Conteúdos

– Contexto histórico filosófico do surgimento e desenvolvimento do racionalismo
– O mecanicismo como produto das ideias racionalistas
– Estrutura geral do pensamento de René Descartes

Objetivos

– Apresentar as condições históricas e filosóficas que permitiram o surgimento da filosofia racionalista
– Compreender a intenção metodológica, científica e filosófica do projeto racionalista
– Elucidar as características do mecanicismo
– Apresentar, em linhas gerais, a filosofia de René Descartes

1ª Etapa: Introdução geral ao contexto do século dezessete

Quando se ambiciona desenvolver um tema filosófico em que a ambientação histórica é tão importante quanto o material reflexivo, uma das técnicas mais eficazes que o (a) docente poderá adotar é a de colocar o aluno em uma situação de perplexidade.

Nesse aula, como o objetivo é apresentar o contexto do século dezessete, uma provocação possível para o início da conversa é a seguinte: “Imagine que, alguns meses depois que vocês concluíram o ensino médio, haja uma descoberta que aponte que tudo o que vocês viram nesse período estava errado. Todo o conhecimento que vocês adquiriram não tem qualquer validade, seria necessário reiniciar o processo de conhecimento de mundo e das pessoas, porque, tudo que se fez até aqui, perdeu completamente a legitimidade.” A reação dos alunos será de frustração e é exatamente esse o objetivo inicial. Caberá ao (à) docente explicar o caráter de reconstrução dos saberes que estavam em curso, apontar, de modo alusivo, fatores como as expansões marítimas, as reformas religiosas e as revoluções científicas como movimentos que lançaram o homem daquela época em um mundo que, até então, não era conhecido.

A queda do geocentrismo e estabelecimento do heliocentrismo na astronomia, a concepção geométrica da Terra, sendo alterada também no plano da astronomia, a descoberta de novos continentes e culturas e o Renascimento, que ainda reverberava fortemente nas artes e na filosofia. Tudo isso formou um ambiente de novidade e de otimismo, era um mundo novo que estava por ser descoberto e muitos acreditavam cegamente no poder da razão.

Para fechar essa introdução, o (a) professor (a) poderá perguntar – talvez até retoricamente – “quem nunca sonhou com um mundo perfeito?” e explicar o conceito de “utopia”, citando até mesmo os livros de Thomas More: A Utopia, Tomasso Campanella: A Cidade do Sol e Francis Bacon: A Nova Atlântida.

2ª Etapa: Apresentação geral do racionalismo e o surgimento do mecanicismo

Nessa etapa, ainda sem abordar precisamente um filósofo, o (a) professor (a) poderá questionar os alunos incitando à uma reflexão sobre os limites da razão humana. Apresentar a ideia que se cultivou no século dezessete de que, de algum modo, a razão humana poderia resolver todos os problemas da existência e que não havia nada que o procedimento racional não conseguisse desvendar. Sendo assim, o racionalismo se deu com a instrumentalização da inteligência, aplicando-a ao desvendamento da natureza, a domesticação dos processos naturais para vertê-lo à favor da humanidade e a crença na infalibilidade da razão. Toda a realidade poderia ser racionalizada, as potencialidades da mente humana poderiam ser exploradas em todas as suas possibilidades. É importante salientar o “clima” intelectual de otimismo e perplexidade, pois, até então, filosofia e ciência eram basicamente a mesma coisa.

A partir desse contexto, as ciências empíricas começam um desprendimento da tutela filosófica. A biologia, a física (matematizada), a química, as matemáticas, vão, aos poucos, ganhando autonomia e a fatoração dos saberes é uma decorrência direta do racionalismo.

Nessa mesma aula, para introduzir a ideia de mecanicismo, o (a) professor (a) poderá recorrer  à uma curiosidade e apresentar o invento tecnológico mais moderno do século dezessete, o relógio de ponteiro. A começar pelo caráter metafórico da questão, a quantificação exata do tempo pela matemática. Se o homem conseguiu utilizar matematicamente o transcorrer do tempo, o que mais não poderia fazer? Também há a questão material, alguns relógios eram compostos de milhares de peças e cada uma delas tinham uma função específica no funcionamento da máquina. A comparação surge daí: e se o universo funciona de acordo com uma estrutura semelhante, onde cada fragmento, cada pequeno detalhe, cumpre com uma função exata?

O mecanicismo, que será fundamental na elaboração de René Descartes, aproxima a engrenagem do universo como um mecanismo, pois acreditava que se a razão humana desvendasse a estrutura desses pequenos mecanismos, chegaria logicamente ao entendimento universal dos processos da natureza. É interessante que o (a) docente provoque essa cisma nos alunos e os instiguem a refletir nesse sentido. Afinal, podemos pensar todo o universo e tudo que há nele como uma combinação de grandes e pequenos mecanismos?

