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Liberdade de expressão, democracia e cidadania não são conceitos fáceis de ensinar. No entanto, a educação é uma das formas de estimular a participação de estudantes nas decisões da escola e de demonstrar a importância da política.

“Eu sempre brinco com os alunos: falo pra eles que a gente acorda e escolhe uma roupa para ir para escola ou para trabalhar. E o fato de a gente escolher uma roupa é uma liberdade que a democracia nos garante, e é uma liberdade de expressão. E nisso está a política, né?”, explica a doutoranda em Ciência Política pela Universidade de São Paulo e diretora do movimento Voto Consciente, Joyce Luz.

Educação política e grêmio estudantil

Entrevistada neste podcast, a professora de educação política em escolas periféricas de São Paulo reforça que não é preciso falar em candidato, nem partido, mas sim ensinar como funciona a estrutura política na prática. Um dos exemplos nesse sentido é o estímulo que a comunidade escolar pode dar ao grêmio estudantil.

“Nós temos direitos, mas nós também temos deveres. E dentro do grêmio estudantil, os alunos aprendem a desenvolver esses dois eixos: o eixo da garantia dos direitos; mas também o eixo de você praticar os seus deveres, que, hoje, é a responsabilidade social. É você se enxergar no outro e ajudar a suprir a necessidade do outro. Se eu pudesse dar um recado pra todos os diretores de escolas eu incentivaria muito os grêmios nas escolas”, conclui Luz.

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Transcrição do Áudio

Música: Introdução de “O Futuro que me Alcance”, de Reynaldo Bessa, fica de fundo

Joyce Luz:
Atividades em que você faz com que os alunos se reconheçam uns nos outros é político. Começa por aí a cidadania. Você começar a entender que o outro tem um lugar de fala também. É a política do reconhecimento; é eu me reconhecer no outro. Reconhecer que o outro é um indivíduo que tem necessidades tal como eu. E isso eu só construo fazendo dinâmicas em que eu dê a oportunidade de conhecer o meu colega. Então… de ouvir esse meu colega, de aprender sobre a realidade desse colega.
Olá, meu nome é Joyce Luz. Sou doutoranda em Ciência Política e diretora do movimento Voto Consciente, de São Paulo.

Lucas Sima:
Eu fiz o curso de formação política por intermédio do Redigir, projeto de cidadania. Antes eu acreditava que a política para o cidadão era somente ir lá, dar o voto na urna e depois esperar pra ver o que acontecia. Com os ensinamentos do curso, eu pude aprender que não, que a sociedade civil tem papel importantíssimo em cobrar os políticos, em participar das assembleias em que eles consultam o povo.
Eu me chamo Lucas Gomes Sima, eu tenho 21 anos, estudante de um bacharelado interdisciplinar de Ciências e Humanidades, na Universidade Federal do ABC.

Vinheta: Instituto Claro – Educação

Música de Reynaldo Bessa, instrumental, fica de fundo

Marcelo Abud:
É possível falar de política na escola? A professora Joyce Luz defende que não apenas é possível, como extremamente necessário. Mas, na prática, o que tem sido feito para que alunas e alunos percebam a importância da participação política no convívio democrático?

Joyce Luz:
Hoje a maior contribuição que algumas escolas dão para os alunos são matérias, geralmente de sociologia, que aborda o tema da cidadania, mas aborda geralmente em uma aula, né, porque também não tem o tempo necessário pra que se desenvolva tanto esse conteúdo; há muitas polêmicas que envolvem você falar de partidos políticos em sala de aula ou você falar de candidatos, de ideologia…
Então, hoje, eu classifico como muito fraca a atuação das escolas e não é uma culpa das escolas em si, mas uma culpa acho que da nossa política educacional, que não consegue inserir na grade, né, dos alunos, esse conteúdo de cidadania e de educação política de forma mais didática e de forma que o aluno ele possa ter contato não apenas em uma aula, mas ao longo do ano, né?

Música: “Rock Estrela” (Léo Jaime)
Quem sou eu?
E quem é você?
Nessa história
Eu não sei dizer
Mas eu acredito
Que ninguém tenha vindo
Pro mundo a passeio

Joyce Luz:
Então poderiam ser pensadas atividades para os alunos… Pelo menos uma vez por semana terem esse contato com o que é democracia; o que a gente entende por cidadania; o que a gente entende pela estrutura do Estado brasileiro. Então a gente vai falar de eleições agora? Vamos escolher um legislativo e vamos escolher um representante para o Poder Executivo? O que um Legislativo faz? O que um Poder Executivo faz?

Lucas Sima:
E lá nós discutíamos sobre a política, nós falávamos sobre os processos legislativos, como aconteciam; qual a função de cada político… Pude aprender que a política podia ser mais próxima do cidadão, né, que a política não era somente o ato de votar.

Joyce Luz:
Hoje esses conteúdos eles não são abordados com tempo na escola e há escolas que nem abordam esse tema. E, por fim, acho que o convívio, né, a coletividade, a ideia de que o aluno ele precisa viver em coletividade e, também, em respeito dentro de uma sociedade. Esses são valores que hoje é muito difícil de serem ensinados e praticados dentro da própria escola.

