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Livros da Fuvest e Unicamp

Objetivos

Compreender o diálogo entre as obras de Machado de Assis e Almeida Garret;
Identificar semelhanças entre o narrador machadiano de Memórias Póstumas de Brás Cubas e o de Viagens na minha terra;
Reconhecer a digressão como característica de ambos os autores.

Antes de dar início às Etapas, acesse a aba Para organizar seu trabalho e saber mais.

1ª Etapa: Aproximação com o tema: intertextualidade

Inicie a aula lendo o seguinte trecho do romance  Memórias Póstumas de Brás Cubas:

Ao leitor”: “Trata-se, na verdade, de uma obra difusa, na qual eu, Brás Cubas, se adotei a forma livre de Sterne ou de Xavier de Maistre, não sei se lhe meti algumas rabugens de pessimismo. Pode ser.

Agora leia para eles o seguinte trecho de  Viagens na minha terra:

Que viaje à roda o seu quarto quem está à beira dos Alpes*, de inverno, em Turim, que é quase tão frio como S. Peterburgo – entende-se. Mas com este clima, com este ar que Deus nos deu, onde a laranjeira cresce na horta, e o mato é de murta, o próprio Xavier de Maistre, que aqui escrevesse, ao menos ia até o quintal.

Explique aos alunos que:

•  não é por acaso que ambos os autores citam Xavier de Maistre, escritor francês, há intertextualidade, sendo que a escrita desse autor influenciou tanto Almeida Garret quanto Machado de Assis, que por sua vez foi também influenciado pelo próprio Garret, como Machado diz no “Prólogo da 3ª edição”:

Toda essa gente viajou: Xavier de Maistre à roda do quarto, Garret na terra dos outros. De Brás Cubas se pode talvez dizer que viajou à roda da vida.

Mostre que aqui se vê o diálogo explícito entre as obras, uma vez que temos uma viagem à terra natal (Viagens na minha terra) e uma viagem em torno da vida de um defunto autor que conta sua história sem compromisso com a verdade.

Explique aos alunos que:

• a intertextualidade pode se realizar por meio da paráfrase e da paródia, o que ocorre em ambas as obras, em que tanto Brás Cubas como Almeida Garret narram com um tom irônico e, em alguns momentos, melancólicos as ocorrências de suas ‘viagens’;

Peça para que leiam o capítulo “Ao leitor” de Memórias Póstumas de Brás Cubas para a próxima aula e, também, o “Capítulo 2” de Viagens na minha terra, de Almeida Garret.
 
2ª Etapa: Diálogo com o leitor

Inicie a aula perguntando aos alunos:
• O que perceberam em relação à leitura dos dois capítulos?
• O que existe em comum?
A partir dos comentários, identifique se chegaram a verificar que:
• Em Almeida Garret, espera-se um leitor prevenido, capaz de acompanhar uma obra erudita, que dialogará com outros grandes autores (Cervantes, Camões) e que fará comentários irônicos sobre suas viagens.
• Em Machado de Assis, espera-se um “fino leitor”, capaz de acompanhar a história escrita “com a pena da galhofa e a tinta da melancolia”, ou seja, um leitor perspicaz que consiga identificar os jogos narrativos desse defunto autor.

Leia com os alunos os seguintes trechos:

Aí paramos, e acordei eu.
Sou sujeito a estas distrações, a este sonhar acorro dado. Que lhe ei de fazer? Andando, falando, escrevendo, sonho e ando, sonho e falo, sonho e escrevo. Francamente me confesso de sonâmbulo, de soniláquio, de… Não, fica melhor com seu ar de grego (hoje tenho a bossa helênica num estado de tumescência pasmosa!); digamos sonílogo, sonígrafo…
A minha opinião sincera e conscienciosa é que o leitor deve saltar estas folhas, e passar ao capítulo seguinte, que é outra casta de capítulo.
” Cap. 4 – Viagens na minha terra, de Almeida Garret

Vim… Mas não; não alonguemos este capítulo. Às vezes, esqueço-me a escrever, e a pena vai comendo papel, com grave prejuízo meu, que sou autor. Capítulos compridos quadram melhor a leitores pesadões; e nós não somos um público in-folio, mas in-12, pouco texto, larga margem, tipo elegante, corte dourado e vinhetas… principalmente vinhetas… Não, não alonguemos o capítulo.” Cap. XXII – Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis

Explique aos alunos que  fólio é o formato de livro alcançado por uma folha de papel dobrada uma só vez . Um livro in folio é feito de folhas dobradas uma vez no meio, originando cada folha 4 páginas. A mesma folha, dobrada duas vezes, produz o formato in quarto; folha dobrada três vezes, origina o formato in octavo, in-12, seria menor ainda, daí a necessidade de um capítulo curto.

