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O ensino médio é, atualmente, uma das maiores preocupações na pasta da Educação. Segundo estudo elaborado em 2021 pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), 686,7 mil jovens de 15 a 17 anos estão fora da escola no Brasil. Para tentar reverter esse quadro, um dos debates trazidos pelo grupo de transição da área, no fim de 2022, envolve a possibilidade de se criar uma bolsa para reduzir a evasão de estudantes dessa etapa de ensino em todo o país.

“A gente tem um problema grave no ensino médio, que é o abandono por conta de questões sociais: o trabalho, os índices de violência e a gravidez na adolescência são fatores que têm atrapalhado. E a pandemia agravou isso, porque gerou um distanciamento entre o estudante e a escola”, explica o professor de matemática e superintendente de políticas educacionais do Governo do Estado de Alagoas Ricardo Lisboa Martins.

O docente está à frente do Programa Cartão Escola 10, que tem sido estudado como um possível modelo para a implantação de uma ação nacional. A proposta prevê três tipos de incentivos financeiros que possam dar condições aos jovens de se manter na escola.

“Tem o incentivo de ‘retomada’, com a perspectiva de acesso ao ensino; o de ‘permanência’, em que o aluno precisa comprovar a frequência nas aulas; e o de ‘sucesso escolar’. Nesse caso, o aluno que terminou o ensino médio recebe um prêmio de R$ 2 mil reais”, enumerou.

Vacinação e frequência escolar como contrapartidas

No projeto em análise, o ciclo vacinal completo é necessário para que os estudantes tenham direito ao incentivo de retomada do ensino. Além disso, o auxílio mensal deve estar atrelado a um índice de frequência mínima de 90% nas aulas.

“Ter essa bolsa universal, ou seja, nacional, vai ser uma grande ação para que os alunos de 15 a 17 anos, principalmente, retornem aos bancos da escola”, acredita a professora e pedagoga de Maceió Graça Gomes, que pesquisou em seu doutorado sobre políticas educacionais voltadas ao ensino médio.

Para os entrevistados, o incentivo financeiro é fundamental, devido às condições sociais no país. Mas só isso não é suficiente para garantir que os estudantes cursem o ensino médio até o fim.

No áudio, ambos apontam outros problemas que merecem atenção e apontam caminhos para manter a motivação desses estudantes, como a realização de atividades culturais e ações que estimulem o protagonismo juvenil.

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Transcrição do Áudio

Música: Introdução de “O futuro que me alcance”, de Reynaldo Bessa, fica de fundo

Ricardo Lisboa Martins:
A gente instituiu no estado de Alagoas uma política de permanência para o estudante do ensino médio, até porque foi muito complicado pra gente o período remoto. Tinha os nossos estudantes e alunos fora da escola, trabalhando da forma que conseguiam, sem muito apoio no sentido de instrumentos efetivos para garantir uma educação não presencial.

Me chamo Ricardo Lisboa Martins, trabalho aqui na Secretaria de Estado da Educação como superintendente de políticas educacionais.

Graça Gomes:
Muitos saem de casa às vezes sem se alimentar. Então, quem sabe, né, se ele tiver essa garantia social – porque interfere diretamente na escola -, não tem como a gente levantar os muros da escola e não ver isso. Isso está dentro da sociedade, a gente não tem como fugir, sabe?

Eu sou Maria das Graças Correia Gomes, mas gosto que me chame de Graça Gomes. No meu doutorado, eu estudei políticas educacionais que aconteceram desde o governo Fernando Henrique até a Dilma, no ensino médio.

Vinheta: Instituto Claro – Educação

Música de Reynaldo Bessa, instrumental, fica de fundo

Marcelo Abud:
Um dos projetos discutidos pelo grupo de educação durante o período de transição para o atual governo é a possibilidade de se criar um programa de bolsas para alunos do ensino médio com foco no combate à evasão e na permanência dos estudantes na escola. Mas o que motiva a necessidade de um auxílio financeiro para quem estuda nessa etapa de ensino?

Graça Gomes:
Quando eu fiz o meu estudo, a gente viu que a causa da evasão, muitas vezes, é o aluno não ter condição de ir para a escola, muitas vezes não tinha material para isso.

Ricardo Lisboa Martins:
A gente tem um problema grave no ensino médio, que é o abandono por conta de questões sociais: o trabalho, os índices de violência, a gravidez na adolescência são fatores que têm atrapalhado, né, e a pandemia agravou isso, porque a pandemia ela trouxe um distanciamento do estudante à escola.

Música: “Sementes” (Vinicius Leonard Moreira / Emicida / Thiago Jamelao / Dri Barbosa), com Drik Barbosa e Emicida

Repetiu na escola por falta
Ele quer ir mas não pode
Desigualdade é presente
E tira seus direitos sem escolha
Trabalha ou rouba pra viver
Sistema algoz, que o arrancou da escola
E colocou pra vender bala nos faróis

Ricardo Lisboa Martins:
O aluno é cooptado pelo trabalho informal, fazendo com que ele abandone a escola. Isso tem sido uma discussão aqui em Alagoas que a gente tem travado com as escolas. E aí a gente faz até alusão às escolas de tempo integral. Como é difícil manter os estudantes no tempo integral, porque o trabalho, a vida social exige o aluno fora da escola. Então era importante trazer esse aluno.

