Conteúdos

– Gênero literário – spoken word
– Preconceito linguístico e uso variado da língua
– Identitarismo: periferia, negritude, feminismo e LGBTQ+
– História e cultura da arte urbana

Objetivos

– Compreender o slam poesia como um gênero literário
– Discutir as questões de preconceito linguístico e social
– Conhecer o uso variado da língua em diversas situações
– Debater a apropriação do espaço urbano por jovens e setores marginalizados da sociedade
– Apreciar variadas modalidades de poesia

Série/ano:

8º e 9º anos do ensino fundamental II (segundo ciclo) e ensino médio

Apesar da sugestão de série/ano indicada, ao(à) professor(a) reserva-se a análise de apresentar ou reforçar determinado tema quando achar necessário. O conteúdo pode ser abordado em conjunto com a literatura contemporânea, história e literatura negra e afrodescendente, cultura popular, arte urbana e história do Brasil contemporâneo.

Previsão para aplicação:

4 aulas (50 minutos/aula)

1ª Etapa: Slam - um gênero literário

Slam é uma batalha de poesias e rimas que existe desde os anos 1980 e tem crescido cada vez mais no mundo e no Brasil, sobretudo no século XXI. Considerado por muitos um esporte, o slam tem batalhas nacionais e uma Copa do Mundo, onde finalistas de diversos países se encontram para escolherem qual a melhor poesia. Na última década, o Brasil tem apresentado suas manifestações, sobretudo entre os jovens periféricos, e traz consigo um forte teor auto afirmativo, identitário e de ocupação de espaços públicos.

Spoken word: a poesia falada

Slam poesia ou poetry slam é um tipo de poesia que faz parte do gênero spoken word ou, na tradução literal, palavra falada. Faz parte desse gênero toda a literatura que é pensada para ser declamada ou falada em público. É um gênero que vem desde a Antiguidade e Idade Média, como por exemplo os trovadores, mas que também aparece na cultura africana, os Griôs.

No caso dos trovadores, a poesia declamada tinha a função de contar casos ficcionais épicos e era feita em um momento em que não havia imprensa ou a disseminação da alfabetização na Europa dos séculos XI e XII. Na cultura africana, os Griôs ou Griots, são os mantenedores da história e da memória de determinado grupo social ou étnico. São os portadores do conhecimento antigo e são responsáveis por passá-los para as novas gerações de forma oral, preservando a história, a memória e a ancestralidade.

Nos anos 60, a poesia falada foi ressignificada pela geração beat, no Estados Unidos, fazendo parte das manifestações do movimento de contracultura e de reivindicação de direitos civis. Na década de 70, o rap, do inglês ritmo e poesia, nasceu entre a comunidade negra norte-americana, sobretudo em contato com a cultura jamaicana imigrante em Nova York. Para os poetas do rap, a letra se sobrepunha à melodia e a temática era o cotidiano de opressão nas grandes cidades, violência policial e afirmação de uma identidade étnica.

Slam: poesia falada marginal

O slam surge em 1984, em Chicago, estado de Illinois, Estados Unidos. Até pouco tempo, Chicago tinha a particularidade de ser uma cidade muito industrializada. Em um bar de jazz, onde costumavam ocorrer declamações e saraus de poesia, o trabalhador da construção civil e também poeta Mark Smith teve a ideia de fazer uma “batalha de poesias”. Junto com seu grupo Chicago Poetry Ensemblange, ele cria o Show-Cabaré-Político-Vaudevilliano.

A ideia inicial de Smith era fazer uma brincadeira para ironizar a declamação academicista, elitista e formal. A batalha tinha a intenção de popularizar a poesia e realizar performances-poéticas que fossem mais concretas e menos abstratas, diferente daquelas dos saraus que atraíam mais os jovens de classe média. Dessa maneira, o slam acabou unindo a forma poética e as reuniões ocorridas para a realização dos saraus e, ao mesmo tempo, um público e uma plateia participativa, que torcia e se envolvia na poesia e na letra, e não apenas contemplava o poeta e sua obra.

O gênero se desenvolveu tão rápido nos Estados Unidos que apenas seis anos depois, em 1990, ocorreu o Primeiro Campeonato Nacional de Slam, em São Francisco. Em 2002, sua popularidade o levou ao Primeiro Campeonato Internacional, ocorrido em Roma. Após isso, são realizados campeonatos anuais na França nos quais os poetas apresentam poesias em suas línguas nativas, enquanto as traduções são feitas simultaneamente em um telão. A tecnologia é uma das aliadas desse gênero que viu sua popularização ocorrendo por meio de redes sociais e permitiu encurtar distâncias entre as comunidades. Atualmente, França e Alemanha têm as maiores comunidades slammers do mundo, ficando atrás apenas dos Estados Unidos, sua terra natal.

