
ação social pela música brasil
Beethoven
na viela
A vida com um violoncelo nas mãos
Rodrigo, Rio de Janeiro-RJ
Fone no ouvido. Acordes, harmonia, cordas e piano. O arrepio me distrai das escadas e do peso do violoncelo nas costas. A caminho da universidade, penso nos caminhos que trilhei para chegar até aqui. Escalas, notas, tempo. Andante, allegro. Mínima, semínima. Exercícios sem fim. A orquestra ataca no exato momento em que entro no ônibus. A vida pode ser muito boa.
Moro no Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro – umas das maiores e mais violentas favelas do mundo. Aliás, o Alemão tem o pior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) da cidade. Quando a Ação Social pela Música chegou aqui na comunidade, veio como uma ação muito transformadora. Eu queria muito fazer parte do projeto, mas não tinha tempo. Meu irmão mais novo conseguiu entrar, foi fazer violino. Quando vi ele tocando, minha vontade aumentou. Muito. Fiz um esforço imenso para conseguir participar das aulas: era menor aprendiz de manhã, fazia aulas na Ação Social Pela Música (ASMB) à tarde e ensino médio à noite. Nem me lembro exatamente quando foi que consegui estudar, mas passei em primeiro lugar em música na Universidade Federal do Rio de Janeiro.
O tráfico de drogas é uma realidade por aqui. Não é difícil entender. Um traficante é um exemplo de sucesso, dinheiro, status. Mas quando andamos pelas vielas com nossos instrumentos, nos tornamos um outro tipo de exemplo. Mesmo que tenha sido tímido e quieto por toda a vida, sou visto como um talento que deu certo. Digo isso porque talentos não faltam por aqui. Faltam oportunidades. Faltam mais projetos como esse, que traz educação, disciplina e ética para milhares de jovens em todo o Brasil – além das oportunidades de trabalho e da chance de sentir o orgulho de tocar e ser admirado por algumas horas. Pelo projeto, conheci e me apresentei em cinco países. Toquei para plateias muito diferentes, em lugares tão distintos quanto teatros, praças, igrejas e, claro, na sala de casa para a minha mãe.
Tiro o fone do ouvido e desço do ônibus. Sei para onde vou porque fazer música traz meu norte, minha direção. Acordes, harmonia, cordas e sopros abrem os meus caminhos.