3ª Etapa: Exposição da filosofia de René Descartes e o método da dúvida como procedimento seguro

Na terceia aula, vale retomar o cenário sob qual a discussão se desenvolveu até o momento, um cenário que abrange tanto a desconfiança em relação ao conhecimento, como o otimismo em relação à razão. Assim, o (a) docente poderá apresentar a obra: “O Discurso do Método”, como o registro desse procedimento de readequação do método a partir do qual o conhecimento será levantado.

É possível que o (a) professor (a) conduza os alunos até a mesma conclusão a que chegou Descartes, apresentando o método da dúvida, também conhecido como “dúvida hiperbólica”. Será necessário expor que Descartes, disposto a não errar em nenhuma conclusão, começou a duvidar de tudo, da existência real do mundo, da matéria, de todas as coisas que compõem a realidade.

A partir dessa premissa, é possível provocar os alunos no seguinte sentido: “Se Descartes duvidou de tudo, qual a única coisa que ele não pode duvidar?” As respostas serão as mais inusitadas. É importante que o (a) professor (a) mantenha a atenção da sala no âmbito da reflexão racional e continue o processo de diálogo. O caminho didaticamente mais seguro para apresentar a conclusão de Descartes seria o seguinte: se o filósofo está duvidando de tudo, ele não pode duvidar que ele está duvidando, ou seja, duvidar é uma atitude própria do pensamento, então, se ele duvida, logo, ele pensa e, por conseguinte, se pensa, logo existe.

Eis o método e o resultado, a dúvida generalizada conduz até uma certeza basilar: “penso, logo existo”. Esse procedimento que pode parecer simples é considerado o marco que inaugura a filosofia moderna e orienta praticamente os três séculos que se seguiram.

É essa premissa – o Eu Penso – que passa a ser a base segura para que Descartes duvide de tudo, mas não duvide de sua existência e, a partir disso, considere o mundo inteiro tendo como base a sua percepção.

Há aí uma mudança paradigmática que deve ser enfatizada pelo (a) professor (a), pois a noção de  sujeito é alçada a um grau de importância sem precedentes na história do pensamento. A aula pode ser encerrada com uma provocação: “Será que as características do mundo estão no próprio mundo ou estão nas condições subjetivas em que nós o percebemos?”

4ª Etapa: Apresentação da ideia de subjetivismo e contextualização da filosofia de Descartes

Nessa última fase do projeto é importante que o (a) docente retome quais os passos que conduziram à reflexão até aquele ponto. Apontar os pontos chaves de interpretação do racinalismo, do mecanicismo e da filosofia cartesiana.

Uma vez que os alunos já estiverem compreendendo o procedimento metodológico operado por Descartes, o (a) professor (a) poderá diferenciar as concepções de objetivismo e subjetivismo. Esse processo é relativamente simples, pode-se, por exemplo, perguntar aos alunos: “a palavra ‘objetivo’ lembra alguma outra palavra?” Tão logo alguém irá aludir à palavra “objeto”, a explicação pode se desenvolver, pois numa análise objetiva parte-se da ideia de que os atributos pertencem ao objeto, as caracterísiticas do objeto não dependem da percepção do sujeito e esse era o modelo padrão filosófico e científico até o século dezessete.

Em contrapartida, a análise subjetiva centra o procedimento no sujeito, pois é o indivíduo que aloca as características no objeto. É Descartes quem inaugura a dicotomia como estatuto epistemológico e problematiza as condições de percepção da realidade. Várias outras provocações são possíveis, tais como: “Podemos provar que o mundo a nossa volta realmente existe?”, ou “Como posso ter certeza de que o que está acontentecendo nesse exato momento não é um sonho?” No entanto, dada a natureza do projeto, essas provocações servirão para instigar o aluno a aprofundar a pesquisa sobre Descartes.

No que se refere a contextualização, o (a) docente poderá jogar a questão do método da dúvida hiperbólica nos procedimentos contemporâneos, afinal, será que ainda há espaço para essa operação na verificação de veracidade dos conteúdos? Se analisarmos as coisas que compõem o imaginário do homem na atualidade, será que perceberemos alguma herança do procedimento cartesiano?

Também é possível levantar a questão do subjetivismo no que tange a elaboração de pensamentos sobre o mundo hodierno: será que resta algum espaço para o objetivismo? Não teria o subjetivismo alcançado as últimas consequências e estaríamos vivendo num aglomerado de universos particulares? Todas essas questões podem ser utilizadas como matrizes norteadoras nas produções dos alunos.

É interessante que o (a) professor (a) oriente a confecção de um texto que busque relacionar o período decisivo do século dezessete com o contexto no qual a produção de conhecimento se encontra nos dias de hoje.

Materiais Relacionados

1 – Recomenda-se que o (a) professor (a) detenha os conhecimentos básicos acerca da obra: DESCARTES, René. O Discurso do Método. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

2 – Sugere-se a leitura de uma obra introdutória: SILVA, Flanklin Leopoldo. Descartes e a Metafísica da Modernidade. São Paulo: Moderna, 1998.

3 – Há um filme importante chamado Ponto de Mutação, que traz discussões pertinentes ao tema. Assista a um trecho aqui.

 

Arquivos anexados

  1. Plano de aula – René Descartes

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