Características do slam

As batalhas de slam ocorrem em praça pública ou em bares. Existem apenas três regras: as poesias devem ser autorais e não terem sido apresentadas em nenhuma outra batalha, devem durar no máximo três minutos e a performance deve contar apenas com a voz e/ou o corpo do poeta para se manifestar, sem usar adereços cênicos ou batidas musicais. O público escolhe o júri na hora, entre os que estão assistindo, que dão as notas imediatamente depois da apresentação sem debater, além de uma pessoa para calcular o tempo da poesia e a média obtida por cada poeta. A ordem das apresentações é sorteada entre as pessoas inscritas e a maior e a menor nota são descartadas para realizar a média e a pontuação final. Normalmente, o vencedor ganha um livro.

O limite de tempo visa democratizar a participação no evento. Ninguém interrompe um slammer quando esse ultrapassa o tempo, mas ele perde pontos na somatória final. Por se tratar de um trabalho em grupo ligado à comunidade, o slam não tem por objetivo inicial lançar poetas focados em uma única pessoa, apesar de acontecer também. No momento da batalha, no entanto, o limite de tempo evita a monopolização do espaço por parte de algumas pessoas. A proibição de adereços cênicos e de música visa fazer com que o poeta cative a plateia usando apenas a palavra, sua performance e seu corpo.

Apesar de ser uma competição, antes de tudo, as batalhas são uma celebração. As comunidades ou times se reúnem e o público é parte integrante da apresentação, intervindo a todo momento com vaias, aplausos, gritos ou participação no processo. Por serem orgânicos aos grupos e locais que surgem, os slams apresentam características de temática e do grupo social que o compõem. Nesse sentido, tanto a apresentação do poeta, quanto a plateia, contam com um elemento de auto representação. Os slammers contam sua própria história, usando suas palavras, aproximando a arte e a vida, criando uma estética própria e autêntica.

A palavra slam é uma onomatopeia em inglês usada para designar uma batida, como uma porta se fechando subitamente. A palavra mais aproximada na língua portuguesa para a expressão é “Blam!”, muito embora, por ser um demarcador de som, não haja necessidade alguma de tradução. Como o próprio nome, a poesia é marcada por fortes traços de oralidade e coloquialidade, tendo uma demarcação linguística informal. Por sua temática e forma, a poesia do slam pode ser considerada como marginal e essa pecha é autoproclamada por alguns grupos, como o Slam das Minas de São Paulo, que intitulou seu documentário com o lema usado pelos poetas marginais brasileiros dos anos 80: “Seja Heroína, Seja Marginal”.

Slam no Brasil: identitarismo e apropriação de espaços públicos

O slam chegou ao Brasil através da atriz e poeta Roberta Estrela D´Alva, em 2009. Estrela D´Alva faz parte do Núcleo Bartolomeu de Depoimentos que juntos montaram o Slam ZAP! – Zona Autônoma da Palavra. Ele ocorre há dez anos em um bar no bairro da Pompéia, Zona Oeste de São Paulo. O segundo slam a ser formado no país foi o Slam da Guilhermina, em 2012, Zona Leste da cidade de São Paulo. Esse tem a característica de ocorrer em espaço ao ar livre, ao lado da estação de metrô, em uma praça pública aberta à toda comunidade da região e com fácil acesso ao restante da cidade.

A FLUP – Festa Literária das Periferias – ocorrida pela primeira vez em 2012, percorre favelas e comunidades do Rio de Janeiro em edições anuais e coloca como protagonistas de suas obras e publicações o escritor de origem periférica, valorizando temática, traços de linguagem e expressão, além de conseguir patrocínio ou financiamento para a publicação de obras. No Brasil, o slam se insere nesse processo de conquista crescente de espaço por grupos excluídos, oprimidos ou marginalizados e tem como principais protagonistas os jovens das periferias.

A partir de 2013, os slans se popularizaram no país, sendo formados em comunidades no interior de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul, Pernambuco e Bahia. A responsabilidade dessa divulgação e disseminação da ideia das batalhas de poesia é do Slam Resistência, que ocorre na Praça Roosevelt, no centro de São Paulo e faz uso das redes sociais para divulgar as batalhas, os poetas e as poesias.

