“O maior desafio é encher a rede [de computadores] com conteúdo educativo. Se não, a missão da universalização da educação de qualidade não vai ter fruto nesse mundo conectado”, avalia o coordenador-geral de Mídias e Conteúdos Digitais do Ministério da Educação (MEC), Érico da Silveira. Para ele, só agora o Brasil está começando a tratar o assunto de forma mais efetiva.
Apesar do cenário educacional no país ser, em grande parte dos casos, desfavorável a conectividade, com ensino e aprendizagem defasados, é preciso, segundo Silveira, falar de tecnologia em escola, levando “em conta a desigualdade dos cenários. O rádio na Amazônia é uma TIC [tecnologia da informação e comunicação] importante”, exemplifica ele. Acompanhe abaixo a entrevista exclusiva concedida ao NET Educação.
NET Educação – Como você avalia a posição do Brasil com relação a mídia e conteúdo digital ligado a educação?
Érico da Silveira – O país está começando a tratar isso de forma mais efetiva. O MEC visualiza muitas oportunidades de produção de conteúdo educativo, de circulação e também formação para o uso, o que é muito importante. Estamos dando alguns passos a partir dos conteúdos da TV Escola e em relação aos conteúdos digitais desenvolvidos por universidades federais que disponibilizamos via portais educativos do MEC: Portal do Professor e o Banco Internacional de Objetos. No setor privado, vemos várias iniciativas interessantes de fundações, empresas que trabalham com inovação como carro-chefe. Mas isso não tem ainda a escala e a distribuição que o Brasil merece. Ainda não chegamos nisso.
NET Educação – O que você ressaltaria já como ganhos nesse campo?
Silveira – Uma coisa que já acontece é que as ações, tanto públicas como privadas são bem articuladas entre si, com os princípios educacionais bem atendidos. Por exemplo, como dar foco em professores e também em alunos? Além disso, como desenvolver conteúdos com propostas diferentes: para o uso na escola e para o uso em casa? Essas abordagens estão dando frutos mais consistentes.
O que está ainda pouco educativo é a mídia convencional. A televisão, por exemplo. Temos alguns centros que fazem esse tipo de trabalho com qualidade como o Canal Futura, a TV Cultura, a TV Escola. Mas ainda são iniciativas que não aparecem quando se misturam no mar de conteúdos da grande mídia. Os conteúdos educativos precisam ser competitivos também nessa tela.
Versão legendada em português de um vídeo no qual CEO de diversas empresas falam das
exigências atuais postas à escola, na tarefa de formar cidadãos no Século XXI.
A necessidade de incorporar as tecnologias digitais é destacada.
NET Educação – Existe uma região do país ou estado que esteja mais à frente no aspecto de trazer tecnologias e inovação para aprendizagem?
Silveira – Rodando por aí você vê várias coisas. Não acho que tenha um estado inteiro e completamente na frente. Vivemos um contexto de diversas ações pontuais muito boas. Aqui no Recife, com o Porto Digital, temos diversos conteúdos que chegam à escola. A iniciativa que o Luciano Meira falou há pouco, das Olímpiadas de Jogos Educativos é bárbara. Mas tem um monte de ações isoladas que estão dentro da sala de aula que são maravilhosas, mas de alcance ainda restrito.
NET Educação – Poderia falar um pouco mais sobre os desafios nessa área da educação?
Silveira – O maior desafio é encher a rede com conteúdo educativo. Se há a necessidade de conectar todo mundo e trafegar todo tipo de conteúdo, precisamos também enchê-la de conteúdo educativo. Se não, a missão da universalização da educação de qualidade não vai ter fruto nesse mundo conectado. Quando falo rede não é só internet, é a TV e até o rádio. Todas as mídias precisam disponibilizar conteúdos educativos para todo mundo.
NET Educação – Como trazer tecnologia para as escolas em um país onde ainda temos um cenário desfavorável à conectividade e com uma aprendizagem, em muitos casos, defasada?
Silveira – É preciso levar em conta essa desigualdade dos cenários. Mas essa desigualdade não é só negativa, é também no sentido da diversidade. Assim, a diversidade tecnológica deve ser levada em conta. O rádio na Amazônia é uma TIC importante. O rádio ainda avança em termo de desenvolvimento tecnológico. Essa diversidade precisa contemplar as necessidades e realidades dos lugares.
Outra coisa sobre tecnologia em sala de aula é que a tecnologia em si não é tudo. A tecnologia é uma ferramenta a serviço da educação. É o conhecimento, o conteúdo, o currículo que se serve da tecnologia e não o oposto. Não pode virar uma corrida da tecnologia pela tecnologia em si.
NET Educação – Uma das principais questões que é levantada como entrave tanto para o conteúdo quanto para utilização das ferramentas tecnológicas na educação é o educador que ainda não consegue se inteirar. Como resolver isso?
Silveira – O Brasil ainda não pode ser classificado como país de nativos digitais. Está melhorando, mas não se nasce com um tablet na mão aqui. O professor tem que fazer essa apropriação como um cidadão que vai se incluir. Todos os profissionais estão passando por isso. O jornalista teve que um dia encarar sair da máquina de escrever para computador e internet.
Me preocupa um pouco a imposição metodológica de que esse material deva frequentar diretamente a sala de aula. Porque às vezes, há complementariedade entre o digital e o não digital, entre a conversa da sala de aula, do conteúdo, e outros momentos de aprendizado, que podem acontecer na escola ou não. Não acho que tem que ter esse vínculo direto: o professor tem que trazer para a sala de aula uma ferramenta e apertar “play”. Isso é uma das opções e não a única. Mas esta é uma questão que os especialistas de educação discutem bem.
NET Educação – O que diria para os professores e educadores?
Silveira – É necessário que ele se inclua, entenda e participe, o professor pode mediar a tecnologia como faz com qualquer outro tema, sem medo. O uso pode ser diverso: individual e coletivo, na escola e em casa ou na lan house. Por esse lado, o MEC acredita principalmente no trabalho direto com o professor. O público número um dos nossos conteúdos educativos é o professor, mesmo quando desenvolvemos conteúdos para os alunos. Assim, quando o aluno se utilizar deles em qualquer situação, o professor saberá se aproveitar daquilo de uma forma educativa, útil. É algo bem pragmático, fazer políticas de inclusão e capacitação.