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A professora de educação infantil da rede pública de São Paulo Josy Asca está lançando seu terceiro livro. Depois de dois títulos destinados à educação antirracista voltados ao público infantil, ela se dirige a colegas de profissão em “Lute como uma professora negra”.

“Para a gente falar de educação antirracista, a gente precisa entender um pouco do racismo, então eu trago minhas histórias, situações que eu passei, de como eu vivenciei o racismo desde criança até a fase adulta. Como foi ingressar na escola sendo uma professora negra, que não é fácil”, resume.

A motivação para o livro vem da própria vivência da escritora, já que teve de lidar com o racismo desde criança. “A minha infância na escola não foi das lembranças mais bonitas que eu poderia ter. Sofri muito racismo, e naquela época a gente não tinha com quem conversar. O negro não tinha a voz que ele está tendo hoje. Eu não conseguia falar em casa porque os meus pais também eram reprimidos. Desde o jardim da infância até o período da minha graduação, eu não tive nenhum professor negro, por isso que eu trabalho tão duramente hoje em dia, para que as crianças não passem pelo que eu passei”, revela Asca.

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Escritora Josy Asca durante lançamento do livro “Lute como uma professora negra” na Expo Favela 2024 (crédito: divulgação)

Educação antirracista

O livro “Lute como uma professora negra” traz, além da história da autoria, métodos para uma educação antirracista. No áudio, você acompanha cinco atividades e propostas que têm o objetivo de promover um ambiente mais igualitário na escola. “Nesse livro eu trago também algumas dicas de vivência em sala de aula que eu tive com as crianças e que deram certo”, aponta.

As cinco dicas que a professora e escritora compartilha na entrevista são:

1) Realização de assembleias com crianças a partir de três anos de idade;

2) Valorização da representatividade a partir de personalidades negras de diversas áreas;

3) Encenação de peças de teatro a partir de obras literárias escritas por pessoas negras;

4) Leitura de obras que têm protagonismo negro;

5) Promoção de eventos e festas com manifestações das culturas afro-brasileira e africana.

Crédito da imagem: divulgação – Expo Favela 2024

Transcrição do Áudio

Música: Introdução de “O Futuro que me Alcance”, de Reynaldo Bessa, fica de fundo

Josy Asca:

A minha infância na escola não foi das lembranças mais bonitas que eu poderia ter. Sofri muito racismo, e naquela época a gente não tinha com quem conversar. O negro, ele não tinha a voz que ele está tendo hoje. Eu não conseguia falar em casa porque os meus pais também eram reprimidos. Desde o jardim da infância até o período da minha graduação, eu não tive nenhum professor negro, por isso que eu trabalho tão duramente hoje em dia, para que as crianças, elas não passem pelo que eu passei.

Eu sou a Josy, professora da rede pública de São Paulo, trabalho com educação infantil, sou escritora também. E eu trabalho com a educação antirracista nas escolas através de palestras, formação de professores.

Vinheta: Instituto Claro – Educação

Música de Reynaldo Bessa, instrumental, fica de fundo

Marcelo Abud:

Josy Asca atua como escritora antirracista. Depois de dois livros dedicados ao público infantil, ela lança “Lute como uma professora negra”. A motivação para a nova obra veio da própria vivência, já que teve de lidar com o preconceito desde criança.

Josy Asca:

Eu não imaginei que eu pudesse ter reis e rainhas nos meus antepassados. É uma história que roubaram da gente. Na minha época, as histórias eram só “Branca de Neve e os 7 anões”, “Cinderela”, contos de fadas onde os protagonistas eram sempre as meninas loiras, brancas, dos olhos azuis; os príncipes, todos brancos.

E quando eu estava na primeira série, na época de festa junina, que a professora – até lembro o nome dela, Adelaide, porque a pessoa, quando ela passa por alguma situação de racismo, ela lembra o nome, ela lembra o sobrenome da pessoa, ela lembra a data – por isso que a gente fala que é muito importante trabalhar isso na vida da criança, porque é uma coisa que vai marcar para a vida inteira. E eu, com 7 anos de idade, a minha professora Adelaide chegou na sala e falou que ia escolher a noivinha e o noivinho da nossa festa junina. E aí eu corri e falei, “Ai, professora, eu quero ser a noivinha”. Aí ela olhou pra mim: “Você? Olha pra você, você não! As noivinhas são meninas mais bonitas”. Ela me colocou, assim, lá embaixo e foi enfática e falou que eu era uma criança feia, que eu não poderia ser a noivinha da festa junina. Então é uma coisa que me marcou muito, porque eu só tinha 7 anos de idade.

Marcelo Abud:

A escritora explica que situações como essas, vividas na infância, a levaram a escrever “Lute como uma professora negra”.

