Meninos são melhores em matérias ligadas às exatas, como física ou matemática. Já as meninas preferem as humanas, como língua portuguesa, artes ou história. Estas são ideias comuns, aceitas por muita gente – inclusive por pais e professores –, embora não sejam verdadeiras. Cada vez mais, especialistas em educação vêm desmistificando a noção de que meninos e meninas têm aptidões naturais diferentes, como se o gênero do aluno determinasse sua capacidade de escrever bem ou resolver equações com rapidez.

Diversas pesquisas apontam que os professores tratam meninos e meninas de forma diferente. Dão mais atenção aos meninos, fazem mais perguntas a eles e oferecem feedback mais construtivo. Além disso, costumam encorajar mais os meninos quando eles falham, ao passo que tendem a deixar as meninas desistirem com mais facilidade. Essas atitudes afetam profundamente a imagem que os alunos têm de si próprios, assim como sua autoestima.

Em um estudo recente, pesquisadores israelenses mediram os efeitos do preconceito de gênero na sala de aula para determinar como os estereótipos impactam o aprendizado de meninos e meninas. Os autores sugerem que a discriminação por parte dos professores tem um “efeito significativo no desempenho acadêmico dos alunos”, influenciando inclusive suas escolhas de carreira. Ou seja, o preconceito dos professores se reflete na disparidade de gênero nas faculdades e, portanto, no mercado de trabalho.

O problema é especialmente grave quando o assunto é matemática. O experimento analisou a correção de provas idênticas por dois grupos de professores: um conhecia o sexo dos alunos, o outro não. Embora as respostas fossem exatamente iguais, o grupo que sabia o gênero dos alunos deu notas maiores aos meninos; os que corrigiram provas anônimas, por sua vez, deram notas maiores às meninas.

A pesquisa conclui ainda que os professores das séries iniciais favorecem os meninos nas aulas dessa matéria, o que resulta em melhores desempenhos no futuro. Também os encorajam a se matricular em cursos avançados de ciência e matemática no Ensino Médio, fazendo o exato oposto com as meninas.

O resultado, como era de se esperar, reflete-se nas opções de carreira. De acordo com o relatório do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA) de 2014, “muitas meninas escolhem não seguir carreira em ciências, tecnologia, engenharia e matemática porque não têm confiança na sua capacidade para se destacar nessas áreas, embora tenham as habilidades para fazê-lo”.

E no Brasil?

A situação não é diferente no Brasil, onde os estereótipos de gênero também têm raízes profundas. Aqui, os meninos são incentivados a valorizar a competição e a independência. Por outro lado, os valores transmitidos às meninas costumam estar relacionados com a docilidade e a sensibilidade. Até mesmo os brinquedos fabricados para os pequenos reforçam essas posturas: no mercado, existem “os ‘brinquedos fortes’ destinados aos garotos, e os ‘brinquedos sensíveis’ exclusivos das meninas”, como explicam as professoras Fernanda Roveri e Carmem Lúcia Soares.

O cenário é o mesmo nas escolas. Os resultados do PISA de 2012 são significativos: na prova de matemática, os meninos tiraram, em média, uma nota 18 pontos maior do que as meninas. Já em habilidades de leitura, as meninas superam os meninos em 31 pontos. Estes números são similares aos dos demais países participantes, o que indica que o Brasil também precisa discutir a fundo a questão de gênero nas escolas.

De acordo com Maria Valéria Pena e Maria Correia, autoras do relatório A questão de gênero no Brasil, os “estereótipos relacionados a gênero transmitidos pela educação podem minar as escolhas de carreiras pelas meninas”. A afirmação coincide com a situação da educação superior e do mercado de trabalho no Brasil. Segundo a pesquisa Perfil da enfermagem no Brasil, uma profissão considerada “feminina”, 84,6% dos enfermeiros formados no país são mulheres. Enquanto isso, dados do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (IEA-USP) dão conta de que em 2013, por exemplo, cerca de 74% dos formandos de Engenharia eram do sexo masculino.

O número de mulheres na área de exatas vem aumentando bastante nos últimos anos, diz Wilson Reis, professor do Departamento de Engenharia da PUC do Rio de Janeiro, mas ainda é pequeno. “Tenho quatro turmas, todas da engenharia. As alunas são cerca de 25% do total”, diz. Para ele, essa disparidade é fruto de uma “predisposição cultural para colocar as mulheres fora das posições em exatas”. No entanto, “as poucas mulheres que investem na carreira acabam tendo um desempenho mais alto que a média”, revela.

Como posso estimular a igualdade de gênero na sala de aula?

✦ Distribua as tarefas da classe de forma igualitária, evitando os estereótipos. Arrumar ou decorar a sala, por exemplo, não são necessariamente trabalhos de meninas, assim como carregar as carteiras ou operar equipamentos eletrônicos não são tarefas “masculinas”.

✦ Faça as mesmas perguntas a meninos e meninas e sempre use o mesmo tom de voz com todos.

✦ Ao notar comportamentos que reforçam estereótipos, intervenha! Explique por que piadas e comentários sexistas são equivocados e como a pressão para que meninas e meninos se conformem a papéis tradicionais perpetua o preconceito.

✦ Não encoraje a competição entre os sexos. Destaque o sucesso tanto de homens quanto de mulheres. Ao falar sobre Albert Einstein, por exemplo, que tal comentar também o trabalho de Marie Curie, a primeira mulher a ganhar um prêmio Nobel? Ou sobre as mulheres matemáticas mais famosas da história?

✦ Estimule a leitura de livros escritos por mulheres, mantendo uma proporção justa entre autores dos dois gêneros.

0 Comentários
Inline Feedbacks
View all comments

Talvez Você Também Goste

Notícias

5 livros para conhecer mais sobre didática

Área da ciência pedagógica ajuda o professor a desenvolver estratégias de ensino eficazes

há 11 horas
Notícias

Veja 5 links para conhecer as histórias de rainhas africanas

Para especialista, conteúdos ajudam os alunos a resgatarem a herança cultural da África

há 1 dia
Notícias

Confira 9 links para promover uma educação socioambiental na escola

Materiais propõem debate sobre temas como desigualdade social e desenvolvimento sustentável

há 4 semanas
Notícias

Veja 7 livros com histórias em quadrinhos para ensinar sobre Primeira e Segunda Guerra

Obras trazem abordagens visuais e narrativas que atraem o interesse dos alunos sobre os conflitos

há 1 mês

Receba NossasNovidades

Receba NossasNovidades

Assine gratuitamente a nossa newsletter e receba todas as novidades sobre os projetos e ações do Instituto Claro.