cláudio Thebas:

Então isso revelou a potência dessa atividade. Eu tenho a convicção de que é um grande material de trabalho para as escolas. Será que as crianças escrevem cartas? Já escreveram cartas? E se as crianças conversassem com seus avós, com seus pais, sobre cartas? E se essas crianças escrevessem cartas umas para as outras? Uma caixinha de correio, é infinita a possibilidade. Tudo voltado pra recuperação do ócio, estar consigo e estar com o outro. Atividade que pode ser desenvolvida pelo livro através das cartas.

Som de página de livro sendo virada

Marcelo Abud:

Para Thebas, o livro aborda a solidão de forma lúdica. Isso estimula as crianças a se familiarizarem com o universo do envelhecer e faz com que deem maior atenção às pessoas idosas. Outro objetivo da obra é mostrar que o silêncio e o tempo vazio não precisam ser preenchidos com uma infinidade de tarefas.

Cláudio Thebas:

Um documentário, eu acho que é o “Tarja Branca”, que alguém fala que negócio, quando a gente fala assim ‘Eu sou um homem de negócios’, é um homem que nega o ócio; ‘Uma mulher de negócios’ é que nega o ócio: negócio. A gente vive numa sociedade em que se você está parado, você não está produzindo, se você não está produzindo, você não é útil. E muitas vezes associa-se o silêncio ou o descanso a recuperar fôlego para continuar produtivo.

De alguma forma, o livro convida a gente a esse descanso, porque a gente merece descansar; o ócio, porque a gente merece contemplar, porque a vida é feita de belezas que no corre-corre a gente não vê.

De certa forma, essa é a segunda aventura da Dorinha. A hora que ela deixa de ser essa é mulher de negócios – que ela vai negando o silêncio para suportar o próprio silêncio –, ela se transforma nessa aventureira do mundo, né, aventureira da delicadeza, aventura do encontro, aventureira da paisagem. Acho que o silêncio e o ócio é que nos convidam a entrar em contato com a vida.

Som de página do livro sendo virada

Marcelo Abud:

O livro é ilustrado por Bruna Lubambo. A artista utiliza esponja de cozinha para estampar os desenhos feitos com moldes de estêncil. O resultado imprime à narrativa visual a sensação de esquecimento.

Thebas comenta um trecho de “As Aventuras de Dorinha” em que a personagem luta contra esse sentimento.

Cláudio Thebas:

Num determinado ponto do livro, a Dorinha simplesmente desistiu de lutar contra o vazio e fazer as coisas. Então o livro fala assim: ‘Esperando pela noite, pois a noite não se atrasa, engolindo o silêncio, que engolia a sua casa’.

O que eu acho que esse trecho fala é da importância do silêncio. A hora que a Dorinha simplesmente se deixa entrar em contato com o silêncio que engole a sua casa, aquilo contra a qual ela lutou, ela se permite escutar o seu silêncio interno.

Então a hora que ela escuta o silêncio de fora, que a oprime, ela se permite escutar um silêncio de dentro que pode libertá-la dessa opressão. O livro também fala um pouco disso: da escuta de si como uma expressão da nossa liberdade.

Música de Reynaldo Bessa, instrumental, fica de fundo

Marcelo Abud:

Em “As aventuras de Dorinha”, a solidão da personagem permite tratar temas como isolamento social e fragilidade das relações de forma leve.

Marcelo Abud para o Livro Aberto do Instituto Claro.

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