O ano de 2013 foi marcado por movimentos de juventude em todo o país. Inicialmente contra o aumento do preço do transporte público, as manifestações atingiram outras demandas sociais, sobretudo da juventude e da periferia. Questões como saúde, educação, repressão, moradia e a realização da Copa do Mundo de Futebol, sediada no Brasil em 2014, foram pautas. Em contrapartida, houve repressão policial e do governo. O Slam da Resistência nasceu nesse contexto, uma vez que a praça era local de reunião de ativistas e advogados do movimento e se disseminou por ter poetas tratando exatamente dessas questões e dialogando com um sentimento geral da juventude naquele momento. O slam brasileiro se caracterizou a partir daí, por ser realizado em locais abertos, permitindo a entrada democrática de todas as pessoas e impondo aos pedestres que por ali passam a presença de grupos de jovens poetas e seu público. Não há qualquer rigidez ou imposição de temática aos slammers, mas existe uma tendência a tratar de temas como racismo e empoderamento de mulheres e jovens negros, repressão policial e violência do Estado, exclusão de direitos, sexualidade e temática LGBTQ+, feminismo, machismo e autoafirmação feminina.

Outros Slans, com temática específica, foram criados ou surgiram de comunidades. Em diversas cidades do país existem slans voltados exclusivamente para mulheres, onde homens são bem-vindos na plateia, mas não podem nem batalhar, nem ser jurados. Existem slans formados para tratar da temática negra e também grupos cujos poetas e jurados são da comunidade LGBTQ+. Outro slam temático é o “Slam do Corpo”, feito em Libras, por poetas surdos e traduzido simultaneamente em língua portuguesa.

Portanto, o slam é uma forma artística, cultural e social na qual os protagonistas, desde poetas e jurados, são os setores que foram silenciados constantemente pela sociedade. Através da arte, da poesia e da ocupação de espaços por pessoas de diferentes idades, crenças, orientações políticas e filosóficas, ocorre uma celebração coletiva, que é ao mesmo tempo uma batalha. É um momento de pausa e contemplação, mas também de afirmação e resistência. A poesia slam é autêntica, informal, coloquial e bem trabalhada, tanto do ponto de vista métrico e de temática, quanto em relação à performance executada que busca trazer o público para a apresentação.

Texto resumido baseado em:

D´ALVA, Roberta Estrela. Um microfone na mão e uma ideia na cabeça – o poetry slam entra em cena. Revista Synergies Brésil. Nº 09, 2011. pp. 119-126.

SOUSA, Marielly Zambianco Soares. Das artes às tarefas de Clio: uma reflexão sobre o movimento Slam. In: Anais do XIV Encontro de História da Anpuh – MS. Mato Grosso do Sul, 2018.

2ª Etapa: Vídeos de poesia

O slam é um gênero literário e por isso pode ser trabalhado pelo(a) professor(a) como qualquer outro gênero. Nesse sentido, a primeira proposta é assistir e debater vídeos com as poesias apresentadas abaixo. É interessante que o(a) professor(a) faça uma breve pesquisa sobre os slans de sua região. Por se tratar de linguagem oral e coloquial, existem temáticas sexuais e palavrões. Cabe ao(à) professor(a) avaliar a faixa etária dos alunos para selecionar o que apresentar.

Boca (Maloca) e Roberta Estrela D´Alva (ZAP)

Felipe Marinho – Coisa tá preta (Slam da Guilhermina)

Luiza Romão – A Colonização foi um estupro (Slam da Guilhermina)

Patrícia Meira (Slam da Guilhermina)

Maurinete Lima (Slam ZAP!)

Lucas Penteado Kóka (Slam Resistência)

Béka – O último salva todos (Slam da Guilhermina)

Lucas Afonso (Slam Resistência)

Emerson Alcade – Homens (Slam da Guilhermina)

Aflordescentende – Caro Ex Namorado (Slam da Guilhermina)

Tawane Theodoro (Slam da Resistência)

Tawane Theodoro – Receba a Delicadeza (Slam da Guilhermina)

Paulina Turra – Agora eu tenho 19 anos (Slam da Resistência)

Jade Fanny (Slam Resistência)

Mariana Félix – Receita (Slam da Resistência)

Mariana Félix – Baseado em Escrotos Reais (Slam das Minas)

Mariana Félix e Lucas Afonso (Batalha dos Slans)

Bia Ferreira (Slam das Minas)

João Vitor (Slam Belo Horizonte)

Jade Quebra-Poesia – E o Funk? (Slam do Fluxo)

Bruno Negrão – Bisnetos (Final Gaúcha de Slam)

RobSoul Za (Slam da Resistência)

Warley Noua – Um tiro pesado e com elegância (Slam Resistência)

