Conteúdos
– Discussão dos conceitos: raça e etnia
– Comparação entre diferentes políticas racistas do passado e seus resultados na questão racial contemporânea
Objetivos
– Conceituar raça, etnia e racismo
– Compreender a raça como categoria sociológica e não biológica
– Compreender e criticar a construção histórica e social das políticas racistas dos EUA e do Brasil, assim como os impactos dessas políticas na atualidade
– Analisar e avaliar os impasses ético-políticos decorrentes das transformações científicas e tecnológicas no mundo contemporâneo e seus desdobramentos nas atitudes e nos valores de indivíduos, grupos sociais, sociedades e culturas
– Reconhecer o racismo como uma questão atual e não parte de um passado histórico isolado, estimulando o debate sobre formas de combatê-lo
1ª Etapa: Conceituando “raça”, “etnia” e “racismo”
Nesse primeiro momento, o (a) professor (a) deve introduzir a temática entre os alunos, desafiando-os a conceituar os termos “raça”, “etnia” e “racismo”. Esse exercício é importante para levantar os conhecimentos prévios e compreender qual o ponto de partida para o início do trabalho.
Saber conceituar raça e racismo é o primeiro passo para que se entenda o racismo como fenômeno social que estrutura nossa sociedade. O breve resumo abaixo pode contribuir para que o (a) professor (a) se localize quanto a discussão, e use como base para direcionar a construção de conceitos:
Raça ou etnia?
É muito comum o emprego do termo “raça” para tratar da diversidade humana de acordo com seus tons de pele (brancos, negros, indígenas, asiáticos…), entretanto, no sentido biológico não existem raças humanas – somos todos da mesma espécie que surgiu há cerca de 350 mil anos na região leste da África, o homo sapiens. As variações de tom de pele e fisionomia correspondem às diferenças de fenótipo que pouco ou nada tem a ver com uma suposta divisão biológica e natural entre seres humanos. Assim sendo, porque ainda falamos em “raça”? Devíamos abandonar o termo?
A ideia de “raças humanas”, a despeito de não ter veracidade biológica, foi criada e usada para dividir os seres humanos de acordo com uma hierarquia que ainda hoje influencia o modo em que vivemos. Nessa hierarquia, criada pelo racismo científico corrente no final do século XIX até a primeira metade do século XX, a raça branca teria uma superioridade moral, cultural, política e econômica em relação às demais raças, sendo a raça negra a que estaria supostamente no mais baixo nível evolutivo possível, fator que justificava a escravidão e o domínio do continente africano por colonizadores europeus.
Sabemos hoje que a classificação das raças humanas é reflexo de um mundo eurocêntrico que buscava legitimidade para seus empreendimentos desumanos, e que nada tem a ver com a realidade biológica e científica, porém, a ideia criada para justificar a submissão de um povo em relação a outro estruturou a sociedade tal qual a conhecemos e influenciou políticas e ações discriminatórias que ajudam a compreender diversos fenômenos dessas sociedades na atualidade. Nesse sentido, as “raças” permanecem como categorias de análise pelo seu valor político e social, não pelo seu valor biológico. Portanto, é possível afirmar que, o racismo, é um sistema hierárquico artificial que legitima o direito e a superioridade de uma raça em relação à outra.
Um dos fatores que comprovam o caráter social e político presente nos termos “raça” e “racismo” é o fato de que o racismo opera de modos diferentes em cada parte do mundo, se relacionando com a história e as dinâmicas particulares da localidade. O racismo contra os negros brasileiros é muito diferente do racismo vivenciado pelos negros sul-africanos, assim como a hierarquia racial norte-americana é diferente das citadas anteriormente. As hierarquias raciais não são, portanto, um bloco essencialista, se alterando e se adaptando às realidades históricas e sociais de cada sociedade, fator que faz com que, o racismo, seja diferente em cada região.
Já “etnia” é uma palavra que se refere a um agrupamento de indivíduos que compartilham do mesmo sistema sociocultural, mesma língua e/ou região geográfica. Também não se trata de uma divisão puramente biológica entre os seres humanos, mas de uma divisão socialmente situada e compartilhada. Dizemos, por exemplo, que o continente africano é majoritariamente habitado por pessoas da raça negra ou que os negros africanos foram escravizados e trazidos para trabalhar nas Américas como se “africanos” fossem um grupo homogêneo de pessoas similares quando, na verdade, a estimativa é que existem hoje mais de 100 etnias na África, cada uma com sua cultura e línguas próprias.
Mesmo os africanos escravizados e trazidos para o Brasil para o trabalho forçado, no comércio atlântico, não eram totalmente semelhantes em cultura, costumes, língua e região, tendo sido trazidas pessoas de etnias diversas como os bantu, iorubás, fon, mandingas, fantis, ashantis, hauçás, igbos, fulas e outras. A Europa também funciona do mesmo modo: o que convencionamos chamar de “europeus” trata-se de um conjunto diverso de etnias culturais, geográfica e linguisticamente localizadas, como os bálticos, albaneses, escandinavos, galeses, sérvios, russos, armênios, romenos, bascos e assim por diante.
Se não existem raças humanas, deveríamos então trocar o termo “raça negra” por “etnia negra”? Algumas pessoas têm proposto essa suposta solução para o tema, entretanto, não existe uma unidade entre os povos negros, além da cor da pele, que justifique o uso do termo “etnia negra” – o negro norte-americano possui uma cultura, língua e costumes diferentes do negro brasileiro ou do negro nigeriano que, por sua vez, se divide entre diversas etnias, por exemplo – além de que uma troca de termos não resolveria a questão da hierarquia que organiza a sociedade independente de abandonarmos ou não o termo “raça”.
