A formação dos futuros professores é feita de formas distintas no país, de acordo com cada instituição de ensino, acredita a doutora em Educação e secretária geral da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Maria Dalva Silva Pagotto. “Não temos uma política nacional de formação de professores. Há muitos cursos de formação inicial que são curtos. Em três anos se faz tudo”, pontua ela, que tem experiência na área de formação de professores.

Para Maria Dalva, uma diretriz nacional estabeleceria padrões mínimos a serem cumpridos. Apesar de não resolver como um todo a questão da formação dos professores, ajudaria, por exemplo, “na organização dos currículos dos cursos, mas sem engessar”, segundo ela. Abaixo, a entrevista concedida ao NET Educação.
NET Educação – Como você avalia a formação dos professores no Brasil?
Maria Dalva Silva Pagotto – É feita de formas muito distintas nas diferentes instituições. Também, a maior parte dos docentes são formados, têm ensino superior, e de acordo com a LDB [Lei de Diretrizes e Bases] é necessário isso para dar aula, mas existe uma parcela que ainda precisa se formar. Há ainda uma busca para formar melhor os professores, mas nem sempre o que as universidades oferecem é satisfatório e o aluno não pode contar com docentes bem qualificados para sua formação.
NET Educação – Qual acredita ser hoje o principal gargalo na formação do professor?
Maria Dalva – Não temos ainda uma política nacional de formação de professores. Além disso, a formação continuada, que deveria acontecer depois que a pessoa faz a licenciatura, é o que vai ajudar a qualificar o professor. Há muitos cursos de formação inicial que são curtos. Em três anos se faz tudo. Enquanto nas universidades públicas, para licenciatura e bacharelado, demora no mínimo quatro anos.
NET Educação – A construção de uma política nacional de formação inicial dos professores resolveria?
Maria Dalva – Uma política poderia organizar, estabelecer padrões para a formação. Não resolveria, porque existem outras varáveis a serem consideradas, mas ajudaria bastante. Com isso, seria organizada a destinação de recursos próprios para formação inicial e continuada, por exemplo. Também, estariam previstos a organização dos currículos dos cursos, mas sem engessar. Já temos o Conselho Nacional de Educação que estabelece os currículos e certamente com uma política para isso, os estados olhariam melhor se está sendo de fato cumprido.
A qualificação de formadores também estaria previsto. Por exemplo, as universidades estão tendo dificuldade para implantar a disciplina de libras, porque não se dedicam fortemente a isso, não têm pessoas qualificadas. Acabam fazendo por meio de programa de extensão, contratam pessoas de fora da universidade e vai caminhando, mas não consegue ganhar substância.
NET Educação – Há perspectivas atuais nesse caminho para a construção dessa política?
Maria Dalva – Não é fácil, quando o município, estado e União não são do mesmo partido. Vivenciamos dificuldade de engajamento de São Paulo no Parfor [Plano Nacional de Formação dos Professores da Educação Básica] que é do governo federal, por exemplo. Juntar esses entes federados é o modelo ideal que está na meta 15 do PNE [Plano Nacional de Educação].
O professor precisa ser o centro da formação mesmo. Na formação de um médico, o residente passa na enfermaria olhando os casos, discute o caso, e no final, depois da análise, levantava diagnóstico. Por que não formar o professor com o mesmo cuidado? Levando o estagiário para dentro da escola com acompanhamento de professores, para trabalhar junto com um professor formado, ver atendimento de alunos, família, participar de reuniões…
NET Educação – A falta disso também faz com que a profissão hoje do professor não seja atrativa? Como a formação se relaciona com a carreira?
Maria Dalva – Não só a falta de um plano que impacta, torna a carreira menos atrativa. Mas o fato de não ter de fato uma carreira. Se ele quiser, entra professor e fica professor, tem um aumento salarial por tempo de serviço. A formação requer bastante investimento do professor, para compensar pouco na carreira e salário.
NET Educação – Uma formação com diretrizes nacionais se refletiria no aprendizado dos alunos? Impactaria positivamente?
Maria Dalva – Fico um pouco receosa de estabelecer uma relação causal entre essas coisas: desempenho docente e do aluno. Claro que uma boa formação do professor e que se mantenha com a continuada, vai torná-lo um bom professor, e fazer com que trabalhe melhor com o aluno. Mas não temos avaliação sistemática de professores. Todo sistema de avaliação no Brasil é baseado nas provas de desempenho do aluno e transporta-se isso para a instituição, como fazendo por reflexo.
NET Educação – O que é ser um bom professor para você?
Maria Dalva – Isso fez parte da minha pesquisa de doutorado. Entrevistei alunos de 14 cursos da graduação de licenciatura da Unesp. O que apareceu foi que um professor é bom, porque sabe muito sobre o que ensina e procura as melhores formas de ensinar. O que tem domínio dos conceitos e busca inovação. Se um aluno não aprende de um jeito, tem que ensinar de outro.

Uma política poderia organizar, estabelecer
padrões para a formação (Crédito: Eliana
Assumpção/ACI/Unesp)
*A meta 15 do Plano Nacional de Educação (PNE) trata da formação de professores. No texto diz “ garantir, em regime de colaboração entre a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios, no prazo de um ano de vigência deste PNE, política nacional de formação dos profissionais da educação de que tratam os incisos I, II e III do art. 61 da Lei nº 9.394/1996, assegurando-lhes a devida formação inicial, nos termos da legislação, e formação continuada em nível superior de graduação e pós-graduação, gratuita e na respectiva área de atuação”.

 

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