Diálogos Gigantes

Uma rua de
cada vez

Sobre carros voadores e lixo queimando nas ruas

Luma, São Gonçalo-RJ

Era bem cedo quando ouvi o barulho do caminhão. Botei o chinelo, peguei os sacos de lixo, desci a ladeira e corri pela rua sem asfalto por dois quarteirões. Não deu tempo. Voltei com raiva porque o caminhão de lixo não passa na minha rua e agora tem um pouquinho de chorume na minha perna. Mas hoje em dia, sei que essa indignação, essa mania de não me conformar, pode se transformar em energia para mudar o mundo.

Sério: tenho 23 anos e desde que me lembro, muitas coisas básicas não chegam pra mim e pra muitos da minha comunidade. Em vez de inventar carros voadores e vacinas que salvam vidas, temos que pensar em saneamento básico, asfalto, ponto de ônibus. Coisas que deveriam ser elementares para quem mora em uma cidade grande como São Gonçalo, a menos de meia hora da segunda maior cidade do Brasil, o Rio de Janeiro.

Participei de dois projetos apoiados pela Claro. O Diálogos Gigantes foi um processo transformador, com debates riquíssimos e uma troca de ideias muito rara. Já o Campus Mobile foi uma faísca. O projeto, que é uma espécie de concurso que promove ideias e soluções mobile, foi o primeiro lugar que apostou na minha ideia. Me fez pensar que é com celular na mão que podemos construir as bases de uma cidade que só existe em sonho. Desenvolvi o projeto do Coletaí e apresentei para a banca de jurados. Alguns não acreditavam que eu estava desenvolvendo uma solução para um problema tão elementar. Mais do que ver alguém sensibilizado pelos nossos problemas, foi muito emocionante saber que eles reconheciam as possibilidades infinitas das nossas soluções.

Jovens como eu não podem mais perder tempo. Precisamos parar de pensar nos problemas e focar no que podemos fazer agora. Depois de desenvolver a iniciativa, muita coisa mudou no meu bairro. Nos articulamos e passamos a ver a cidade de outro jeito. Nos mobilizamos com a revista Plurale quando o único ecoponto da cidade foi fechado e conseguimos que ele fosse reaberto pouco tempo depois. Juntamos gente o suficiente para convencer a Marquise, que é a companhia de coleta de lixodo município, a instalar lixeiras em pontos estratégicos e combater o descarte incorreto. Isso quer dizer muita coisa: diminuímos a fumaça do lixo queimando e poluindo o ar, o solo e a água. O aplicativo não foi desenvolvido porque ainda é muito caro fazer um projeto grande assim. Mas isso foi o de menos. Nós construímos algo muito maior. Mesmo que o caminhão ainda não passe na minha rua, mesmo que eu ainda tenha que correr com o saco de lixo na mão, sei que não vou parar de mudar as coisas. Nem que seja rua a rua, calçada a calçada, porque minha indignação pode mover muita coisa nesse mundo.