Marcelo Abud:
Ao serem chamados para participar das decisões, estudantes percebem a importância de zelar pelo bem que é de todos dentro e fora da escola.

Joyce Luz:
E aí a gente parte pra ideia de cidadania. Vamos falar de cidadania! Cidadania é o direito. Então eu sempre falo para os alunos, é a caixinha de direitos. A gente tem três caixas de presentes, né, na nossa democracia: a gente tem o Direito Civil; a gente recebe o Direito Político; e a gente recebe o Direito Social. E pra eu falar desses três direitos, eu tenho que explicar o que o meu representante político, independente de quem ele seja, qual é a obrigação dele, né?
A obrigação dele é garantir que eu tenha liberdade, que eu possa ir e vir pra minha casa em segurança; a obrigação desse candidato é também garantir que eu possa ter o direito de votar e de ser escolhido, né, de ser eleito. E o Direito Social, que é o que mais afeta os nossos jovens hoje. É o direito a uma educação de qualidade; direito de transporte público acessível, que não seja lotado, que tenha ônibus, que passe em todos os bairros; é o direito de uma política de lazer, de ter acesso a cultura; é uma política habitacional, o direito de as pessoas terem uma moradia com água encanada, com saneamento básico. Então eu falo pra eles o que o representante político precisa garantir pra eles.

Marcelo Abud:
Uma das formas mais comuns de organização política entre adolescentes é o grêmio estudantil. Joyce Luz explica por que a comunidade escolar deve valorizar esta forma de participação.

Joyce Luz:
Nós temos direitos, mas nós também temos deveres. E dentro do grêmio estudantil, os alunos aprendem a desenvolver esses dois eixos: o eixo da garantia dos direitos; mas também o eixo de você praticar os seus deveres, que, hoje, é a responsabilidade social, né? É você se enxergar no outro e ajudar a suprir a necessidade do outro. Se eu pudesse dar um recado pra todos os diretores de escolas, eu incentivaria muito os grêmios nas escolas.
Isso torna até a participação coletiva, o convívio dos jovens, muito mais harmonioso dentro da escola. Torna a relação entre professores e alunos muito mais transparente, muito mais horizontal ainda daquela ideia hierárquica de que: ‘ah, é uma autoridade controlando os alunos’. O aluno se torna mais “amigo da escola”. E é isso que toda escola procura. Então, essa participação política, se tem um grêmio, ela é muito mais facilitada e muito positiva se as escolas deixam acontecer.

Música: “A Nossa Escola” (Luiz Tatit / Sandra Peres), com Palavra Cantada
A nossa escola sabe bem, que agora sim é a nossa vez
Chama todas as turmas, que somos nós e são vocês

Joyce Luz:
Fomentando de novo a ideia de democracia, o conceito de democracia. Democracia a gente vive em coletividade, vive com diferenças; a gente vive numa sociedade plural, que envolve, novamente, a garantia de direitos para todos. Então, não é só alguns grupos terem direitos. Não! É eu poder garantir o direito mínimo de existência para todos os indivíduos que vivem nessa sociedade. Isso é democracia! E até então eu não falei nada de partido, eu não falei nada de candidato… Eu estou falando de política, né?

Lucas Sima:
Dentro do meu círculo, assim, social, por exemplo, na minha igreja, com os meus amigos, com os meus vizinhos, eu tento incentivá-los a não tomar as coisas 100% como verdade; eu tento combater também as fake news que aparecem; eu tento mostrar pra eles que a mudança somos nós, né, e que se nós não tentarmos, se nós não buscarmos participar, as coisas irão de mal a pior. E também tento tirar deles essa sensação de que a política é corrompida de todas as formas e que não há possibilidades (porque está bastante impregnada). Então eu acho que nesse momento a minha ação política é tentar desfazer isso, sabe? Tentar mostrar para as pessoas que há sim a possibilidade, mas que nós precisamos estar ativos para que haja mudanças, né?

Joyce Luz:
O alicerce, a base da política, é a gente entender o que é essa estrutura política. Então, voltar aos conceitos basilares, começar a entender por que a gente é uma democracia? O que envolve a gente ser uma democracia? Envolve aí a liberdade, uma liberdade de expressão.
Eu sempre brinco com os alunos, eu falo pra eles que a gente acorda e escolhe uma roupa pra ir pra escola ou pra ir trabalhar, ou para ir para o shopping, para o cinema… A gente escolhe uma roupa. E o fato de a gente escolher uma roupa é uma liberdade que a democracia nos garante, e é uma liberdade de expressão. E nisso está a política, né?

Música de Reynaldo Bessa, instrumental, de fundo

Marcelo Abud:
A escola assume papel importante ao promover a participação de estudantes nas decisões e fazer com que entendam que a política está em tudo. Desta forma, nossa sociedade passa a ter mais consciência de seus direitos e deveres para o pleno exercício da democracia.
Com apoio de produção de Daniel Grecco, Marcelo Abud para o Instituto Claro.

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