“Aos poucos, com a acumulação de experiências e vivências, os índios me foram desasnando, fazendo-me ver que eles eram gente. Gente muito mais capaz que nós de compor existências livres e solidárias”. Com estas palavras Darcy Ribeiro singulariza sua atividade como antropólogo e etnólogo, reiterando serem os índios, sua gente.
No ano em que o educador, escritor e político completaria 90 anos de nascimento, o povo Yawalapíti, uma das comunidades do Alto Xingu, o homenageará com o ritual do Kuarup.
A cerimônia para Darcy será concretizada nos dias 18 e 19 de agosto, na aldeia Yawalapíti, Parque Indígena do Xingu e está sendo realizada em parceria com a Fundação Darcy Ribeiro, a Casa de Cultura Cavaleiro de Jorge e a Associação Yawalapíti Awapá (AYA).
O Kuarup
São diferentes os nomes que cada povo xinguano dá ao maior e mais importante ritual de sua cultura. Para os Yawalapítis, o nome é Itsatxi, na língua Aruak. Kuarup, como é mais conhecido, é da língua Tupi.
A cerimônia ocorre sempre no início do segundo semestre, mas os seus rituais preparatórios começam quase dez meses antes da festa. Suas etapas principais são a doação de pequi, a doação de polvilho, a quebra da castanha, a grande pescaria, a fabricação da sepultura cerimonial e os momentos finais, em que a alma do homenageado entra no tronco enfeitado.
O momento final, o Kuarup propriamente dito, é quando acontece a ressurreição simbólica do grande chefe, um rito de grande emoção. Em seguida, faz-se uma reclusão para que a alma do morto possa se estabelecer na sepultura cerimonial. Então as carpideiras começam o choro ritual, sem que os cantos em volta sejam interrompidos. Aos primeiros raios do sol do dia seguinte o choro e o canto cessam, os visitantes anunciam sua chegada com gritos, e iniciam competições entre os campeões de cada tribo, seguidas de lutas grupais para os jovens, conhecida como Huka- Huka.
Darcy Ribeiro, junto com o Marechal Rondon, Eduardo Galvão e os irmãos Villas-Boas, foi um dos autores do projeto de lei de criação do Parque Indígena do Xingu. Darcy pesquisou e divulgou a diversidade da identidade indígena brasileira. Por dez anos, o antropólogo viveu entre diferentes etnias do Pantanal e da Amazônia. Tinha como propósito salvar esses povos.
Benefícios para a aldeia Yawalapíti
O Kuarup de Darcy trará importantes legados ao povo Yawalapíti. Com 300 habitantes, hoje a aldeia é abastecida por meio de geradores elétricos movidos a combustível fóssil, que, além de caros, agridem o meio-ambiente. Assim, está em implantação um sistema de energia fotovoltaica: placas que captam a energia solar garantindo o abastecimento local por, pelo menos, 25 anos.
O novo sistema permitirá que a aldeia seja autossuficiente na demanda por energia elétrica. O primeiro módulo de placas fotovoltaicas está em fase de teste e os moradores da aldeia aprenderão a fazer a manutenção do sistema.
Outro benefício é o barco motorizado de 19 pés que a família de Darcy Ribeiro doou para a AYA, Associação que representa o povo Yawalapíti.
Foto: Ueslei Marcelino/Reuters
Este ano, a partir da homenagem a Darcy, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), do Ministério da Cultura, iniciou o processo do registro do Kuarup como patrimônio imaterial. Foi um pedido pessoal da ministra Ana de Hollanda que estará presente na cerimônia.