Chame a atenção dos alunos para a aproximação entre esses narradores que escrevem “quase que inconscientemente”, como se a escrita ocorresse sozinha, como se tomasse conta deles, e não o inverso.

3ª Etapa: Outro recurso – a digressão

Comece explicando aos alunos:
• que a digressão vem da palavra latina digressìo,ónis,, que é o  ‘ato de partir, separar, retirar, afastar’, ligado ao v. lat. digrèdi ‘apartar, afastar(-se)’, e, em retórica, significa ‘comentar ou falar sobre assunto que se desvia da temática tratada’. Isto é, um distanciar-se do assunto principal.

Depois disso mostre que tanto Almeida Garret quanto Machado de Assis usam desse recurso muitas vezes para aparentemente distanciar o leitor, levando-o a um caminho que muitas vezes termina numa simples conclusão do narrador de que isso não tinha importância alguma para o que estava sendo narrado.

Enfatize que esse artifício retórico mais aproxima o leitor, pois traz alusões históricas, referências eruditas, provocações e convites aos leitores. Selecione trechos para ler com os alunos, a seguir um exemplo de cada obra:

Benévolo e paciente leitor, o que eu tenho decerto ainda é consciência, um resto de consciência: acabemos com estas digressões e perenais divagações minhas. Bem vejo que te deixei parado à minha espera no meio da ponte de Asseca. Perdoa-me, por que és; demos de espora às molinhas, e vamos, que são horas.” Capítulo 9 – Viagens na minha terra, de Almeida Garret

Há aí, entre as cinco ou dez pessoas que me leem, há aí uma alma sensível, que está decerto um tanto agastada com o capítulo anterior, começa a tremer pela sorte de Eugênia, e talvez… sim, talvez, lá no fundo de si mesma, me chame cínico. Eu cínico, alma sensível? Pela coxa de Diana! Esta injúria merecia ser lavada com sangue, se o sangue lavasse alguma coisa nesse mundo. Não, alma sensível, eu não sou cínico, eu fui homem; meu cérebro foi um tablado em que se deram peças de todo gênero, o drama sacro, o austero, o piegas, a comédia louçã, a desgrenhada farsa, os autos, as bufonerias, um pandemônio, alma sensível, uma barafunda de coisas e pessoas, em que podias ver tudo, desde a rosa de Esmirna até a arruda do teu quintal, desde o magnífico leito de Cleópatra até o recanto da praia em que o mendigo tirita o sono. – Capítulo XXXIV “A uma alma sensível” – Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis.

Como atividade, separe os alunos em grupos e peça para cada um identificar esses ‘gêneros’  que passaram no ‘tablado’ do cérebro do narrador machadiano.

4ª Etapa: Fechamento

Para finalizar o trabalho, solicite que cada aluno escolha um capítulo, para identificar e analisar as características vistas nas aulas: intertextualidade, diálogo com o leitor e digressão. E, também, apresente para a sala os exemplos encontrados.
Peça para os alunos organizarem um mural com alguns exemplos de capítulos que comprovem as análises feitas em sala.

 

Materiais Relacionados

• Para conhecer toda a obra digitalizada de Almeida Garret, consulte a Biblioteca Nacional – Portugal –  http://purl.pt/96/1/

• Para conhecer toda a obra digitalizada de Machado de Assis, acesse no domínio público – http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/PesquisaObraForm.do?select_action=&co_autor=58

• Para conhecer estudos sobre as influências de Machado de Assis, leia o artigo, de Antonio Candido, “À roda do meu quarto”, disponível em Revista USP – www.usp.br/revistausp/02/15-candido.pdf
 
OBRAS:
ASSIS, Machado de. Memórias póstumas de Brás Cubas. São Paulo: Ateliê Editorial, 2001.
CANDIDO, Antonio. “À roda do meu quarto e da vida”. In: Revista USP, Vol.Junho, Julho e agosto/1989. Disponível em www.usp.br/revistausp/02/15-candido.pdf
GARRET, Almeida. Viagens na minha terra. 3.ed., São Paulo: Martin Claret, 2012.
ROUNET, Sergio Paulo. “A forma shandiana em Sterne, Diderot, Xavier de Maistre, Almeida Garret e Machado de Assis”. In: Riso e Melancolia. São Paulo: Cia das Letras, 2007.

 

Arquivos anexados

  1. Diálogo Machado de Assis e Almeida Garret

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