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“O Operário em construção”, de Vinicius de Moraes;

Objetivos

Compreender o problema da diferença social denunciada nas obras;
Identificar as semelhanças entre o poema “O Operário em construção” de Vinicius de Moraes e  “Operário no Mar”, de Carlos Drummond de Andrade”.
Reconhecer o conceito de literatura engajada presente em ambos os autores.

 

1ª Etapa: Aproximação com o tema: denúncia social - a literatura engajada da 2ª fase modernista

Inicie a aula explicando aos alunos que literatura engajada, segundo Benoit Denis é:

 

[…] um fenômeno historicamente situado, que o associam geralmente a figura de Jean-Paul Sartre e à emergência, no imediato pós-guerra, de uma literatura passionalmente ocupada com questões politicas e sociais, e desejosa de participar da edificação de um novo mundo anunciado desde 1917, pela Revolução Russa. (2002, p. 17).

 

            Sendo assim, mostre aos alunos que o engajamento literário ocorre como forma de trazer as relações desiguais e a exploração do ser humano para dentro da obra de arte, dessa forma, o operário e o explorado passam a ser o foco do artista, dessa forma Vinicius de Moraes apresenta-nos a construção que ocorre com esse operário durante o trabalho.

            Já em Drummond, este se coloca como algum solidário ao operário, o qual não reconhece a si, nem o que ocorre no mundo porque não lhe sobra tempo para olhar e ver.  

            Leia com os alunos o trecho a seguir da obra Contribuição à Crítica da Economia Política de Marx:

Na produção social da própria existência os homens entram em relações determinadas, necessárias, independentes de sua vontade; estas relações de produção correspondem a um grau determinado de desenvolvimento de suas forças produtivas materiais. […] O modo de produção da vida material condiciona o processo de vida social, política e intelectual. Não é a consciência dos homens que determina a realidade; ao contrário, é a realidade social que determina a sua consciência.

PREFÁCIO À CONTRIBUIÇÃO À CRÍTICA DA ECONOMIA POLÍTICA. KARL MARX

 

 

                  

Com base nos trechos acima grifados, leia com os alunos o excerto de “O Operário em Construção”:

Era ele que erguia casas

Onde antes só havia chão.

Como um pássaro sem asas

Ele subia com as casas

Que lhe brotavam da mão.

Mas tudo desconhecia

De sua grande missão:

Não sabia, por exemplo

Que a casa de um homem é um templo

Um templo sem religião

Como tampouco sabia

Que a casa que ele fazia

Sendo a sua liberdade

Era a sua escravidão.

 

De fato, como podia

Um operário em construção

Compreender por que um tijolo

Valia mais que um pão?

 

Chame a atenção dos alunos para a exemplificação da teoria marxista presente no trecho do poema de Vinicius, em que vemos o operário desconhecer  sua condição de explorado, sendo que esta condiciona seu pensamento.

Peça para que os alunos leiam o trecho a seguir e relacionem a parte em destaque à citação da teoria marxista.

“Mas ele desconhecia

Esse fato extraordinário:

Que o operário faz a coisa

E a coisa faz o operário. (…)”

  

2ª Etapa: Reconhecimento de sua condição

Retome com os alunos a questão sobre o fato de a realidade social determinar a condição social, fazendo a leitura dirigida do excerto a seguir:



“De forma que, certo dia

À mesa, ao cortar o pão

O operário foi tomado

De uma súbita emoção

Ao constatar assombrado

Que tudo naquela mesa

– Garrafa, prato, facão –

Era ele quem os fazia

Ele, um humilde operário,

Um operário em construção.

Olhou em torno:gamela

Banco, enxerga, caldeirão

Vidro, parede, janela

Casa, cidade, nação!

Tudo, tudo o que existia

Era ele quem fazia

Ele, um humilde operário

Um operário que sabia

Exercer a profissão.

Ah, homens de pensamento

Não sabereis nunca o quanto

Aquele humilde operário

Soube naquele momento!”

    



           

Aponte para os alunos que neste momento a realidade auxilia o operário no reconhecimento de seu valor, de seu lugar, uma vez que foi ele quem produziu tudo o que estava a sua volta.

 

Mostre aos alunos que a partir desse momento o operário que constrói, passará a ser o operário em construção de si mesmo. Além disso, aponte para a relação dessa construção com a dimensão da poesia, vista como libertação, como forma de construir o mundo através da palavra. Leia com os alunos o excerto a seguir:

 



“Naquela casa vazia

Que ele mesmo levantara

Um mundo novo nascia

De que sequer suspeitava.

O operário emocionado

Olhou sua própria mão

Sua rude mão de operário

De operário em construção

E olhando bem para ele

Teve um segundo a impressão

De que não havia no mundo

Coisa que fosse mais bela.

 

 

Foi dentro da compreensão

Desse instante solitário

Que, tal sua construção

Cresceu também o operário.

Cresceu em alto e profundo

Em largo e no coração

E como tudo que cresce

Ela não cresceu em vão

Pos além do que sabia

– exercer a profissão –

O operário adquiriu

Uma nova dimensão:

A dimensão da poesia.”

 

 

Peça ao alunos que:

·          Façam a leitura integral do poema e levantem outras referências sobre a consciência de si mesmo adquirida pelo operário e quais consequências isso trouxe para ele. 

