O Ministério da Educação (MEC) lançou a Política Nacional de Formação de Professores em outubro de 2017. Seu destaque foi o projeto de Residência Pedagógica, apresentado como “parte da modernização do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (Pibid)”. O Pibid oferece bolsas aos alunos de cursos presenciais que estagiem em escolas públicas. O estudante é acompanhado por um docente da universidade e por um professor na escola onde atuará. Já no Residência Pedagógica, os alunos lecionariam a partir do terceiro ano do curso, ainda de forma não esclarecida pelo MEC. As mudanças desagradaram os pesquisadores que trabalham com formação de professores.
“Atuar sem formação é algo não permitido em nenhuma profissão. Nem o estagiário pode atuar sem estar acompanhando por um profissional. Nesse sentido, a mudança é um desserviço porque retoma a desprofissionalização da carreira”, critica Nilson Cardoso, presidente do Fórum Nacional dos Coordenadores do Pibid (Forpibi).
“A residência pedagógica discutida não era isso, a formação em serviço. Mas fazer o acompanhamento do aluno formado no mundo do trabalho, como acontece na área da saúde”, destaca a primeira secretaria da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped), Miriam Fábia Alves.
Mão de obra barata
Outra preocupação é o uso dos alunos como mão de obra barata em escolas onde o governo não investe na contratação de professores. Segundo Cardoso, o modelo defendido pela atual secretária-executiva do MEC, Maria Helena Castro, inspira-se na sua experiência no Programa Residência Educacional, do estado de São Paulo, de 2012. “Os alunos atuavam sem acompanhamento e em escolas com carência de professores. O modelo faliu em um ano”, relembra.
“Esse tipo de projeto é pensado para resolver falta de professor, não para a aprendizagem do aluno. Não podemos perder de vista que são jovens em formação”, opina a presidenta da Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (Anfope), Helena de Freitas.
Segundo Freitas, o que está no cerne da mudança é o entendimento, pelo MEC, que a formação do professor possui muita teoria e pouca prática. “Aumentar a hora-estágio sem abrir mão da teoria, que é importante, sempre foi pedido. Contudo, exige mais docentes para orientar alunos, o que tem custos. A maioria dos professores é formada pela iniciativa privada e via EAD, instituições que rechaçam a ideia de investimento”, denuncia.
Pesquisa de 2017 da docente Marli André com 1008 egressos de Pibid mostrou que 64% deles lecionavam na rede pública. Do montante de 36% que não atuavam, 72% estavam esperando concursos ou estudando para o mestrado. “O que vemos é que a política se cumpre. Em contrapartida, quando o MEC fala em ‘modernização’, ele não aponta dados que justifiquem o desmonte”, adverte Cardoso.
Já para Alves, a “modernização” seria ampliar o Pibid. “Ele não é para todos na universidade pública e coloca em desvantagem o que estagia sem bolsa”, lembra.
Falta de diálogo
Outra afirmação do MEC que causou desconforto foi que o Pibid possui “pouco diálogo com a rede”. O presidente do Forpib questiona. “A vantagem do Pibid foi justamente conseguir que setores que dialogavam pouco, como a universidade e a rede pública, pudessem pensar em conjunto a formação dos professores. Isso está provado em todos os relatórios, dissertações e teses produzidas ao longo dos anos”, pontua. “Além disso, a consulta à rede não é uma novidade: estava prevista na Política de Formação de Professores de 2008. O que víamos, contudo, era que nos Fóruns Estaduais Permanentes de Apoio à Formação Docente (Fepad), os secretários de educação não apareciam. Enviavam o representante do representante, sem poder de decisão. Não havia interesse”, destaca.
Por fim, há ainda a falta de diálogo do governo com as entidades educacionais. Além de não ter sido ouvido sobre a reformulação da política, o Forbid solicitou uma audiência com a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) sobre o assunto, ainda sem retorno.
“Tivemos audiências públicas na Câmara de Deputados e no Senado, no dia 7 de dezembro de 2017, e o MEC e a Capes não enviaram representantes”, lamenta. “Nossa luta não é pela sigla do programa ou pelas bolsas, mas porque reconhecemos o valor do Pibid para formar bons professores”, finaliza.
De acordo com a Capes, a cidade de São Paulo será o piloto do projeto de Residência Pedagógica. Uma comissão formada pela Secretaria Municipal de Educação da Prefeitura de São Paulo, o Instituto Ayrton Senna e a Universidade Estadual Paulista (Unesp) possuem 90 dias para enviar ao MEC o projeto que atenderá os futuros residentes.