Se, neste ano, a reserva de vagas para cotistas nas instituições federais de ensino já fosse de 50% (meta para 2016), a nota de corte desses estudantes teria na média uma queda inferior a 5%. Na concorrência ampla, onde disputam os alunos de escolas particulares, o desempenho mínimo para ingressar nas instituições teria um salto de 1%.
A conclusão é que o sistema de cotas, quando totalmente implementado, não deverá criar um desnível entre cotistas e não cotistas – ou seja, a nota de ingresso do cotista não será muito inferior ao do não cotista, e este não precisará de um desempenho muito maior do que hoje para conseguir uma vaga.
O cálculo foi realizado a partir da concorrência registrada no último Sistema de Seleção Unificada (Sisu) em cinco cursos: Medicina e Pedagogia na Federal do Ceará (UFC), Engenharia Civil no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP), Direito e Matemática na Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) (abaixo, a comparação em três cursos). As projeções foram realizadas pelo Ministério da Educação (MEC). O estudante usa a nota do Enem para concorrer pelo Sisu.
A distância da nota mínima entre cotistas e concorrência ampla varia de acordo com o curso. Em Medicina na UFC, por exemplo, a diferença entre a nota de corte das vagas de concorrência ampla e das vagas destinadas a pretos, pardos ou com renda de até 1,5 salário mínimo mais que dobraria caso o número de vagas reservadas fosse de 50% do total. Esse foi o curso mais procurado na última seleção. Em Direito na UFRJ, o quarto com a maior procura no sistema, a distância entre cotistas e concorrência normal teria uma variação de apenas 13 pontos.
A partir de 2012, no primeiro ano em que a Lei de Cotas passou a valer para o ingresso nas instituições federais de ensino, a exigência era de uma reserva mínima de 12,5% das vagas para alunos de escola pública -algumas universidades praticaram porcentuais maiores. A cota deve ser atendida por curso, respeitando também critérios de cor de pele e renda familiar.
No Sisu, os candidatos concorrem às vagas reservadas para cada grupo, o que gera, portanto, uma nota de corte para cada faixa (como é possível notar no infográfico). A distância de nota apresentada é considerada pelo MEC pequena, embora alguns especialistas divirjam.
Avaliação. Uma das críticas que a Lei de Cotas recebeu era de que a política resultaria no ingresso de estudantes muito despreparados, que poderiam até ter dificuldades para acompanhar o curso.
O ministro da Educação, Aloizio Mercadante, vê a projeção da nota de corte de cotistas com ânimo. "Estamos identificando que nos cursos de maior concorrência a distância de nota de corte não é grande. Porque o topo da escola pública é muito bom", diz ele, que faz ressalvas. "Mas não podemos nos enganar. Temos de avançar na qualidade do ensino médio, é o maior desafio na educação."
Segundo o professor da USP Reynaldo Fernandes, uma distância de 80 pontos – como ocorre em Medicina na UFC – é alta e pode representar uma distância entre os perfis dessa candidatos. Mas ele faz uma observação. "Não pode colocar essa distância só como consequência para cota. Já há uma distância entre o primeiro colocado e o último aprovado, que também vai aumentar", diz ele, responsável pela transformação do Enem em vestibular, em 2009, quando era presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), ligado ao MEC.
Para o professor de Estatística Tufi Machado Soares, da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), uma distância de 50 pontos não chega ter um impacto nos perfis de alunos, mas seria necessário um estudo mais aprofundado para concluir quantos pontos de fato diferenciaria alunos. "O ideal seria que as instituições fizessem estudos para apontar qual proficiência mínima um candidato deve ter para conseguir terminar determinado curso."