Conteúdos
Meu Guri e Capitães da Areia: A marginalização das personagens.
Contexto Histórico e as Classes Sociais.
Intertextualidade: Análise e Interpretação.
Objetivos
Estabelecer relações comparativas entre Meu guri, de Chico Buarque e personagens de Capitães da Areia, de Jorge Amado, visando compreender a maneira pela qual os autores tratam da marginalização de personagens provenientes de determinadas classes sociais.
A partir da leitura do texto de Chico Buarque, observar a sensibilidade e o lirismo com que o compositor capta detalhes sutis da vida dos personagens de Meu guri.
Compreender as relações que podem ser estabelecidas entre a miséria e a falta de nomeação de personagens de Meu guri e de Capitães da areia.
1ª Etapa: Início de Conversa
A marginalização de personagens provenientes de determinadas classes é tema da canção Meu guri, de Chico Buarque. Por meio dela, o autor promove uma reflexão sobre o tema, tão constante em outras obras da literatura brasileira.
2ª Etapa: Aproximação do autor
Inicie a aula explicando que Chico Buarque é escritor, compositor e cantor e que, em 2010, recebeu o Prêmio Jabuti pelo romance Leite Derramado. Comente também que uma constante em suas canções é enfocar personagens marginalizados como ocorreu em Meu guri, de 1981. Essa temática sugere relações entre o texto em questão e personagens de Capitães da areia, de Jorge Amado.
3ª Etapa: Aproximação do texto
Inicie a aula escrevendo o título da canção: Meu guri. Em seguida, pergunte aos alunos quem, nos meios sociais, seria chamado de “guri”. Solicite a eles que registrem suas observações e, depois, peça para que leiam o que escreveram. Ouça alguns deles.
Agora, apresente o vídeo sugerido no item 2 de “Para organizar seu trabalho”, em que Chico Buarque interpreta a canção. Na sequência, peça aos alunos para escreverem o que entenderam da letra.
Agora compare as observações realizadas anteriormente com as que foram feitas depois de ouvida a canção. Nos textos escritos pelos alunos, o que permaneceu? O que mudou? Nesse momento, aproveite para conhecer melhor a turma no sentido de saber se é necessário trabalhar a visão sobre o que pensam em relação ao abandono de menores.
4ª Etapa: Leitura e análise do texto
Agora escreva (ou projete, se a escola dispõe de data-show) a primeira estrofe da canção:
Quando, seu moço, nasceu meu rebento
Não era o momento dele rebentar
Já foi nascendo com cara de fome
E eu não tinha nem nome pra lhe dar
Como fui levando não sei lhe explicar
Fui assim levando, ele a me levar
E na sua meninice, ele um dia me disse
Que chegava lá, olha aí, olha aí
Olha aí, ai o meu guri, olha aí
Olha aí, é o meu guri e ele chega
Em seguida, peça para os alunos escreverem o que entenderam dos versos em questão e solicite a alguns deles a leitura das observações realizadas. Depois de ouvi-los, complemente os comentários chamando a atenção para os seguintes pontos:
• O eu lírico da canção é uma mulher, recurso comum na obra musical de Chico Buarque. Diferentemente das conhecidas “canções de amigo”, do compositor, no entanto, a mulher, dessa vez, é uma mãe.
• A mãe é ingênua e desconhece a verdadeira identidade do filho, que vive na contravenção.
• A ingenuidade da mãe, entretanto, não a impede de ter consciência do momento inoportuno de ter gerado o filho: “quando, seu moço nasceu meu rebento/ não era o momento dele rebentar”.
• O interlocutor do texto é “seu moço” para quem a mãe conta sua história. Essa personagem “seu moço” não se manifesta em nenhum momento do texto.
• Sugere-se, no texto, uma inversão de posições na relação mãe-guri, que pode ser comprovada no verso: “fui assim levando e ele a me levar”. Essa relação pode indicar que a mãe também quer ser conduzida, levada e ninada pelo “guri”.
• No verso “Ele disse que chegava lá”, o menino promete um futuro para a mãe. A ingenuidade desta, no entanto, a faz crer que seria um futuro promissor.
Terminada essa parte, comece a analisar a segunda estrofe procedendo como na anterior, ou seja, ouvindo as observações dos alunos e complementando-as em seguida.
Chega suado e veloz do batente
Traz sempre um presente pra me encabular
Tanta corrente de ouro seu moço
Que haja pescoço pra enfiar
Me trouxe uma bolsa já com tudo dentro
Chave, caderneta, terço e patuá
Um lenço e uma penca de documentos
Pra finalmente eu me identificar
Olha aí, olha aí, olha aí
Ai o meu guri, olha aí, olha aí
É o meu guri e ele chega
Depois das observações realizadas pelos alunos, volte à estrofe e comece a discuti-la com o grupo, observando:
• A descrição de como o “guri” chega do “trabalho“, “suado e veloz do batente”. Em primeiro lugar, sendo uma criança, não deveria trabalhar. Seu “trabalho”, no entanto, é fruto da contravenção, como explicitado anteriormente. Os versos deixam entrever também que o menino “trabalha” bastante: rouba, furta, “tanta corrente de ouro/ que haja pescoço pra enfiar”.