Warley Noua (Slam Resistência)

Jonatas Katrina (Slam Resistência)

Ingrid Martins (Slam das Minas)

Rejane Barcelos (Slam das Minas)

Mel Duarte – Verdade seja Dita (Slam das Minas)

Luz Ribeiro – Minimilimetros (Slam das Minas)

Isaac Quaresma (Slam Interescolar)

Achilles de Oliveira Ribeiro (Slam Interescolar)

Catharine Moreaira e Cauê Gouveia – Deficiência (Slam do Corpo)

Catharine Moreaira e Cauê Gouveia – Pequeno Manual da Cultura Surda (Slam do Corpo)

Edinho – Mudinho (Slam do Corpo)

3ª Etapa: Atividades práticas

O trabalho com slam não precisa resultar necessariamente em uma atividade prática ou criativa. Pois a apreciação pode ser em si uma atividade prática. No entanto, é possível organizar projetos como os sugeridos abaixo. Eles partem da premissa do protagonismo dos jovens em seu processo criativo.

1) Festival de Artes e Poesia

Em conjunto com outros (as) professores (as) é possível organizar um festival de artes e poesias. A ideia não é organizar uma batalha de poesia, mas criar categorias que possam contemplar os alunos e seus diversos aspectos de criatividade, disposição e habilidades. Pode haver uma premiação ou pontuação, para que exista engajamento e uma simulação de batalha. Para tanto, algumas questões devem ser observadas:

a) Os alunos devem organizar tudo, assessorados pelos (as) professores (as): jurados, categorias a serem apresentadas, organização física do espaço, etc.;
b) Algumas sugestões de atividades: cantar músicas autorais, dançar coreografias próprias, batalha de poesias próprias, declamação de poesias de outros autores, artes plásticas e visuais próprias, etc.;
c) Os (As) professores (as) não podem interferir nos temas propostos pelos alunos. O ideal é que seja o mais orgânico possível, tratando das temáticas e realidades que os alunos vivem.

Dicas:

– Documentário “Slam – Voz de Levante” de 2017.

Documentário “Slam das Minas – Seja heroína, seja marginal”.

Texto “Slam. Spoken Word, Poesia Marginal” do blog “Las Pretas – Cultura Pop Preta”, escrito por Katy Illy.

– Blog “Sociedade dos Poetas Subversivos” – Letras de poemas apresentados no Slam Resistência.

– O depoimento sobre a participação na Copa do Mundo de Slam, “Declama-te ou te devoro: o poetry slam e a celebração urbana da poesia falada”, escrito pela poeta slammer Roberta Estrela D´alva no site “Omenelik 2º ato”.

Entrevista com a poeta Slammer Mariana Félix, para o site “Agência Jovem”.

Vídeo ZAP! Zona Autônoma da Palavra – Um Slam Brasileiro. Integral no Youtube.

Canal de vídeos “Slam do Corpo” – Slam em Libras, no Vimeo.

– Canal no YouTube do “Slam da Guilhermina”.

– Canal no YouTube “Slam das Minas”.

Materiais Relacionados

1) No blog do “Instituto Singularidades”, há um pequeno texto sobre como o slam pode ser trabalhado em sala de aula.

2) O texto de Bruna Ribeiro, no site “Gelédes”, chamado “Slam é a nova forma da juventude da periferia se expressar – e é incrível!”.

3) O texto de Júlia Garcia, no site “Conhecimento e Literatura”, chamado “Conheça a poesia Slam”.

Para aprofundamento:

1) Artigo escrito por Roberta Estrela D´Alva, poeta e pesquisadora Slammer: D´ALVA, Roberta Estrela. Um microfone na mão e uma ideia na cabeça – o poetry slam entra em cena. Revista Synergies Brésil. Nº 09, 2011. pp. 119-126.

2) Artigo escrito por Marielly Zambianco Soares Sousa: SOUSA, Marielly Zambianco Soares. Das artes às tarefas de Clio: uma reflexão sobre o movimento Slam. In: Anais do XIV Encontro de História da Anpuh – MS. Mato Grosso do Sul, 2018.

3) Artigo escrito por Marielly Zambianco Soares Sousa a respeito de suas experiências com oficinas de poesia slam em uma escola. SOUSA, Marielly Zambianco Soares. Uma experiência de oficina pedagógica Slam em prol da educação étnico-racial. In: Anais da III Jornada Brasileira de Educação e Linguagem. Mato Grosso do Sul, 2018.

Crédito da imagem: reprodução Facebook Corposinalizante

Arquivos anexados

  1. Plano de aula – Slam

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