Josy Asca:

Esse é um livro, na verdade, destinado aos educadores. Pra gente falar de educação antirracista, a gente precisa entender um pouco do racismo, então eu trago minhas histórias, situações que eu passei, de como eu vivenciei o racismo desde criança até a fase adulta. Como foi ingressar na escola sendo uma professora negra, que não é fácil. E nesse livro eu trago também algumas dicas de vivência mesmo de sala de aula que eu tive com as crianças e que deram certo.

Marcelo Abud:

A professora compartilha cinco dicas e métodos para uma educação antirracista, que estão no livro. Ela começa com a importância da realização de assembleias desde a educação infantil.

Josy Asca:

Convidar as crianças negras, brancas, indígenas, de qualquer etnia, para sentar, para conversar, para colocar a pauta, porque muitas vezes essas crianças são reprimidas em casa ou na rua e não conseguem ter um lugar para se soltar, para falar. E aí a escola, ela tem esse papel principal de dar voz a essas crianças. Então, as assembleias, elas são muito importantes.

Eu sempre fiz assim, faço uma roda de conversa com as crianças, trago um assunto ou eles me trazem, também as crianças, elas trazem muito a cultura delas. Então a gente pega um assunto específico, senta com a criança em roda, e aí a gente conversa colocando as situações e o que eles fariam. E aí a própria criança, ela vai dando a devolutiva. É o momento mesmo de sentar e escutar a criança, ela trazendo todas essas informações. A partir dos três anos, já dá pra gente sentar, conversar, falar da cor do amiguinho, mostrar nosso tom de pele. E aí vai do professor também, de estar provocando, na verdade, situações para que as crianças, elas falem dos sentimentos delas, né?

Marcelo Abud:

A segunda dica de Josy Asca para uma educação antirracista é que a escola valorize a representatividade.

Josy Asca:

Trazer personalidades negras pra sala ou pra escola, colocar fotos de personalidades negras, seja juíza, advogada, médica e mostrando pra aquela criança que ela pode ser o que ela quiser, que ninguém vai falar o que ela tem que ser, que ela não pode ser tal profissão. Então, a criança, ela aprende muito pelos exemplos e o que ela vê. Então é muito importante a gente estar mantendo fotos para as crianças olharem mesmo, para elas terem aquela representatividade viva ali.

Marcelo Abud:

Outra atividade que Asca destaca é a realização de peças de teatro a partir de obras literárias.

Josy Asca:

O teatro também é muito importante, trazer a literatura em forma de dramatização. A gente fez um teatro do livro “Quarto de Despejo”, da Carolina Maria de Jesus. E nós fizemos esse teatrinho na sala mesmo, uma situação descontraída, só eu e as crianças. A coordenadora achou muito legal e pediu pra fazer pra escola inteira. Aí nós fomos pro refeitório fazer essa apresentação. Então, a criança, ela já vai se enturmando ali, ela já vai tendo aquele assunto apropriado. E aí já começa, a partir da criança mesmo. Trabalhar os teatrinhos. A dramatização é muito importante por isso, para ela ter essa referência.

Marcelo Abud:

Entre as propostas que estão no livro, a quarta dica envolve a literatura que traz o protagonismo negro para ser desfrutada por crianças e seus familiares.

Josy Asca:

Pode ter algum personagem negro, mas aí a gente enfatiza aquele personagem. E a gente manda junto com uma folha, e aí a família, ela tem que ler com a criança essa história em casa. E nessa folha ela vai relatar como foi esse momento. Então, as devolutivas são muito boas. Às vezes a gente deixa três, quatro dias com cada criança, para aquela família ter um tempo de sentar com seu filho, ler uma história e anotar como foi esse momento: o que que a criança falou do personagem? O que que a família achou do livro? É uma forma de levar a literatura também para a casa de muitas crianças que não têm esse costume, esse hábito da leitura.

Marcelo Abud:

A quinta dica que também está presente no livro “Lute como uma professora negra” é que a escola promova eventos e festas com base em manifestações das culturas afro-brasileira e africana.

Josy Asca:

A gente tem que mostrar para as crianças que também podem trazer as tradições deles. Então, mostrando os costumes, as comidas, os esportes, as danças, as músicas, todos os dias a gente pode trabalhar um pouquinho isso, não precisa a gente, por exemplo, trabalhar a educação antirracista só em novembro. A gente pode fazer isso todos os dias.

Música de Reynaldo Bessa, instrumental, fica de fundo

Marcelo Abud:

Com o livro “Lute como uma professora negra”, Josy Asca traz ainda outras dicas e métodos para inspirar um ambiente mais justo e igualitário na escola. Segundo a escritora, promover a diversidade e a valorização da cultura negra é a forma de enfrentar o racismo por meio da educação.

Marcelo Abud para o podcast de educação do Instituto Claro.

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