• A mãe não tem identidade civil, e “guri” traz documentos para ela se “identificar”. Assim como o “guri”, quem não tem nome, “eu não tinha nem nome pra lhe dar”, a mãe também não. Esse fato nos permite estabelecer uma relação entre a miséria e a falta de nomeação das personagens.
• Os versos “Chega suado e veloz do batente /Traz sempre um presente pra me encabular” apresentam dois verbos conjugados no presente do indicativo. Tais verbos, no entanto, não dizem respeito a fatos que se realizam apenas no momento da fala da mãe, mas indicam ações habituais, que se repetem continuamente na vida do menino.
Depois de realizadas essas observações, escreva a terceira estrofe realizando o mesmo percurso sugerido nas duas estrofes anteriores.
Chega no morro com carregamento
Pulseira, cimento, relógio, pneu, gravador
Rezo até ele chegar cá no alto
Essa onda de assalto tá um horror
Eu consolo ele, ele me consola
Boto ele no colo pra ele me ninar
De repente acordo, olho pro lado
E o danado já foi trabalhar
Olha aí, olha aí, olha aí
Ai o meu guri, olha aí
Olha aí, é o meu guri e ele chega
Depois de ouvir os alunos, volte ao texto e comece a discuti-lo observando os seguintes aspectos:
• Nessa, como nas outras estrofes, o “guri” chega com objetos que a mãe não reconhece como produto do crime (carregamento, pulseira, cimento relógio, pneu, gravador). Reforça-se, então, o caráter ingênuo da personagem.
• Na sua ingenuidade, a mãe reza para o filho se livrar de assaltos, pois “cá no alto”, isto é, no morro, “essa onda de assaltos tá um horror”. Ou seja, o “guri” assalta “no asfalto”, mas também pode ser assaltado no morro, como é comum ocorrer nesses casos.
Por último, analise, junto com os alunos, a quarta estrofe:
Chega estampado, manchete, retrato
Com venda nos olhos, legenda e as iniciais
Eu não entendo essa gente, seu moço
Fazendo alvoroço demais
O guri no mato, acho que tá rindo
Acho que tá lindo de papo pro ar
Desde o começo eu não disse seu moço
Ele disse que chegava lá
Olha aí, olha aí,
Olha aí, ai o meu guri, olha aí
Olha aí, é o meu guri
Nela, observe:
• A notícia da morte do filho chega estampada nos jornais “manchete, retrato, com venda nos olhos, legenda e as iniciais”, mas a mãe não consegue enxergar: “Eu não entendo essa gente, seu moço/Fazendo alvoroço demais”.
• A conclusão em que a mãe acredita é aquela outra prometida pelo menino: “Desde o começo eu não disse, seu moço, ele disse que chegava lá”. É necessário entender, ainda, que esses versos podem funcionar como uma ironia de Chico Buarque. O “lá”, a que se refere o verso, “ele disse que chegava lá”, pode estar, na visão do compositor, se referindo à morte do menino, que não poderia ter outro fim senão esse. E isso em função das condições sociais, que determinaram seu destino.
Realizadas essas análises, solicite aos alunos que levantem algumas hipóteses:
• Por que a mãe não consegue enxergar a verdadeira identidade do filho?
• Que elementos há na construção da personagem responsáveis por essa “falta de visão”?
5ª Etapa: Atividades: Relação de Meu Guri com Capitães da Areia, de Jorge Amado
Reserve 2 aulas para os alunos levantarem dados sobre Capitães da areia. Para tanto, indique os links sugeridos nos itens 5, 6 e 7 de “Para organizar seu trabalho”.
Após a pesquisa, leia, juntamente com os alunos, o Prólogo “Cartas à redação” de Capitães da areia. Sugestões de encaminhamento:
• Comece lendo a reportagem publicada pelo Jornal da Tarde, que trata do assalto de crianças à casa de um comerciante rico.
• Na sequência, leia a primeira carta (do secretário do chefe de polícia ao referido jornal). Solicite comentários aos alunos sobre o conteúdo da carta, pedindo para eles tirarem conclusões sobre a posição do secretário em atribuir a responsabilidade de coibir os furtos ao juiz de menores. Solicite aos alunos o registro das observações feitas.
• Continue a leitura das outras cartas e da reportagem do mesmo jornal. Em seguida, peça que os alunos comentem o conteúdo de cada texto.
• Arremate essa primeira parte pedindo uma conclusão dos alunos a respeito do conteúdo dos textos lidos nessa parte.
6ª Etapa: Fechamento
Depois de observar a caracterização das personagens principais na obra de Jorge Amado e a opção dele e de Chico Buarque por centrar o foco em personagens marginalizadas, solicite aos alunos a produção de charges reflexivas e críticas, como as elaboradas pelo cartunista Angeli, em que apareçam crianças brasileiras diante do abandono do poder público.
Reserve 2 aulas para a produção das charges e 1 para a apresentação delas para o grupo. Em seguida, peça para os alunos afixá-las no mural da escola.
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