3ª Etapa: Olhar distanciado no poema “Operário no mar” de Carlos Drummond de Andrade

 Mostre aos alunos que, diferentemente de Vinicius de Moraes, no poema a seguir há uma tentativa do eu lírico compreender, ou melhor, solidarizar-se com esse opérario, que desconhece o que ocorre no mundo, porque “não lhe sobra tempo” para conhecer sobre isso, aliena-se em sua condição de proletário:

 

O OPERÁRIO NO MAR

Na rua passa um operário. Como vai firme! Não tem blusa. No conto, no drama, no discurso político, a dor do operário está na blusa azul, de pano grosso, nas mãos grossas, nos pés enormes, nos desconfortos enormes. Esse é um homem comum, apenas mais escuro que os outros, e com uma significação estranha no corpo, que carrega desígnios e segredos. Para onde vai ele, pisando assim tão firme? Não sei. A fábrica ficou lá atrás. Adiante é só o campo, com algumas árvores, o grande anúncio de gasolina americana e os fios, os fios, os fios. O operário não lhe sobra tempo de perceber que eles levam e trazem mensagens, que contam da Rússia, do Araguaia, dos Estados Unidos. Não ouve, na Câmara dos Deputados, o líder oposicionista vociferando. Caminha no campo e apenas repara que ali corre água, que mais adiante faz calor. Para onde vai o operário? Teria vergonha de chamá-lo meu irmão. Ele sabe que não é, nunca foi meu irmão, que não nos entenderemos nunca. E me despreza… Ou talvez seja eu próprio que me despreze a seus olhos. Tenho vergonha e vontade de encará-lo: uma fascinação quase me obriga a pular a janela, a cair em frente dele, sustar-lhe a marcha, pelo menos implorar lhe que suste a marcha. Agora está caminhando no mar. Eu pensava que isso fosse privilégio de alguns santos e de navios. Mas não há nenhuma santidade no operário, e não vejo rodas nem hélices no seu corpo, aparentemente banal. Sinto que o mar se acovardou e deixou-o passar. Onde estão nossos exércitos que não impediram o milagre? Mas agora vejo que o operário está cansado e que se molhou, não muito, mas se molhou, e peixes escorrem de suas mãos. Vejo-o que se volta e me dirige um sorriso úmido. A palidez e confusão do seu rosto são a própria tarde que se decompõe. Daqui a um minuto será noite e estaremos irremediavelmente separados pelas circunstâncias atmosféricas, eu em terra firme, ele no meio do mar. Único e precário agente de ligação entre nós, seu sorriso cada vez mais frio atravessa as grandes massas líquidas, choca-se contra as formações salinas, as fortalezas da costa, as medusas, atravessa tudo e vem beijar-me o rosto, trazer-me uma esperança de compreensão. Sim, quem sabe se um dia o compreenderei?

(DRUMMOND, C. de A. Sentimento do mundo. Ed. Cia. das Letras)

 

Aponte para os alunos que é possível notar que eu lírico solidariza-se com o operário, porém, existe uma distância entre eles que reforça a diferença social existente. Chame a atenção para o trecho “tenho vergonha e vontade de encará-lo”, mostrando que essa vergonha pode corresponder ao que ele é, ou seja, a sua condição de proletário com acesso à cultura, que conhece e sabe notícias do mundo já que tem meios para isso.

 

Comente que, segundo o filósofo Walter Benjamin, “a esquerda radical (…) jamais abolirá o fato de que mesmo a proletarização do intelectual quase nunca fará deles um proletário”, já pelo acesso privilegiado à cultura, que o torna solidário com ela e, mais ainda, a torna solidária com ele. Essa solidariedade pode ser apagada na superfície, ou até dissolvida; mas quase sempre ela permanece suficientemente forte para excluir de vez o intelectual do estado de prontidão constante e da existência do verdadeiro proletariado.” Reforce que pode estar aqui a explicação para o desprezo em relação ao eu lírico sentido pelo operário.

           

Peça ao alunos que:

·          Façam analisem o último trecho grifado e comentem com os colegas por que, ao final, o proletário vem “beijar-lhe” o rosto. 

4ª Etapa: Fechamento

Inicie a aula perguntando aos alunos:

 

·         O que perceberam em relação à denúncia social existente no poema “O Operário em construção”, de Vinicius de Moraes  e “O Operário no mar”, de Carlos Drummond de Andrade?

 

A partir dos comentários, identifique se chegaram a verificar que, em ambas as obras, nota-se um engajamento desse eu lírico/narrador que solidariza-se com o proletário/explorado e traz à tona essa condição de distanciamento social.

Materiais Relacionados

2. Para conhecer mais sobre a biografia de Vinicius de Moraes, assista ao documentário que conta a vida do poeta, produção de Miguel Faria Jr. e Susana Moraes, 1001 Filmes, disponível em http://www.youtube.com/watch?v=8OZkmnJb5D4 
3. Para apresentar e contextualizar a vida e a obra de Vinicius de Moraes, consulte http://www.viniciusdemoraes.com.br/site/
4. Para conhecer mais sobre a biografia de Carlos Drummond de Andrade, assista ao documentário Poeta da sete faces em http://www.youtube.com/watch?v=nIaiw_ZC08k
5. Para apresentar e contextualizar a vida e a obra de Carlos Drummond de Andrade, consulte aqui
 
OBRAS:
CANDIDO, Antonio. “Vinicius de Moraes”. In: Brigada Ligeira e outros escritos. São Paulo: Unesp, 1992.
MORAES, Vinicius. Antologia poética.  São Paulo: Companhia das Letras, 2011.
RANGEL, Valéria. O amor entre o vão momento e o infinito: os soneto de Vinicius de Moraes. Dissertação de Mestrado. São Paulo: USP, 2007. Disponível em  http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8151/tde-30072008-113622/publico/DISSERTACAO_VALERIA_RANGEL.pdf . Acesso em 27/02/2013.
ANDRADE, Carlos Drummond de. Sentimento do mundo. São Paulo: Cia de Bolso, 2012.
CAMILO, Vagner. “A cartografia lírico-social de Sentimento do mundo”. Revista Usp. Disponível em http://www.usp.br/revistausp/53/06-vagner.pdf

 

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