Raças humanas não existem, mas a divisão artificial da população em raças continua trazendo consequências que precisam ser entendidas e explicadas para assim serem combatidas. Consequentemente, manter o uso do termo “raça” torna-se válido quando analisamos a questão do racismo para além da biologia, o compreendendo como fator político e sociológico.
2ª Etapa: Racismo nos Estados Unidos e no Brasil
Após organizar com a turma os conceitos de raça e racismo, sugerimos a leitura coletiva do TEXTO 1 – disponível na área “Materiais relacionados”.
O texto trata-se de uma matéria jornalística que busca explicar como o preconceito e a discriminação racial se dão em dois países diferentes: Estados Unidos da América e Brasil.
Após a leitura, peça para que os alunos sistematizem as informações trazidas pelo texto em uma tabela conforme o exemplo:
Brasil |
EUA |
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Semelhanças |
– Países com passado escravista; – Nações com grande volume de negros escravizados; – Adoção de políticas racistas nos pós abolição; – Possuem racismo estrutural; – Permitem a autodeclaração racial; |
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Diferenças |
– Política pró-miscigenação; – Embranquecimento do país; – Imigração – importação de imigrantes da Europa e Ásia; – Nunca houve proibição formal de relações inter-raciais; – Preconceito se dá pelo fenótipo; – Acreditavam que em 100 anos não existiriam mais negros no país; – Preconceito de marca; – Mito da democracia racial; – Pessoas com a pele mais escura sofrem mais preconceito do que as pessoas de pele mais clara;
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– Política de segregação; – Proibição de casamentos inter-raciais; – Regra da gota única; – Preconceito se dá pela hereditariedade – genótipo; – Pessoas lidas como brancas não desfrutam do mesmo privilégio que os brancos; – Preconceito de origem; |
A sistematização tem como objetivo ajudar a levantar a discussão sobre pontos específicos do texto. Esse é o momento para questionar os alunos sobre o que entendem por “mito da democracia racial” e “miscigenação”, como percebem a presença ou ausência desses elementos em seus cotidianos. Estimule os alunos a contar experiências pessoais e familiares sobre o racismo brasileiro, citar casos, filmes e músicas norte-americanas que abordem a temática.
3ª Etapa: Pesquisa – A atualidade do racismo
Após o bate-papo, divida a sala em dois grupos – um grupo representará os EUA e outro grupo representará o Brasil. Para cada grupo será oferecida uma cartela de temáticas relativas a conceitos, casos e pessoas negras ligadas a cada um dos países. Os alunos deverão se organizar e dividir as temáticas entre si para realização de pesquisas sobre os temas propostos.
A pesquisa poderá ser feita em casa com o auxílio de jornais, artigos, sites e livros diversos, e deverá resultar em uma curta apresentação de 10 a 15 minutos.
Todas as apresentações devem tentar responder às questões:
– “O que é?” – “Quem é?” – Breve histórico da temática, conceito ou pessoa pesquisada.
– Como o tema se relaciona com a questão racial do país em questão?
Abaixo, algumas sugestões de temas para a pesquisa:
TEMAS PARA PESQUISA |
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EUA |
BRASIL |
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Todas as temáticas propostas no exemplo se relacionam com a questão racial de cada país e dizem respeito a legados recentes das diferentes políticas racistas aplicadas em cada um deles. O objetivo da atividade é mostrar como a questão racial se articula socialmente e se mantém presente em diferentes sociedades.
Durante as apresentações, separe a lousa em dois espaços. Um para o Brasil e outro para os EUA, e vá anotando conceitos e termos trazidos pelos alunos sobre casos de cada um dos países. No final, estimule os alunos a procurar diálogos entre os dois campos, por exemplo, ao contrapor o trabalho de Malcolm X e Abdias do Nascimento, os alunos perceberão que ambos foram homens que lutaram pela valorização da cultura e da autoestima negra, assim como será possível notar semelhanças entre casos de violência e morte de jovens negros nos dois países. Após o processo de percepção de semelhanças entre as violências racistas de cada um dos países, estimule os alunos a conversar, trocar impressões e opiniões sobre métodos e atitudes necessárias para mudar o panorama atual.
A ideia é fazer com que o aluno compreenda que a questão de raça ultrapassa o tempo; e se mantêm hierarquizando a sociedade mesmo que as políticas do passado tenham sido oficialmente abandonadas. Não se pretende com isso naturalizar o racismo, no entanto, fazer com que o aluno entenda que ele existe e causa danos reais a seres humanos ainda hoje. Não sendo uma invenção do passado que ficou para trás junto com a escravização, mas sim uma questão que precisa ser pensada por todos que desejam viver em uma sociedade mais justa.
Materiais Relacionados
1 – Texto 1: Warken, Júlia. Meghan Markle é negra? Site M de Mulher
2 – Munanga, Kabengele (2003) “Uma Abordagem Conceitual das Noções de Raça, Racismo, Identidade e Etnia”. [Artigo online]. 3º Seminário Nacional Relações Raciais e Educação – PENESB-RJ
3 – Arraes, Jarid. As nuances do Racismo no Brasil e nos EUA. Site da Revista Fórum
Livros sugeridos
Para EUA:
WEST, Cornel. Questão de Raça. São Paulo: Companhia das Letras, 1994.
Para Brasil:
SCHUCMAN, Lia Vainer. (2012). Entre o “encardido”, o “branco” e o “branquíssimo”: raça, hierarquia e poder na construção da branquitude paulistana (Tese de doutorado). Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo, São Paulo.
SKIDMORE, Thomas. Preto no Branco: Raça e Nacionalidade no Pensamento Brasileiro. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976.