Marcelo Abud:
O projeto de Alagoas que pode servir de inspiração para um programa em nível nacional foi iniciado em 2021 e envolve três incentivos financeiros.

Ricardo Lisboa Martins:
Tem o incentivo ‘retomada’, com a perspectiva de acesso; tem o incentivo ‘permanência’, com a perspectiva de que o aluno precisa comprovar a frequência e tem o incentivo ‘sucesso escolar’ – que o aluno que terminou o ensino médio recebe um prêmio, né, os 2 mil reais.

Marcelo Abud:
Em 2021, o incentivo para a retomada envolveu a volta de estudantes ao ensino presencial.

Ricardo Lisboa Martins:
E em 2022, a gente acionou essa bolsa mais uma vez para incentivar a vacinação nos alunos nessa faixa etária. Então todos os alunos de ensino médio que estivessem comprovando o ciclo vacinal completo estaríamos pagando também a bolsa ‘retomada’.
Então a bolsa ‘retomada’ ela cumpriu um papel fundamental, tanto para o retorno do presencial como também do período da vacinação.

Marcelo Abud:
Ricardo Lisboa cita um dos resultados do programa de incentivo no ensino médio em Alagoas.

Ricardo Lisboa Martins:
No período que trabalhava o remoto, a gente já tinha feito uma previsão de mais de 40% de alunos que já estavam abandonando a escola. Com a implantação do Cartão Escola 10, a gente conseguiu reduzir para mais ou menos 9% esse abandono.

Marcelo Abud:
Graça Gomes acredita que levar esse tipo de incentivo para todas as redes do Brasil, tendo como contrapartidas o ciclo vacinal completo e uma frequência mínima de 90% nas aulas, é uma política pública importante.

Graça Gomes:
Ter essa bolsa universal, ou seja, universal no sentido, assim, nacional, vai ser uma grande ação para que todos os alunos de 15 a 17 anos, principalmente, retornem aos bancos da escola.

Ricardo Lisboa Martins:
A gente que acompanha o ensino médio há muito tempo, desde outros governos federais e outros governos estaduais aqui em Alagoas vê o quanto é decisivo essa política. Não é uma ação barata, né, é cara, mas ao mesmo tempo é necessária e causa o impacto necessário também, não é? Que é aquele que, associado ao novo ensino médio, pode trazer grandes transformações na vida desses estudantes.

Marcelo Abud:
O incentivo financeiro do início ao fim do ciclo do ensino médio é visto como necessário para Martins e Gomes, diante da realidade social brasileira, mas só isso não basta.

Graça Gomes:
Por sua vez, a escola precisa também ver como é que está trabalhando com esses alunos, porque eu acredito que esses alunos precisam ser ouvidos. Porque quando eu fiz um grupo focal com estudantes do ensino médio, eu percebia que eles tinham algumas questões bem fortes para a escola e a escola não escutava. E eu acho que a gente também tem que dar escuta a esses estudantes de ensino médio, para conquistá-los para a escola e até de garantir a sua autonomia.

Marcelo Abud:
A professora relata o que a pesquisa que fez aponta como importante para motivar estudantes nesta etapa de ensino.

Graça Gomes:
Eu fiz a minha pesquisa em Pernambuco e aí eu fui em duas escolas que têm o sistema semi-integral, que os alunos ficavam todas as manhãs e duas tardes – todas dentro da sala de aula. Então eles passavam dez horas dentro da sala de aula em dois dias.

E aí, quando eu conversei com eles sobre o programa Ensino Médio Inovador – que foi até o Lula que implantou no final do segundo mandato… O que era a intenção do programa Ensino Médio Inovador? Era de o aluno ter o currículo – as disciplinas pedagógicas de currículo – e ter também teatro, dança, esporte, a questão mais cultural. E quando eu conversei com os alunos, eles disseram que sentiam muita falta disso… que houve o início desse programa, muitas vezes eram os próprios professores que davam, os professores, assim, superangustiados, porque muitos não tinham essa prática.

Música: “Comida” (Sergio Britto, Marcelo Fromer e Arnaldo Antunes), com Elza Soares e Titãs

A gente não quer só comida
A gente quer comida
Diversão e arte
A gente não quer só comida
A gente quer saída
Para qualquer parte

Ricardo Lisboa Martins:
A gente entende que precisa avançar muito mais na qualidade da educação. A bolsa, ela cumpre um papel fundamental, que é para o aluno permanecer na escola. No entanto, a gente entende que precisa avançar na qualidade.

Graça Gomes:
Então, no momento em que eles tinham que ter aula o dia inteiro, eles inventavam muitas coisas. Eu percebi, assim, que eles não queriam estar na escola o dia inteiro, só dentro de uma sala de aula, sentado, só com aula. Porque não é só a questão financeira, o dinheiro, a bolsa, que vai garantir o aluno estar lá dentro, também tem que ter estas ações: a questão de ativar o grêmio estudantil – que até o governo do estado também tem um programa de recurso para o grêmio estudantil, atualmente.

Esse protagonismo juvenil, de o aluno se sentir também responsável pela escola, falar, se expor, eu acho que isso tudo evita até a questão da depredação, pode contribuir bastante.

Música de Reynaldo Bessa, instrumental, fica de fundo

Marcelo Abud:
Reduzir significativamente a evasão e criar outros incentivos, para além dos financeiros, no ensino médio estão entre as principais preocupações na área da educação atualmente no Brasil.

Marcelo Abud para o podcast do Instituto Claro.

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